Alerta: como prevenir a violência extrema nas escolas
Treze são os casos registrados de ataques às escolas brasileiras no último ano, ensanguentando as manchetes de sites e demais veículos de comunicação.
A sabedoria filtrada pela história é eterna como a rocha: o micro reflete o macro, o menor ecoa o maior. Ambientes de ensino são, por excelência, espelhos das sociedades.
Aprendamos com quem já viveu e domine o tema: nos Estados Unidos da América e somente no ano de 2017, 30 foram os casos envolvendo tiroteios, o maior número já registrado pelo FBI em toda sua história. Muito além do nosso.
Estudo do serviço secreto americano sobre 67 casos de escolas sob ataques preventivamente desmantelados concluiu: criminosos geralmente exibem comportamentos observáveis e, quando os membros da comunidade os relatam aos atores da segurança pública, a próxima tragédia pode ser evitada.
Eis o princípio número um de como prevenir a violência extrema nas escolas.
Precisamos incentivar nossos parceiros do ambiente escolar, juntamente com nossos policiais, a confiarem e a compartilharem informações mutuamente, sempre orientados às melhores práticas do aprendizado seguro e saudável.
Quem entende de educação são os atores do palco do ensino. De segurança pública: seus policiais e técnicos. Por mais óbvia que pareçam estas frases, o despreparo, o sentimento de enxugar um iceberg com toalhas de papel e os vergalhões metálicos da sobrecarga do dia a dia fazem com que boa parcela dos gestores brasileiros desconsidere obviedades, banalidades e fundamentos.
Um bom começo é chamar ambos os personagens à mesa e lhes garantir poder na elaboração de um planejamento estratégico consistente.
A Polícia Militar paulista disponibiliza patrulheiros preparados e orientados à política pedagógica como os Programas Educacional de Resistência às Drogas e à Violência (Proerd) e Ronda Escolar (RE): interlocutores diretos e confiáveis à comunidade escolar.
E como conduzir o planejamento? Respeitando as características próprias, individuais, tanto das edificações quanto de seus usuários. Assim, elimina-se outra limitação à prevenção da violência extrema: impor regras padronizadas.
Portanto, uma avaliação personalizada, precisa e específica de cada caso é das melhores práticas para prevenir o crime, pois permite detectar ambientes e atitudes de alunos exibidores de comportamentos desviantes observáveis à medida que se aproximam da violência.
Amparar alunos angustiados, reduzir situações indesejáveis antes da explosão em violência e defender a comunidade são seus objetivos principais.
Somente após tais participações e análises e em momentos adequados, outros segmentos e personagens (representantes de empresas de segurança privada, políticos, infratores já condenados acessíveis a entrevistas exploradoras do como e do porquê praticaram crimes semelhantes, vítimas e familiares vitimizados, imprensa etc.) contribuiriam complementarmente: um plano bem elaborado é abrangente, plural e garantidor de visibilidade a cada qual na hora e local adequados.
Atletas não chegam às olimpíadas somente com bom planejamento e bons técnicos: precisam praticar e treinar. Muito.
Logo, implantar bons planos customizados, individualizados, reavaliá-los e os corrigir é passo essencial no caminho da segurança escolar, além de simular situações reais ao menos a cada semestre, treinando exaustivamente até internalizar comportamentos positivos.
Este é o segredo do bom desempenho da sociedade estadunidense diante de situações reais: todos, alunos, operadores do ensino e da segurança, treinam… exaustivamente!
Destaco: sempre conduzido por quem entende – educadores, policiais e técnicos. Sem intermediários e interferências.
Ao contatar fonte ligada ao FBI– órgão norte-americano auxiliar de incidentes envolvendo atiradores e assassinos em massa ou em locais públicos -, obtive diversos estudos sobre o tema, a exemplo deste vídeo [clique aqui] orientador de condutas e táticas de fuga e de primeiros socorros voltados ao público: exemplo de como órgãos de segurança e sociedade constroem conhecimentos práticos.
Por aqui, diversas autoridades sinalizaram adquirir equipamentos caríssimos tais a detectores de metais, sem avaliar e traçar um planejamento estratégico adequado. Decisão economicamente preocupante: comercializa-se uma – uma só – cabine de segurança com detector de metais por aproximados R$ 30 mil.
Insuficiente para atender uma escola. Imaginemos toda rede de ensino.
Além disso, desconsidera-se a logística diária matinal entre responsáveis e educadores: para permanecerem, ao menos, 08 exaustivas horas no ambiente escolar enquanto seus pais, mães ou responsáveis trabalham, boa parte das crianças exigem cuidados especiais que necessitam de materiais, mochilas, bolsas e maletas com apetrechos metálicos.
Imagine, caro leitor, o transtorno imenso quando se tem cerca de 30, 40 alunos debaixo de chuva e no mesmo horário diante da entrada escolar, aguardando sua vez na cabine de detecção.
Some-se a isso a necessidade de erguer escudos diante das garras da “indústria da in-segurança”, a saltar sobre os gestores de ensino, empurrando parafernálias tais como concertinas, trancas, muros cada vez mais altos, câmeras de monitoração e toda forma de desconfiança e desamor que houver neste momento fragilizado e apreensivo de vida.
Talvez sejam necessárias, até: só um planejamento bem feito por educadores e policiais poderá responder adequadamente.
Outra decisão divulgada é a de implantar o alarme de pânico, iniciativa que, uma vez acionado, orientaria os professores a manterem seus alunos em salas de aula para evitar eventual encontro com atirador nos corredores.
A exemplo do alarme de incêndios, o problema é a existência de outros tipos: disparado, todos devem abandonar a edificação o mais rapidamente possível, antes que morram pelos efeitos da intoxicação dos gases ou pelas chamas.
A falta de treinamento e de ouvidos condicionados a distinguir um alarme de outro pode significar uma tragédia ainda maior.
Seria mais viável se divulgassem a contratação de conhecimento, de experiência, de tirocínio de policiais inativos, adaptados ao espaço pedagógico e portando armas de menor potencial ofensivo (armas não letais), operando como controladores de acesso ou inspetores escolares.
O olhar treinado faz mais que muitos equipamentos de raio-x.
Planejar, implantar (praticar), treinar, revisar e corrigir erros. Há mais?
Sim: atitudes e comportamentos.
Resumidamente, equilibrar tais programas com as mudanças de atitudes e comportamentos dos diversos segmentos sociais podem contribuir para uma sociedade mais segura.
Exemplo: os da imprensa.
Potencializadoras de condutas e ações negativas (nos anos 1960 e 1970, ajudaram a criar o “hooliganismo”, uma subcultura violenta de jovens do sexo masculino reunidos por meio de seus laços compartilhados com um time de futebol, espetacularizando cenas de violência e as repetindo inúmeras vezes), podem ser sedutoras sacerdotisas a influenciar hábitos inibidores saudáveis (a imprensa espanhola adotou a prática de não apresentar imagens com mais de seis segundos e de não divulgar dados e imagens dos infratores da lei, bem como a de não repetir as matérias para além de um determinado número de vezes fixados pela própria categoria jornalística).
Numa sociedade composta de zumbis famintos de celebridades, inflacionar os fatos e divulgar imagens e dados dos envolvidos pode ser, pois, parte do crime.
Lembremos: escolas são templos dinâmicos, vivos, erguidos ao culto da liberdade de ideias, da inclusão e do respeito mútuo – só se aprende em ambientes estimulantes e livres de preocupações.
Portanto, são locais de diversidade, de pluralidade e de diálogo por excelência.
Protegê-los é proteger nossa civilização.
Segurança pública também: é destes campos do gênio humano que a todos alcançam. Confiar em quem se preparou para servir e proteger é fundamental numa sociedade fortalecida internamente.
Hora é de pensarmos fora do riscado, da obviedade, e solucionarmos de forma mais simples, barata e eficiente.
Alunos não são reféns. Nem devem ter a capacidade de aprender aprisionada na jaula do medo cujas barras são a inércia e a má gestão.
E fique este princípio: precisamos proteger nossos templos – de conhecimento e de liberdade – da conversão em masmorras prisionais, em cárceres medievais em forma de fortalezas modernas.
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Coronel da reserva, Marcos Boldrin é urbanista e ex-secretário da Administração e do Meio Ambiente