Elon Musk, se deixar, compra até a carótida da sua mãe
Você já teve o prazer de conhecer alguém muito rico? É uma situação curiosa, por causa de dois pontos. O primeiro, e mais óbvio, é que é aí que você percebe que é bastante pobre se se comparar com o rico, e assim muito possivelmente você o será até a morte. Dois, e menos óbvio, é que se você reparar bem dá pra perceber que o rico diuturnamente morre de medo de ficar pobre, cair do outro lado do jogo, isto é, do nosso lado, do lado dos que se a fatura do cartão extrapolar mil reais já dá alopecia. Então, não se iluda, todas as vezes que um rico diz por aí que fez quaisquer tipos de negócios em nome de quaisquer avanços civilizatórios, acredite, é a mentira da mais grossa da lama do pântano. Ele fez o que fez porque só quer ficar mais rico ainda, especialmente porque ter dinheiro é gostoso demais e, como tudo que é bom na vida, é viciante. No capitalismo, aliás, isto pode ser amplamente lícito.
Elon Musk, então, é um caso à parte. Ele não é simplesmente um rico. É, segundo a Forbes, o homem mais rico do mundo com uma fortuna estimada em mais de 200 bilhões de dólares. E olha que tem bastante gente no mundo! Nossa cabeça de pobre nem consegue processar o que fazer com esta grana. Eu, por exemplo, depois de comprar minha casa com uma churrasqueira e conhecer uma dúzia de países que tenho curiosidade, não sei mais o que fazer, só me vem à cabeça tentar ajudar as pessoas. Mas ajudar os outros é coisa de pobre, eu nem sou rico e já estou gastando errado. Porque, se eu fosse rico, abriria uma instituição filantrópica bem grandona, dessas que são isentas de impostos, para colocar parte da minha fortuna lá e fazer a maioria das pessoas acreditarem que eu estou preocupado com a desigualdade social. Senta lá, Cláudia.
Quer dizer então, Professor Taoni, ou carinhosamente conhecido nas escolas como Tatá, que o Elon Musk é um mentiroso? Na moral, aqui na boca pequena, só entre nós, porque falar mal de gente rica é meio arriscado… Sim, é isto mesmo que eu vejo e acredito, ele mente e mente bonito demais, só mentira boa e super lucrativa. Quer ver dois breves exemplos? Ele é dono, entre outras coisas, de duas empresas brutais, a Tesla do setor automobilístico e a SpaceX do setor aeroespacial. As duas líderes de mercado global e ambas apoiadas em duas mentiras muito bem tramadas que enganam quase que o planeta todo. Quase todo, porque não enganam o Tatá, por exemplo, e eu vou te explicar o porquê…
A Tesla faz carros elétricos. Carro não é novidade para ninguém. A eletricidade também não. Mas carros elétricos, de repente, estão parecendo um negócio da China. E de fato certas combinações tecnológicas quando acontecem viram fenômenos de mercado. Faz uma forcinha aí na memória e lembra, por exemplo, do iPod, quando ele começou a entrar na internet e fazer ligações virou o iPhone, celular que quando lança um modelo novo alguém em algum lugar do mundo vai quebrar três costelas pisoteado na fila do lançamento. O carro Tesla é o novo iPhone, com a diferença que ele custa dezenas de vezes mais, isto se o consumidor for abençoado de receber em dólar americano.
E qual é a mentira da história, afinal? A mentira, que vende mais que Cola-Cola gelada, é que a Tesla brada por aí que os carros elétricos serão o futuro do planeta sustentável. E o que é ser sustentável? É seguir um modelo de desenvolvimento desenhado pela ONU no final dos anos 1990, que propõe equilíbrio entre direitos humanos, produção econômica e preservação dos biomas do planeta em uma agenda de 17 metas bem pouco modestas. Carros elétricos realmente não queimam gasolina, álcool, querosene, diesel, ou qualquer coisa, não têm combustão e, logo, andam sem poluir. Porém, têm lítio, matéria-prima mineral das baterias, que duram alguns anos e depois viram resíduo sólido pesado, ou seja, destes que descartar é potencialmente, justamente, um problema ambiental bizarro. Outra notícia, o lítio acabará um dia, do mesmo jeito que o petróleo. Outra notícia, essa a melhor de todas, a eletricidade nos EUA, Europa e Ásia é super suja, vêm quase toda ela, tipo 80% dela, de carvão queimado e urânio enriquecido. Isto é, se o carro não está poluindo, a eletricidade que ele usa polui por ele e muito mais.
Outra pataquada que faz todo o rebanho bovino da JBS dormir é a tal da SpaceX, esta é ainda mais inacreditável. A empresa faz foguetes que levam civis, não militares, para um rolê para fora da Terra e volta de ré. O foguete do Elon Musk dá ré, Jesus Cristo! Mas esta gente vai fazer o que fora da Terra, companheiro? Tomar um guaraná com laranja? Ver um show da banda de Deus? Brincar de Apollo 13 e bombar nos stories? Ou, na verdade, quem sabe, comprar uma experiência caríssima e exclusivíssima garantidora de grande capital simbólico, ou status, para quem participa das aventuras desta empresa que cresce mais do que chuchu na cerca.
Mas, o real motivo desta empresa desenvolver-se numa velocidade louca, não é o de levar gente para fora da órbita, depois do fim da nossa última camada atmosférica. É, absurdamente, o discurso de colonizar Marte, casado com uma ampla crença popular que isto é possível e é melhor do que consertar a Terra. Marte é o próximo planeta do nosso sistema solar, as temperaturas são dezenas de graus abaixo de zero, lá é mais seco que o deserto do Saara, o solo é duro, pedregoso e desnutrido, a atmosfera tem gases que levam o sistema respiratório humano ao colapso, a gravidade é um terço da nossa e Marte possui a metade do tamanho da Terra. Isto é, quando em algumas décadas a gente acabar de trucidar nosso planeta, ainda sim, será bem mais gostoso do que em Marte que não tem nem oxigênio para respirar. Todavia, quanto mais pessoas creem que é plausível morar em Marte e ver a desgraça terráquea de longe, mais a SpaceX cresce, e mais perto o Elon Musk fica de comprar a Nasa. Pensou? Olha aí como as mentiras são lucrativas.
Agora, a última mentira, a mentira do século, talvez a mais lucrativa de todas, está demais: Elon Musk comprou o Twitter ontem, empresa informacional de comunicação com usuários nos quatro cantos do mundo, sob o pretexto de que a empresa praticava censura e ele, como bom samaritano que é, vendendo carros que poluem na fonte ou mesmo o sonho de ser vizinho de um E.T., não poderia concordar com o fato de que centenas de milhões de pessoas, que ele não conhece, que não compram carros elétricos ou passagens para Marte, passassem por este constrangimento ideológico.
Diante desta grande injustiça planetária, tão ruim quanto a luta de classes, ou a fome no mundo, ou o derretimento das calotas polares, o empresário comprou 9% das ações da empresa numa pancada só e, na sequência, ameaçou vender a mesma parcela caso o Twitter, que não estava à venda, não aceitasse ser comprado pela bagatela de 44 bilhões de dólares. E se o Twitter dissesse não? Ele liquidava o que comprou e gerava um processo de desvalorização da empresa que implicaria, por baixo, em milhares de desempregos diretos. Xeque-mate! Agora ele é dono também de um meio de comunicação onde transitam ideias que podem definir a eleição de um país como, por exemplo, o Brasil, que, inclusive, já elegeu representações importantíssimas com ideias fictícias das redes sociais, com coisas evidentemente mentirosas, mas que seduzem muito nossos corações moralista, especialmente na hora de apertar os números da urna. Ou alguém aí achou o “kit gay” escolar ou Jesus na goiabeira nos últimos quatro anos?
Liberdade de expressão é um terreno perigoso de explorar. Paulo Freire dizia que liberdade de mais faz mal. E, honestamente, eu acho que ele estava e ainda está 100% correto. Imagina só se na nossa criação não tivéssemos sido repreendidos quando, sem querer e sem maldade, falamos alguma coisa errada, algum impropério, algo fora do socialmente aceitável? Não dá, né? Então, por que há de ser diferente com as redes sociais? Da onde vem esta concepção absurda de que liberdade de expressão é sinônimo de falar o quê, quando e onde quiser?
Usei o Twitter apenas uma vez na vida e prometi pra mim mesmo nunca mais voltar, porque ali, justamente, deu pra notar rapidinho o que é uma rede social operando a partir de um vale tudo sensacionalista achincalhado, sobre quaisquer coisas que possam viralizar, tudo curtinho em 280 caracteres para quaisquer desgraças espalharem na velocidade da luz. Twitter faz parecer o programa do Datena um passeio na Disney, e eu tenho certeza que o mundo seria melhor se o Twitter não existisse. Mas, infelizmente, pelo andar da carruagem, em breve iremos twittar de carros elétricos trafegando nas rodovias marcianas… Só que não.
PS.: Se você fez algum workshop de desenvolvimento pessoal na vida, provavelmente lavaram o seu cérebro com exemplos célebres de carreiras apoteóticas de empreendedores, e na listinha deve estar lá o Elon Musk. Mas, para que isto não vire um ressentimento na sua vida daqui alguns anos, deixa eu te adiantar uma coisinha… Você, muito provavelmente, não vai ficar rico a não ser que herde. Podemos e devemos melhorar de vida material, é óbvio, agora mudar de classe social é bem mais improvável. E outra coisa, o mais legal de tudo, sobre ficar tão rico quanto o Elon Musk, aí eu te prometo que você não vai conseguir, é só impossível! E por que? Porque seu papai não foi, ou não é, dono de uma mina de metais preciosos na África, como o papai do Elon. Esta verdade, meu amor, é presente meu… De nada!