Evangélicos dobram e encurtam distância dos católicos em Marília

“Entre o crescimento evangélico contínuo e a queda acelerada do catolicismo, o dado preocupante é o crescimento explosivo do grupo dos ‘sem religião’, mostrando desesperança, secularização e desinteresse pela própria espiritualidade de parte da população. O fato é que o Brasil está menos cristão.” A fala do pastor Augusto Gonçalves, presidente do Conselho de Pastores Evangélicos de Marília (Conpem), expressa não apenas uma preocupação pastoral, mas também uma leitura atenta dos dados do Censo Demográfico de 2022.
O levantamento do IBGE, divulgado na semana passada, revela que Marília segue as tendências nacionais: há uma diminuição significativa do número de católicos e um crescimento constante dos evangélicos — ainda que em ritmo mais brando nos últimos anos — além do aumento expressivo do grupo que se declara sem religião.
Em Marília, a população com 10 anos ou mais chega a 209.458 pessoas. Destas, 111.733 se declararam católicas (53,34%), 65.543 evangélicas (31,29%) e 13.586 sem religião (6,49%). Em 2000, os evangélicos representavam apenas 16,72% da população da cidade. Em 2010, já eram 25,37%. Agora ultrapassaram os 30%, o que coloca Marília acima da média nacional, que é de 26,9%, com este público.

Ainda segundo Augusto Gonçalves, a expansão evangélica nas últimas décadas tem múltiplas causas: desde a pregação contextualizada e linguagem acessível dos cultos, até a atuação intensa dos fiéis leigos nas comunidades. “A igreja evangélica soube atender aos desafios da vida moderna, oferecendo apoio comunitário, pertencimento e formação espiritual acessível. Isso tem um impacto direto na vida das pessoas, principalmente nas periferias”, aponta.
Ele destaca ainda que o surgimento de igrejas independentes — com menor burocracia e maior capilaridade — contribuiu para a disseminação do movimento, além da atuação marcante dos pentecostais nas franjas sociais da cidade.
Por outro lado, o pastor alerta para a complexidade do momento atual. “Houve uma desaceleração do crescimento e, se esse ritmo se mantiver, a previsão é que os evangélicos se igualem aos católicos apenas por volta de 2042. E ainda é cedo para avaliar o impacto que a pandemia da Covid-19 teve nesse processo. Vamos precisar esperar o próximo censo”, ponderou.
Além disso, há sinais de transformação mais profunda no tecido espiritual da população. “Já vemos o surgimento de figuras como o ‘evangélico não-praticante’ ou o cristão ‘desigrejado’, que se identifica com a fé, mas não participa da vida em comunidade. Isso é reflexo de uma secularização que está em curso, especialmente nas gerações mais jovens”, analisa.

Esse mesmo fenômeno preocupa também o bispo diocesano de Marília, Dom Luiz Antonio Cipolini. Para ele, a queda no número de católicos não é o dado mais grave. “Como pastor, o que realmente me preocupa e que deve nos provocar enquanto Igreja é o aumento do número dos brasileiros que se declararam sem religião”, afirmou. Em 2000, os católicos representavam 73,13% da população de Marília; em 2010, 62,46%. Hoje, pouco mais da metade se identifica com a fé católica.
“Façamos de nossas paróquias, comunidades e grupos eclesiais, lugares de acolhida sincera, a fim de que nos estruturemos cada vez mais como ‘Igreja em saída’, que vai ao encontro daqueles que estão nas periferias existenciais”, disse o bispo.

Outros grupos religiosos também cresceram na cidade. As religiões de matriz africana, como Umbanda e Candomblé, por exemplo, passaram de 0,04% em 2000 para 0,54% em 2022. “Nossas casas estão abertas para todos, principalmente para a comunidade Lgbtqia+, que muitas vezes encontra acolhimento espiritual aqui”, explica o pai Júlio, sacerdote do Templo das Águas de Yemanjá. Para ele, a inclusão e o respeito são pilares que ajudam a atrair novos adeptos.
A cidade também registra a presença de espíritas (3,17%), adeptos de outras religiosidades e grupos menores como os de tradição indígena.

Mas o dado que chama a atenção de todos os líderes religiosos entrevistados é o crescimento do número de pessoas que dizem não ter religião. Esse grupo passou de 4,92% em 2010 para 6,49% em 2022 em Marília. Um número que, embora pequeno, indica uma tendência crescente de secularização e afastamento institucional da fé.
Ainda na leitura de Augusto Gonçalves, o país vive uma transformação religiosa mais complexa do que simples trocas de rótulo. “Estamos diante de um novo perfil espiritual. E esse cenário exige que as igrejas, de todas as tradições, se reinventem e compreendam melhor os anseios da sociedade contemporânea.”

DADOS POR SEXO
Analisando os dados por sexo, o Censo 2022 identificou 99.589 homens e 109.869 mulheres com 10 anos ou mais em Marília. Entre os homens, a distribuição religiosa foi de 53.747 católicos, 29.739 evangélicos, 2.724 espíritas, 573 de umbandistas e candomblecista, 29 de tradições indígenas, 4.908 de outras religiosidades, 7.733 sem religião, 49 que não souberam e 88 que não declararam.
Já entre as mulheres, 57.986 são católicas, 35.804 evangélicas, 3.908 espíritas, 553 de umbandistas e candomblecistas, 43 de tradições indígenas, 5.558 de outras religiosidades, 5.854 sem religião, 65 que não souberam e 99 que não declararam. Numericamente, há mais homens do que mulheres que se declararam sem religião em Marília.
RAÇA OU COR
A pesquisa também segmentou a população por cor ou raça, apresentando dados detalhados para cada grupo. A maior parte da população mariliense com 10 anos ou mais se declarou branca (123.737 pessoas). Destes, 69.977 são católicos (56,55%), 34.332 evangélicos (27,75%), 5.157 espíritas (4,17%), 548 umbandistas e candomblecistas (0,44%), 20 de tradições indígenas (0,02%), 5.899 de outras religiosidades (4,77%). O grupo sem religião entre as pessoas brancas totaliza 7.639 pessoas (6,17%). Houve ainda 68 (0,05%) que não souberam e 99 (0,08%) que não declararam.
Entre a população preta (12.580 pessoas), 5.444 são católicos (43,28%), 4.986 evangélicos (39,63%), 151 espíritas (1,20%), 241 de Umbanda e Candomblé (1,92%). Não houve declarações de tradições indígenas neste grupo. Outras religiosidades somam 659 pessoas (5,24%). O grupo sem religião entre as pessoas pretas é de 1.090 pessoas (8,66%) e nove (0,07%) não declararam.
A população amarela totaliza 4.865 pessoas. A distribuição religiosa inclui 2.551 católicos (52,44%), 695 evangélicos (14,29%), 281 espíritas (5,78%), 11 de Umbanda e Candomblé (0,23%). Outras religiosidades somam 915 pessoas (18,81%). Pessoas Sem religião representam 410 (8,43%).
O grupo de pardos é o segundo maior em Marília, com 68.079 pessoas. Dentre eles, 33.691 são católicos (49,49%), 25.505 evangélicos (37,46%), 1.029 espíritas (1,51%), 327 umbandistas ou candomblecistas (0,48%), 43 de tradições indígenas (0,06%), e 2.972 de outras religiosidades (4,37%). As pessoas que se declararam sem religião neste grupo são 4.386 (6,44%). Há ainda 46 (0,07%) que não souberam e 80 (0,12%) que não declararam.
Já população indígena em Marília com 10 anos ou mais é de 197 pessoas. A distribuição religiosa mostra 69 católicos (35,03%), 25 evangélicos (12,69%), 14 espíritas (7,11%). Não há declarações de Umbanda e Candomblé neste grupo (0,00%). Tradições indígenas somam oito pessoas (4,06%), e outras religiosidades são 20 (10,15%). No grupo indígena, a proporção de pessoas sem religião é a mais alta entre todos os grupos raciais, atingindo 61 pessoas (30,96%).