O ‘fio’ da Terra
Outro dia, ao rever a belíssima reportagem que o Globo Rural fez sobre o maior repórter de todos os tempos, José Hamilton Ribeiro, me ocorreu que o experiente jornalista afirmou, certa vez, que a profissão de repórter é a melhor do mundo.
Sou repórter desde os meus 16 anos e estou prestes a completar 43. Numa rápida conta, posso dizer que lá se vão 27 anos nesta lida. Ainda não posso responder se é a melhor profissão do mundo, contudo, para mim, é a que mais permitiu realizar e ajudar as pessoas. Também assegurou a mim manter viva a chama de uma esperança, esperança por dias melhores.
Certos dias melhores consegui observar após as minhas reportagens e um deles – sempre revivo esta história verídica – foi quando da reportagem que elaborei para a Folha de S. Paulo sobre a vocação econômica de Marília no campo da tecnologia da informação. A matéria especial saiu bem no dia em que o então governador do Estado de São Paulo visitava a cidade e, a partir dessa repercussão, o movimento para transformar a cidade num dos parques tecnológicos do Estado de São Paulo ganhou força.
Na véspera desta matéria, lembro que fui barrado na porta de uma empresa de TI que não permitiu que eu fizesse a foto do seu ambiente corporativo. Muito educado e calmo, disse para o responsável da companhia: “você acaba de perder a chance de ver a foto da sua empresa num dos maiores jornais de circulação nacional do Brasil.”
Dentro do carro – e segurando a máquina fotográfica que o Cristiano Gonçalves, diretor do semanário Jornal Cidade, de Marília, havia me emprestado -, lembrei do fotógrafo e também jornalista Ivan Evangelista Júnior. Liguei para o Ivan, ele tinha no grande acervo que mantém uma imagem magnífica de uma mesa digital desenvolvida em Marília. Dito e feito: a foto saiu no caderno especial que a Folha de S. Paulo vinha preparando sobre experiências exitosas em todo o território do Brasil.
A matéria “Polo de tecnologia cresce em Marília e atrai universitários” pode ser lida no link a seguir: https://www1.folha.uol.com.br/fsp/especial/172896-polo-de-tecnologia-cresce-em-marilia-e-atrai-universitarios.shtml.
Esta é uma fração de que lembro do desdobramento da safra do suor de um jornalista. Existem outras e algumas nem daria para detalhar devido ao sigilo e à ética profissionais. Se pegarmos o lado de ouvinte de um repórter, mas dos repórteres raízes, do tipo que saem a campo para ouvir as pessoas na rua, sem ficar nos “aquários” e “bolhas” de redações refrigeradas em prédios corporativos, posso dizer que nestas quase três décadas de estrada, guardo de memória ótimas narrativas. Vivências que ouvi de gente anônima e famosa.
Numa dessas, o saudoso Pena Branca, cantor caipira, me contou sobre o fã que chegou ao show numa praça de bicicleta e ficou o tempo todo pedindo para que fosse interpretada a música “O ‘fio’ da Terra”. Na verdade, era a belíssima composição de Chico Buarque e Milton Nascimento “O cio da Terra”.
“Era a música que a gente encerrava o show, mas aquele fã ficou insistindo tanto, que eu e o Xavantinho invertemos a ordem e cantamos para ele o ‘fio’ da Terra. Assim que terminamos, ele pegou sua bicicleta e foi embora feliz”.
E aqui pergunto: quantas vezes em nossas vidas uma música não nos salva? Respondo, incontáveis! Sobre a profissão de repórter ser a melhor do mundo, posso dizer o seguinte: ser jornalista pode não ser tão bom assim, mas nestes 27 anos de trabalho perdi a conta de quantas vezes sai da redação e voltei para casa muito feliz como aquele fã do Pena Branca.