Preconceitos: a necessidade de superação
Na última semana, o mundo acadêmico foi sacudido pela nomeação da nova presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), fundação autárquica vinculada ao Ministério da Educação (MEC) e responsável pela pós-graduação stricto sensu (mestrado e doutorado) do Brasil.
As novidades na indicação da professora, doutora Cláudia Mansani Queda de Toledo para comandar o mais alto cargo da pós-graduação brasileira não eram poucas: pela primeira vez a ocupante do cargo congregava os fatos de ser mulher, oriunda da área do Direito, proveniente de uma instituição de ensino particular, localizada no interior de um dos Estados da Federação (Bauru/SP).
Não pretendo entrar no mérito da indicação, em especial porque se trata de ato discricionário do Ministro da Educação que, como bem sabem os que estudam Direito Administrativo, é revestido de mérito administrativo, ou seja, o agente pode avaliar a conveniência e oportunidade do ato a ser praticado.
Além disso, é certo que algumas críticas quanto à indicação são fundadas em critérios técnicos e objetivos, em face das quais também não pretendo me manifestar no presente artigo, em razão da diversidade de opiniões que existem na análise do caso.
Gostaria de focar esse breve ensaio em outro ponto: como a indicação da nova presidente da Capes fez aflorar em algumas pessoas preconceitos que, sinceramente, eu imaginei que já tivéssemos superado.
O primeiro deles diz respeito à sua área de formação. Várias foram as manifestações de reprova à nomeação baseadas no fato de a escolhida ser formada em Direito e não em uma “ciência dura”, como matemática, química, física, etc. Chegaram a dizer que, como doutora em Direito, a nova presidente não seria da área da ciência (um aparte: confesso que já estou cansado dessa postura que algumas pessoas têm adotado de tentar desqualificar a outra dizendo que ela não é da “ciência”). Direito é, sim, uma ciência social aplicada e, como tal, merece respeito e ter reconhecida a sua importância para a vida em sociedade.
Outras críticas preconceituosas se fundamentaram no fato de ela ser oriunda de uma escola particular. Nesse sentido, importante destacar que dados divulgados pelo Ministério da Educação indicam que, em 2019, o Brasil contava com 2.608 instituições de ensino superior, sendo 2.306 privadas e apenas 302 públicas. Dentre os alunos, do total de 8.604.526, a maior parte, 6.524.108, estava na rede privada de ensino.
Pelos números é possível verificar que as escolas particulares são responsáveis pela formação da maioria de nossos jovens, em especial porque muitos deles precisam conciliar trabalho e estudo, numa equação nem sempre possível nas instituições públicas. Assim, julgar alguém apenas pelo fato de ele ter se formado em uma escola particular é um grande erro e revela, em certa medida, um grave preconceito.
Por fim, outras críticas, se fundaram no fato da atual presidente ser oriunda de uma “faculdade do interior”, com ênfase no “interior”, como se só as capitais dos Estados fossem habitadas por vida inteligente. Nesse ponto, importante destacar que praticamente metade da população brasileira mora em cidades do interior e qualquer crítica nesse sentido é extremamente preconceituosa e excludente, pois deixaria de fora de qualquer análise um em cada dois brasileiros.
Como canta Caetano Veloso, “Narciso acha feio o que não é espelho”, mas é necessário que possamos superar nossos preconceitos e nos reconhecer como brasileiros, todos com direito de ser tratados com respeito e consideração, independentemente de raça, cor, gênero, credo, orientação sexual, etc., mas também origem, área de formação e instituição de ensino.
Críticas são possíveis e bem-vindas, desde que sejam objetivas e fundadas em critérios técnicos e não em preconceitos.
Afinal, se não conseguirmos superar preconceitos e conciliar nossas diferenças, dificilmente conseguiremos formar uma grande Nação!