Justiça condena vice-prefeito de Garça por homofobia contra vereador
A Justiça de Garça condenou o vice-prefeito da cidade, Flávio Aparecido Peres (MDB), por injúria referente a uma piada de tom homofóbico que fez contra o vereador Fabio José Polisinani, o Fabinho Polisinani (PSD), durante sessão na Câmara de Vereadores local, no dia 8 de março do ano passado.
A sentença é assinada pela juíza Renata Lima Ribeiro Raia da 1º Vara do Foro de Garça, com data do último dia 23. A decisão é para que Flávio pague uma multa equivalente a R$ 17.160 e cumpra pena de reclusão de um e quatro meses. No entanto, a pena privativa de liberdade foi substituída por duas restritivas de direito, referentes a duas multas de R$ 13.200 cada.
No total, o vice-prefeito terá que desembolsar R$ 43.560 para quitar o valor da pena.
Em nota, a assessoria jurídica de Peres informou que vai recorrer da sentença. “Respeitamos a decisão proferida em primeira instância, mas ela não é definitiva e vamos lutar para que os fatos sejam devidamente esclarecidos perante o Poder Judiciário”, diz o comunicado.
O CASO
O Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP) descreve, na denúncia, que o crime aconteceu em sessão em homenagem ao Dia Internacional da Mulher, que era inclusive transmitida ao vivo pelos canais oficiais da Casa Legislativa no Facebook e Youtube.
Durante a fala em tribuna o vice-prefeito se dirigiu ao vereador com uma suposta brincadeira de tom homofóbico.
“Dizer para vocês que hoje é um dia importante para nós, homens, nós temos nossas mulheres, né. Né, Fabinho? Né, Fabinho? (risadas do orador)…não podia deixar né, Fabinho! Não podia deixar essa piadinha (risadas do orador)”.
Segundo o MP-SP, as palavras foram desnecessárias e de desqualificação em razão da homossexualidade da vítima. Além de terem sido proferidas na presença das pessoas que estavam na Câmara, também acabaram ouvidas por inúmeros internautas que assistiam à sessão pela internet.
ACUSAÇÃO
Em alegações finais apresentadas oralmente, o Ministério Público pediu a condenação nos termos da denúncia. Alegou, em síntese, que o Supremo Tribunal Federal (STF) conferiu interpretação para englobar no conceito de racismo uma eventual discriminação ou preconceito praticados em razão da orientação sexual.
Para o MP-SP, o acusado agrediu a honra da vítima, usando de palavras desnecessárias e inconsequentes, alusivas à sua orientação sexual, de forma a desqualificar o ofendido em razão de sua homossexualidade, colocando-o ainda em posição vexatória.
DEFESA
O Marília Notícia entrou em contato com o vice-prefeito, que alegou não poder conversar porque estaria em viagem à China.
No processo, a defesa de Flávio Peres pediu sua absolvição, alegando ausência de dolo específico. Registrou que a única intenção do réu era mencionar, na solenidade de homenagem ao Dia da Mulher, de forma descontraída, que todas as mulheres que faziam parte da vida dos presentes na sessão mereceriam ser homenageadas, e a própria vítima teria insinuado que compreendeu que a homenagem do vice-prefeito se estendia a sua mãe.
Na ação cível, segundo a defesa, a vítima teria reconhecido que foi utilizado mero tom jocoso. Para os advogados de Flávio Peres, o comportamento da vítima na Câmara e nas redes sociais depois do discurso do réu, não seria condizente com o abalo alegado.
Em seu depoimento, o vice acrescentou que respeita a todos e, pouco antes da sessão, conversou bastante com a mãe da vítima, que o agradeceu pelo emprego da filha em sua empresa, onde ela aprendeu a trabalhar com parte eletrônica, conhecimento que teria sido importante para ela ao ir trabalhar no Japão. O vereador estava junto com a mãe e participou da conversa, diz a defesa de Peres.
O vice-prefeito alegou ainda que o caso foi um mal-entendido, porque teria usado um termo errado no momento. No dia da sessão, Flávio disse que Fábio estava alegre e contente, mas não sabe porque mudou de ideia no dia seguinte. Ele soube que a vítima estava diferente nas redes sociais e o procurou para pedir desculpas.
Segundo o relato ainda da defesa, Flávio teria ligado para o parlamentar para perguntar o que tinha acontecido, por que estaria bravo, e Fábio teria supostamente respondido que estaria sofrendo pressão, desligando o telefone em seguida.
Vale lembrar que Fabinho Polisinani faz parte da oposição ao atual grupo que comanda Garça.
O vice-prefeito disse ainda, no depoimento, que todos sabem que Fábio é homossexual. Reforçou a defesa de que a piada não foi para insultar o vereador e ressaltou nunca ter sido processado por ofensas.
A VÍTIMA
Diante da fala do acusado, Fábio Polisinani contou ao Marília Notícia que ficou ‘sem chão’. “Sempre tive uma vida bem discreta, sempre fui homossexual, mas bem discreto. Nunca fui uma pessoa de ficar se mostrando, porque fui criado em uma igreja evangélica, e com a ocorrência desta situação na tribuna da Câmara, onde estou vereador, foi muito chato”.
O vereador ainda relatou que sofreu represália de alguns moradores. “Riscaram meu carro, pessoas me xingaram na rua, o povo é ignorante quando a isto, não aceita. Mas a vida é minha, é particular. Eu tive que trocar meu número de celular”.
Relatou ainda que ficou mal pela situação e até sua mãe sofreu com o caso. “Fiquei quatro dias passando mal, independente de ter uma sexualidade definida, foi horrível pela exposição. Minha mãe precisou de atendimento médico no outro dia, algumas irmãs ligaram para ela dizendo que eu tinha enganado elas, que Deus condenava a homossexualidade”.
Fábio confirmou que conversou com o vice-prefeito pouco antes da sessão e que acredita que a piada sobre sua sexualidade é um ataque político. “Eu apresentei ele para minha mãe, que agradeceu ele, mas logo depois ao subir na tribuna, ele ‘vomitou’ todo esse lixo. Quiseram me bater porque eu sou vereador de oposição, mas quem me conhece e acredita no meu trabalho ficou do meu lado, eu tive muito apoio”.
Polisinani confirmou também que recebeu a ligação do vice-prefeito no outro dia. “Ligou, mas eu não quis conversa com uma pessoa que me ofendeu na tribuna e depois quer se retratar. Tem que ter respeito. Depois da ofensa eu não tive reação, fiquei muito ‘sem chão’, não esperava nunca”.