Bets, violência e redes sociais desafiam Justiça Eleitoral e exigem reação do TSE
Desinformação, apostas eleitorais e episódios de violência em campanha não são exclusividade das eleições de 2024, mas se tornaram os principais desafios para a Justiça Eleitoral neste ano, demandando uma reação à altura do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
A presidente da corte, ministra Cármen Lúcia, atacou duas dessas questões –bets e violência– só no último mês. Primeiro, sugeriu as mudanças depois aprovadas em plenário para proibir apostas eleitorais. Até então não havia regulamentação específica sobre o tema.
Pelo menos seis plataformas exploravam o serviço de apostas cujo objeto envolvia as eleições municipais de 2024 e permitiam aos usuários arriscar dinheiro na expectativa de vitória de um candidato. Elas voltaram atrás.
Neste sábado (5), por exemplo, o juiz Rodrigo Marzola Colombini, da 2ª Zona Eleitoral de São Paulo, concedeu liminar determinando a pronta exclusão de vídeos publicados nas plataformas Instagram, TikTok e Youtube fazendo referência a um falso laudo divulgado um dia antes pelo candidato Pablo Marçal (PRTB) contra o adversário Guilherme Boulos (PSOL).
A advogada e cientista política Gabriela Rollemberg considera a atuação preventiva do TSE importante para evitar um eventual prejuízo ao processo eleitoral e que a restrição às apostas eleitorais vem em boa hora.
“A utilização dessas ferramentas, com algum viés ou poder econômico por trás, permite maquiar a situação eleitoral de um determinado candidato, possibilitando que ele tenha uma chance maior de se eleger ou ir ao segundo turno –o que é vedado pela lei”, diz ela.
Cármen também acionou a Polícia Federal, o Ministério Público e os TREs (Tribunais Regionais Eleitorais) para darem rapidez e prioridade às investigações e julgamentos sobre “casos de violência da mais variada deformação que se vem repetindo”.
A medida veio na sequência do soco desferido pelo assessor de Pablo Marçal (PRTB) Nahuel Medina em Duda Lima, marqueteiro do prefeito Ricardo Nunes (MDB), no debate promovido pelo Flow em parceria com o Nexo Governamental XI de Agosto.
O próprio influenciador já havia sido atingido por uma cadeirada do apresentador José Luiz Datena (PSDB) em evento anterior e impunha dificuldade à Justiça Eleitoral diante das ofensas reiteradas que fazia, mesmo após decisões judiciais.
“Não só a violência, mas o crime organizado”, diz Sidney Sá das Neves, presidente da comissão de direito eleitoral da Ordem dos Advogados do Brasil. “A participação de facções no lançamento de candidaturas preocupa a Justiça Eleitoral”.
O Conselho Nacional do Ministério Público até editou uma norma para regulamentar a atuação do MP Eleitoral, dos núcleos de inteligência e dos grupos de combate a organizações criminosas, visando identificar e combater a influência do crime no processo eleitoral.
O texto prevê uma série de obrigações às unidades do Ministério Público, desde o compartilhamento de informações, sistemas e estratégias até a criação de rotinas para esse compartilhamento de dados e ações coordenadas de investigação e inteligência.
Anderson Alarcon, advogado e membro fundador da Abradep (Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político), diz que houve uma atualização no modo como a Justiça tem atuado em casos relacionados a redes sociais.
O eleitoralista cita a suspensão das redes de Marçal em ação cujo mérito não foi julgado como exemplo. O caso concreto trata da suposta prática de abuso de poder econômico e uso indevido dos meios de comunicação decorrentes de monetização de cortes.
Juízes e desembargadores também começaram a determinar a remoção de deepfakes (conteúdos falsos de foto, áudio ou vídeo forjados com inteligência artificial). O TSE proibiu o emprego da tecnologia pela primeira vez neste ano.
A moderação de conteúdo e a responsabilização de empresas era tratada no projeto de lei 2.630/2020, conhecido como PL das Fake News, mas a proposta terminou enterrada na Câmara dos Deputados, sem acordo sobre o tema.
“A lei nem sempre dá conta de estar atualizada em relação aos desafios do seu tempo, e a Justiça Eleitoral traz interpretações para dar uma resposta a essas novas questões, que não estão regulamentadas, mas não podem ficar sem resposta, sem combatividade”, diz Alarcon.
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POR ARTHUR GUIMARÃES