“A Câmara não é quintal do Executivo”, afirma Rezende
O presidente da Câmara de Marília, vereador Marcos Rezende (PSD), negou a existência de qualquer acordo para proteger Abelardo Camarinha (Podemos) na reapreciação das contas municipais de 2003 e 2004.
Ele também recriminou a pressão de setores do governo Daniel Alonso (PSDB) sobre o tema, falou em interferência entre os poderes e declarou que “a Câmara tem seu próprio tempo”.
A ‘cautela’, segundo o parlamentar, tem o objetivo de evitar novas revisões jurídicas das decisões a serem tomadas.
Em entrevista ao Marília Notícia nesta terça-feira (19) o chefe da Casa de Leis criticou especificamente o assessor especial de governo Alysson Alex Souza e Silva e disse que “a Câmara não é quintal do Executivo” e “nem será usada”.
Cerca de sete anos após a Justiça anular a rejeição das contas municipais de 2003 e 2004, em novembro de 2019 Alysson enviou ofício ao Legislativo solicitado a reapreciação do tema pelos vereadores. Um novo pedido no mesmo sentido foi feito na semana passada.
O objetivo da gestão Alonso é tirar Abelardo da disputa pela Prefeitura de Marília nas eleições deste ano, já que a reprova de contas pela Câmara implica na inelegibilidade do político.
Agora, com a aproximação do pleito, Alysson aumentou suas ofensivas contra Rezende na tentativa de ver o processo andar.
Segundo o presidente da Câmara, o assessor especial tentou inclusive “barganhar” com outras demandas, mas não foram dados detalhes. Consta apenas que reuniões para tratar de assuntos políticos que interessam Rezende foram desmarcadas por Alysson.
O assessor também tem prometido levar denúncias sobre a demora na votação ao Tribunal de Contas do Estado (TCE-SP) e ao Ministério Público para apuração de prevaricação – quando o servidor público deixa de cumprir o seu dever.
“Estou absolutamente tranquilo, ele [Alysson] pode denunciar o que ele quiser. Precisamos tomar todos os cuidados e garantir que haja a ampla defesa, sob pena de nulidade do processo de apreciação das contas”, respondeu Rezende.
“Quero saber se o assessor especial teria a mesma ousadia para cobrar o Judiciário da forma como tem agido com a Câmara sobre a algum processo a ser julgado. Ora, passaram outros presidentes pelo Legislativo e nada foi feito. Após receber os ofícios eu mandei imediatamente dar seguimento, mas o tema é complexo”, reclamou o vereador.
As anulações da rejeição das contas de 2003 e 2004 transitaram em julgado em 2012 com o entendimento de que Abelardo teve cerceado seu direito de defesa.
Desde então, já passaram pela cadeira da presidência da Câmara outros nomes antes de Rezende, quase todos alinhados com o grupo político de Abelardo Camarinha e que não agiram pela reapreciação.
“O que eu não vi até agora foi um ato de censura do prefeito Daniel Alonso (PSDB) às atitudes do Alysson”, apontou o representante do Legislativo, que lembrou ter um alinhamento programático com o governo municipal, mas explicou que não se trata de um “alinhamento automático”.
Mesmo assim, Rezende garantiu que não tem nada contra o chefe do Executivo, nem deve romper com ele, mas afirmou que as instituições precisam ser respeitadas.
Contas
O presidente da Câmara explicou que logo após receber o pedido de reapreciação das contas de Abelardo, chegou o período de recesso do Legislativo.
Já no começo deste ano, após a realização de poucas sessões, houve a necessidade de suspensão das atividades da Câmara por conta da pandemia.
Além disso, outros temas importantes acabaram dominando a pauta dos parlamentares, como os quase 40 projetos apreciados no final do ano passado e já em 2020 assuntos como o plano de cargos e carreira do funcionalismo.
Mesmo assim, Rezende garante que a questão das contas de 2003 e 2004 não ficou parada. “Existem muitas dúvidas sobre como tudo deve ser feito. É um caso sui generis (sem semelhança com nenhum outro), não há precedentes”, comentou.
Uma das peculiaridades é que já se passaram 17 anos desde o período a ser reanalisado. “Não sabemos se existe a obrigação de Abelardo ter guardado documentos de sua gestão por tanto tempo, por exemplo”.
Também não se sabe se seria necessário recolocar o tema apenas para votação no plenário, ou seria preciso todo um novo processo legislativo onde a Câmara assume o papel julgador, ou “é investida da toga”.
“Nossos dois procuradores jurídicos divergem sobre pontos importantes. Precisamos de um consenso para poder prosseguir. O caso está sendo estudado com muito cuidado”, explicou o presidente.
Rezende relembrou que vem tomando uma série de cuidados também na votação das contas do filho de Abelardo, Vinicius Camarinha (PSB), que assim como o pai já derrubou decisões sobre contas municipais na Justiça. A meta, segundo ele, é justamente evitar que isso ocorra novamente.
Questionado se a reapreciação das contas de 2003 e 2004 deve acontecer antes de outubro, o chefe do Legislativo disse que não tem como responder isso, mas que nada será feito “a toque de caixa” apenas para atender os objetivos de alguém e reafirmou o princípio da impessoalidade que rege o poder público.