Juízes federais apoiam maior parte do pacote de Moro
Em nota técnica, a Associação dos Juízes Federais (Ajufe), manifestou apoio à maior parte do pacote anticrime do ministro da Justiça e da Segurança Pública, Sérgio Moro. Mesmo com ressalvas, os magistrados concordaram com as principais propostas. A crítica mais dura foi direcionada ao excludente de ilicitude para policiais que matarem em serviço.
Em nota técnica, assinada pelo presidente, Fernando Marcelo Mendes, pelo Coordenador da Comissão Permanente de Acompanhamento da Reforma da Legislação Penal de Processual Penal da Ajufe, Walter Nunes de Silva Júnior, e outros 29 magistrados membros do colegiado, a entidade se manifestou favorável à maior parte das medidas de Moro para enfrentar a criminalidade.
Apesar de ressalvas, eles concordaram, por exemplo, com o “plea bargain”, a modificação da lei para consolidar a prisão após condenação de segunda instância, a proposta da criação do “informante do bem”, e a separação de julgamento de crimes comuns, quando conexos com eleitorais. Também apoiaram o incremento ao banco de DNA.
A entidade, no entanto, detonou o polêmico excludente de ilicitude. “Crítica especial fazemos quanto à expressão ‘violenta emoção’. Ora, da forma como redigida a norma, essa exculpação seria bastante utilizada nos frequentes casos de feminicídio”.
Prisão em segunda instância
Defendida pelo ministro desde os tempos em que era o juiz responsável pela Operação Lava Jato, a proposta para se consolidar, por meio da legislação, a prisão após segunda instância é apoiada pelos magistrados. “Somos favoráveis às propostas no sentido de que o cumprimento da pena pode ter início a partir da condenação imposta por acórdão”, afirmam.
Os juízes federais também “concordam plenamente com a proposta em relação à alínea e do inciso I do art. 492 do Código de Processo penal, que define o início do cumprimento da pena após a decisão do Tribunal do Júri”. “No particular, cabe observar que, em decorrência da soberania dos veredictos, as decisões do Júri possuem foros de definitividade, só sendo admitida discussão quanto ao mérito na hipótese apertada em que os veredictos sejam considerados manifestamente contrários à prova dos autos”.
“O recurso de apelação das decisões do Tribunal do Júri é de fundamentação vinculada, assemelhando-se, no ponto, aos recursos especial e extraordinário. Ademais, ainda assim, do mesmo modo como feito em relação ao recurso de acórdão condenatório, houve a cautela de se estabelecer a possibilidade de o juiz-presidente do Tribunal do Júri suspender o início do cumprimento da pena, quando existente questão substancial a ser submetida ao Tribunal Regional Federal ou Tribunal de Justiça, com o condão de reverter a condenação”, opinam.
Os magistrados dizem só não ser “de todo favorável a que o recurso da decisão de pronúncia seja destituído de efeito suspensivo”. “Ainda que não deva suspender o andamento do processo, creio que o julgamento do tribunal do júri é, no mínimo, temerário, quando ainda pendente de apreciação o recurso da decisão de pronúncia, conforme proposto”.
Não persecução
Com algumas ressalvas, os juízes federais também apoiam a implantação dos acordos de não persecução. Atualmente, o Brasil possui o instituto da transação penal, em que o investigado aceita uma pena proposta pelo Ministério Público para evitar um processo em casos de crime de menor potencial.
O pacote de Moro propõe a expansão da possibilidade de acordo penal para todos os crimes, não só para os de menor potencial ofensivo como era possível até agora. O criminoso que optar por confessar o crime poderá ter sua pena reduzida até a metade. O objetivo diminuir custos processuais e agilizar e desafogar a Justiça Criminal.
Para os juízes federais, “inexiste, pois, razão para não se admitir o acordo de não persecução penal naqueles casos de infração de menor potencial ofensivo, se o autor da infração for confesso”. “Essa proibição está prevista na resolução do CNMP que criou o ANPP, tentando não resvalar na disciplina legal da transação penal. Mas, agora, com o regramento estabelecido em lei, não há razão para tal óbice”.
“Quanto ao acordo amparado na confissão, visando a uma solução abreviada do caso penal, a redação do caput art. 395-A dá a impressão de que tal solução pactuada deve ser requerida conjuntamente pelas partes”, afirmam.
Segundo os juízes, “não se deve exigir que as partes formulem um requerimento em conjunto, o que pode fazer com que iniciem ou realizem tratativas fora do tribunal, caminho que não parece recomendável em vista dos vícios que maculam o modelo norte-americano”. “O ideal é que cada parte informe ao juízo o interesse na medida”.
Os juízes federais ponderam. “Não se mostra conveniente a possibilidade de acordar penas de prisão para além dos 6 anos de reclusão. No formato aqui proposto, já serão alcançados os casos rotineiros de furto, roubo e tráfico. Avançar além disso pode representar uma inovação muito arrojada para quem está começando a implementar acordos calcados na confissão”.
“Afora os casos de colaboração premiada, não há, entre nós, experiência na formulação de acordos pautados na admissão de culpa e na abreviação ou terminação antecipada do processo, sendo recomendável cautela para não se cometer falhas ou para que não florescerem vícios que hoje ensejam críticas ao modelo estadunidense de justiça penal negociada”, escrevem.
Banco de DNA
Outra proposta constantemente defendida pelo ministro é o incremento ao Banco Nacional de Perfis Genéticos. Os juízes federais concordam. Os magistrados ressaltam que a “perícia no Brasil é muito rudimentar, sendo a causa maior para a ineficiência das investigações, a ponto de ser recorrente afirmar-se que a polícia só detém capacidade para apontar alguém como responsável pela prática de crimes em pouco mais de 5% dos casos”.
“Na Europa e nos Estados Unidos, desde os anos 90, a investigação com base na identificação pelo DNA tem sido o grande instrumento para a elucidação dos crimes. Contudo, isso só é possível a partir da existência de um grande banco de dados de perfil genético, o que, infelizmente, diante do tratamento normativo incipiente, ainda não existe no Brasil, razão pela qual, nada obstante a tecnologia em nosso meio, ela não tem sido utilizada em larga escala para esclarecimentos de crimes”, afirmam.
Segundo os magistrados, a “redação proposta para o caput do art. 9º-A da Lei de Execução Penal é importante porque torna o conteúdo do dispositivo mais claro, na medida em que salienta que a pessoa condenada por crime doloso, independentemente do trânsito em julgado, deve ser submetida à identificação do perfil genético. Essa disciplina será de fundamental importância a fim de que seja aumentado o nosso banco de perfil genético, o que é imprescindível para as investigações, conforme salientado acima”.