Estudos ligam avanço da pobreza ao aumento da mortalidade infantil
O aumento da mortalidade infantil pela primeira vez desde 1990 está relacionado ao avanço da pobreza e à redução de investimentos em áreas consideradas cruciais para o desenvolvimento e para saúde. É o que apontam estudos técnicos levados nesta semana ao Ministério da Saúde, que buscou especialistas para discutir as razões da elevação das taxas de óbitos entre menores de 1 ano e de mortalidade materna.
Em 2016, conforme os dados divulgados em julho, houve 14 óbitos para cada mil nascidos vivos – avanço de 4,8% em relação aos 13,3 de 2015.
Quando as estatísticas começaram a ser analisadas, a professora da Universidade de Brasília (UnB) Ana Maria Nogales Vasconcelos foi uma das primeiras vozes a levantar a hipótese de que, com a redução do nascimento de bebês, sobretudo por causa da epidemia de zika, as taxas de óbitos de menores de 1 ano poderiam ser puxadas para cima.
Ou seja, com menos nascidos vivos até por adiamentos de gravidez, haveria mais possibilidade de uma elevação do índice.
Mas estudos seguintes conduzidos pela professora descartaram essa influência. “A tendência se repetiu em períodos posteriores ”
Hoje, segundo ela, a comunidade científica está em alerta. “A rapidez com que os indicadores mudaram espantou a todos.”
Questionado, o Ministério da Saúde manteve a tese de que as taxas de mortalidade sofreram, sim, um impacto pela redução de nascimentos.
Pesquisador da Universidade Federal da Bahia, Luís Eugenio Portela Fernandes de Souza, concorda com o alerta da colega. “Ninguém estava esperando um reflexo nas taxas de mortalidade já em 2017. E, se nada for feito, há o risco de os indicadores terem reflexo também na expectativa de vida do brasileiro”, alertou. “Nada disso é inexorável, mas medidas de proteção precisam ser adotadas.”
Fernandes de Souza, que também participou da discussão nesta semana, não hesita em dizer que o Brasil hoje está muito mais longe de cumprir os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS)do que há dois anos.
Diante da crise econômica, a partir de 2014, o pesquisador passou a analisar os investimentos federais em programas relacionados às metas internacionais da Organização das Nações Unidas (ONU).
Dados preliminares do trabalho levado ao ministério mostram que, de 18 áreas, apenas 7 tiveram aumento de investimento no período 2015-2017. “O mais grave é que um fator não se soma a outro. Se você não tem moradia, não tem acesso a saúde, não tem renda, os reflexos negativos se potencializam. São sinérgicos.”
Atendimento
Ana Maria observa ainda que a falta de investimentos e problemas de gestão levaram a uma piora na qualidade do atendimento. Os reflexos estão estampados em algumas estatísticas, como a de mortes fetais e neonatais em razão da sífilis.
Ano passado, foram 600, uma marca significativamente maior do que no ano anterior. “Pode parecer pouco quando comparado com números em geral. Mas todas poderia ter sido evitadas. Bastaria para isso o diagnóstico da infecção na mãe e a oferta de tratamento no período adequado.”
O ministério não esclareceu as razões para o aumento da sífilis no País, mas afirmou que lançou em 2016 um alerta a Estados e municípios sobre a epidemia.
A professora da UNB observa também a piora nos indicadores de morte materna. “São indicadores muito sensíveis, sobretudo à eficiência da assistência, seja durante a gestação, no momento do parto, no pós-parto e depois do nascimento.”
Uma assistência adequada durante a gestação, por exemplo, pode prevenir infecções do bebê, permite identificar o risco para o parto e, com isso, providenciar um acolhimento adequado para o bebê e para a mãe. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.