Vítima que morreu em ritual teria jogado combustível em caldeirão
A Polícia Civil investiga as circunstâncias da morte de Denise Rosa Monari Pinarelli Alves, de 39 anos, vítima de um incêndio ocorrido após a explosão de um caldeirão com etanol, durante um ritual realizado nos fundos de uma residência em Pompeia (distante 30 quilômetros de Marília). Quatro pessoas, incluindo um garoto de 12 anos, foram internadas com queimaduras e devem ser ouvidas nos próximos dias, quando receberem alta médica.
De acordo com informações obtidas pelo Marília Notícia, o caso ocorreu na noite do sábado (7), por volta de 23h15, nos fundos de uma casa no Jardim Flandia. As vítimas teriam se declarado praticantes da religião Umbanda e estariam na denominada ‘sala da direita’, participando da prática da mediunidade, conhecida como ‘mesa branca’.
A Polícia Civil teria apurado que Denise e um rapaz, supostamente queriam ir além da ‘mesa branca’, e realizar outro tipo de ‘trabalho’ espiritual. De acordo com os relatos, uma ‘entidade’ teria solicitado que os presentes no local se dirigissem para a ‘sala da esquerda’, utilizada hipoteticamente para ‘trabalhos mais pesados’.
A ‘entidade’ que teria supostamente encarnado no rapaz solicitou que um caldeirão fosse acesso, porém, após isso, teria dito que a quantidade de combustível seria insuficiente, solicitando que mais etanol fosse colocado no recipiente.
O homem teria se negado, mas outra ‘entidade’ que teria encarnado em Denise, também pediu mais combustível. Na sequência, a mulher teria despejado um galão de etanol no caldeirão com fogo, provocando uma explosão.
Segundo informações passadas para a Polícia Civil pelos envolvidos, no momento em que Denise jogou o etanol, a porta da sala estaria aberta, próximo de onde estavam as vítimas, incluindo um garoto de apenas 12 anos.
Quando houve a explosão, segundo relato dos presentes, a “entidade teria fechado a porta” e todos que estavam na sala ficaram presos. Ainda de acordo com os depoimentos, até conseguirem sair da sala, todos acabaram se queimando. A reportagem do Marília Notícia esteve no local e percebeu que a porta mencionada, na verdade, abre de fora para dentro.
A equipe do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) socorreu as vítimas, mas a informação inicial era que o acidente teria ocorrido durante um churrasco. Somente pela manhã, com a informação da morte de Denise, a Polícia Civil foi até o local, constatando que não havia nenhuma churrasqueira e que o incêndio teria sido provocado durante a realização de um ritual.
Três vítimas foram socorridas para o Hospital das Clínicas (HC) de Marília, sendo que o homem que acompanhava Denise estaria em estado grave. O garoto de 12 anos foi encaminhado para a Unidade de Tratamento de Queimados (UTQ) em Bauru, em estado considerado grave.
Após o acidente, a mãe de Denise contou que a filha chegou a tomar banho, trocar de roupa e ir até a Santa Casa de Pompeia, onde não resistiu aos ferimentos e morreu. Um inquérito policial está sendo instaurado pela Polícia Civil de Pompeia, para apurar com mais clareza as circunstâncias do acidente que tirou a vida de Denise e descobrir se houve algum responsável por sua morte.
TEMPLOS DE UMBANDA
Para entender melhor o que se passou em Pompeia, o Marília Notícia procurou uma líder religiosa da Umbanda em Marília para explicar os significados dos elementos encontrados pela Polícia Civil no local e como são utilizados.
De acordo com a Mãe Elisa Rosa, do Templo das Águas de Yemanjá, existem casas “que se apresentam” e algumas “que não se apresentam”, mas que existem cerca de 150 na cidade de Marília.
“Tem bastante casa e bastante gente. Por isso que eu falo, o grande sacerdote tem que ser sábio, tem que ter uma sabedoria para mexer. Não pode fazer as coisas de qualquer jeito. Hoje em dia, não é desmerecendo ninguém, mas algumas pessoas estão praticando as coisas de qualquer jeito. E não é dessa forma. A espiritualidade requer respeito. Tem que ter muita sabedoria para lidar com a espiritualidade”, diz Mãe Elisa.
USO DO FOGO
A sacerdotisa explica que, em sua casa, o fogo é usado com extrema cautela. Ela contou que as chamas são utilizadas durante o ‘descarrego’, para melhorar a energia da pessoa que está passando por alguma dificuldade espiritual.
“A gente aqui toma muito cuidado. Tanto que as pessoas que já fizeram uma vez, voltam a fazer de novo. É aquele fogo que não tem risco, que não tem perigo algum para ninguém. O grande sacerdote tem que ser sábio no momento de um ritual. Ele não pode pôr em risco, nem ele, e nem os participantes”, diz Mãe Elisa.
Sobre o caldeirão utilizado, Mãe Elisa explica que o artefato pode ser usado para ‘quebrar’ alguma demanda que a casa ou a pessoa recebeu. Ela conta que muita pessoas pensam que o caldeirão está ligado a maldades, mas muitas vezes o intuito é de defesa para a pessoa que faz o procedimento espiritual.
EXU
Mãe Elisa Rosa deixou claro que não sabe que tipo de ritual as vítimas estariam fazendo, mas destacou que alguns elementos da sala onde tudo aconteceu seriam de Exu, orixá que para ela significa prosperidade, caminho e ajuda para as pessoas.
“Depende muito do sacerdote, como ele está cultuando o Exu dele e o que pretende fazer com isso. E Exu trabalha como as pessoas. Existem pessoas do bem e existem pessoas do mal. A nossa cabeça pode pensar o bem, mas também pode pensar o mal. Eu não sei o que ela foi fazer. Ali tem alguns pontos de Exu. Tem a pintura de vermelho e de preto. Dentro da minha casa o Exu é prosperidade e ação. Ele não é maldade”, conta.
A sacerdotisa mariliense afirma que o frequentador do Templo das Águas de Yemanjá já sabe que Exu significa prosperidade.
“Ele é amigo da gente. Exu ajuda no nosso caminho. Ele traz para nós o ‘pataco’, que eles falam que é o dinheiro. Ele traz para nós o serviço e defendem a gente da maldade do outro. Então, para mim, Exu é uma grande ação”, conta a religiosa.
DIREITA E ESQUERDA
Em entrevista ao MN, Mãe Elisa Rosa revelou que o trabalho na ‘direita’ é um trabalho feito com ‘preto velho’, com ‘caboclos’, com ‘baianos’, ‘marinheiros’ e erês.
“Nós vamos ter uma grande festa agora, dia 14 de outubro, que vai ser a grande festa dos erês aqui na minha casa no próximo sábado. O trabalho na ‘direita’ é um trabalho que requer muito axé. É o trabalho de roupa branca. É um trabalho que as pessoas tomam passe, pegam as orientações. É um trabalho que os guias estão para dar orientação para aquela pessoa. Aquela pessoa que vem buscar as informações corretas para a sua vida”, conta.
Sobre a ‘esquerda’, Mãe Elisa explica que as pessoas usam preto e vermelho, mas que também é um trabalho que tem passe.
“A esquerda, para você entender, é uma energia também muito boa. Não é energia ruim. Tem gente que acha que a esquerda só faz maldade, só vai acender vela para os outros. Não é bem assim. Isso é besteira e atraso de vida. Isso vai muito do coração e da cabeça da pessoa”, afirma Mãe Elisa Rosa.
Com colaboração de Rodrigo Viudes.