Site bolsonarista distorce ‘entrevista’ de repórter do Estadão
O site Terça Livre, que reúne ativistas conservadores e simpatizantes de Jair Bolsonaro, publicou na tarde deste domingo (10/3) um texto que falsamente atribui à repórter do jornal O Estado de S. Paulo Constança Rezende a declaração “a intenção é arruinar Flávio Bolsonaro e o governo”, ao tratar da cobertura jornalística das movimentações suspeitas de Fabrício Queiroz, ex-motorista do senador e filho do presidente.
A suposta declaração, que aparece entre aspas no título do texto do Terça Livre, teria sido dada, segundo “denúncia” de um jornalista francês, em uma conversa gravada. Na gravação do diálogo, porém, Costança não fala em “intenção” de arruinar o governo ou o presidente. A conversa, em inglês, tem frases truncadas e com pausas. Apenas trechos selecionados foram divulgados. Em determinado momento, a repórter avalia que “o caso pode comprometer” e “está arruinando Bolsonaro”, mas não relaciona seu trabalho a nenhuma intenção nesse sentido.
O Terça Livre, com base na “denúncia” do jornalista francês Jawad Rhalib, também falsamente atribui à repórter a publicação da primeira reportagem sobre as investigações do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) sobre a movimentação atípica de R$ 1,2 milhão nas contas do ex-assessor de Flávio Bolsonaro. O autor da primeira reportagem foi Fábio Serapião, também do jornal O Estado de S. Paulo.
“Desde que Constança iniciou a temporada de caça aos Bolsonaro no Estadão, emissoras como a Rede Globo e jornais como Folha de São Paulo seguiram o mesmo caminho”, diz o texto do Terça Livre. “Uma enxurrada de acusações em horário nobre, capas de revistas e nas primeiras páginas de jornais colocaram a integridade moral do filho do presidente em xeque.”
Costança Rezende não deu entrevista nem dialogou com o jornalista francês citado pelo Terça Livre. As frases da gravação foram retiradas de uma conversa que ela teve em 23 de janeiro com uma pessoa que se apresentou como Alex MacAllister, suposto estudante interessado em fazer um estudo comparativo entre Donald Trump e Jair Bolsonaro.
Com base nas falsas informações publicadas pelo Terça Livre, grupos governistas promoveram no Twitter uma série de postagens nas quais acusam o jornal O Estado de S. Paulo de “mentir” na cobertura do caso Flávio Bolsonaro. As informações reveladas pelo jornal se baseiam em fatos e documentos oficiais.
Fernanda Salles
Fernanda Salles Andrade, que assina texto com informações falsas sobre uma jornalista do Estadão no site Terça Livre, ocupa cargo no gabinete do deputado estadual Bruno Engler (PSL), na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). O site reúne ativistas conservadores e simpatizantes ao governo Jair Bolsonaro e, neste domingo, 10, atribuiu falsamente à repórter Constança Rezende a declaração “a intenção é arruinar Flávio Bolsonaro e o governo”, ao tratar da cobertura jornalística sobre as movimentações suspeitas de Fabrício Queiroz, ex-motorista do senador e filho mais velho do presidente.
Valendo-se das informações falsas divulgadas pelo Terça Livre, Bolsonaro atacou a imprensa via redes sociais. A suposta declaração, que aparece entre aspas no título do texto de Fernanda, foi atribuída pelo site à repórter. A gravação do diálogo, porém, mostra que Constança em nenhum momento fala em “intenção” de arruinar o governo ou o presidente. A conversa, em inglês, tem frases truncadas e com pausas. Só trechos selecionados foram divulgados. Em um deles, a repórter avalia que “o caso pode comprometer” e “está arruinando Bolsonaro”, mas não relaciona seu trabalho a nenhuma intenção nesse sentido.
A nomeação de Fernanda para atuar no gabinete de Engler foi publicada no dia 2 de fevereiro. A informação foi publicada pelo blog do jornalista Ruben Berta, e confirmada pelo Estado. Segundo ALMG, ela recebe salário de R$ 6.543,69. Engler é um dos principais apoiadores da família Bolsonaro em Minas. Após a nomeação para o cargo, Fernanda assinou dois textos no site Terça Livre que trataram de atividades ocorridas na Assembleia.
Há duas semanas, ela assinou um texto com o título “Deputado do PT defende ideologia de gênero sob forte protesto na ALMG”, em que descreve a participação do deputado Betão em uma comissão que debatia, segundo o texto, “ensino de gênero e sexualidade para crianças a partir dos 6 anos de idade”. No Dia Internacional da Mulher, outro texto de Fernanda diz que um evento na assembleia promovia “doutrinação ideológica”, e registra a entrega de panfletos a crianças e adolescentes.
Fernanda aparece em vários vídeos no Youtube, defendendo o governo Bolsonaro. Em um dos mais recentes, a assessora fala sobre o vídeo pornográfico publicado pelo presidente durante o carnaval. Segundo a funcionária do deputado, com o vídeo Bolsonaro “conseguiu constranger os mais radicais socialistas. Ele os colocou diante de um espelho. Não satisfeito, mostrou para o Brasil e para o mundo aquilo que os autoproclamados socialistas defendem. No seu íntimo, ou não”. Após quatro dias, o vídeo teve 89 visualizações.
Ao Estado, Fernanda afirmou que os textos foram escritos fora de seu horário de trabalho. Ela diz ainda que sua atividade no gabinete de Engler não tem relação com sua colaboração para o site. O site atribui as informações a um jornalista francês, identificado pelo Terça Livre como Jawad Rhalib.
A reportagem conversou com ela por telefone e também pessoalmente, no gabinete de Engler. A assessora confirmou ter feito as publicações, mas negou ser autora dos textos. “O que fiz foi uma reprodução da denúncia feita pelo jornalista francês”. Questionada se sabia falar inglês, a assessora disse que sim.
Responsável pela contratação na ALMG, Engler é ligado ao Movimento Direita Minas e gravou vídeos com Bolsonaro durante sua campanha eleitoral. No canal do Direita Minas no Youtube, há também um vídeo de autoria do Terça Livre. Gravado durante a campanha eleitoral, em julho do ano passado, o vídeo traz uma imagem de Fernanda e a gravação de uma entrevista por telefone com Bolsonaro, então candidato à Presidência da República. O deputado Bruno Engler não atendeu ligações feitas pela reportagem.