‘Se Dhaubian descobrir, ele me mata’, prevê vítima em motel
O ajudante geral Daniel Ricardo da Silva, de 37 anos, que foi morto no motel na zona Norte de Marília no final de outubro, sabia do perigo que corria ao manter um relacionamento amoroso com a esposa do patrão, o coronel da reserva Dhaubian Braga Barbosa, de 57 anos (veja o vídeo abaixo).
Uma das últimas frases ditas por ele, segundo testemunhas, antecipou o desfecho do caso: “se Dhaubian descobrir, ele me mata”. O militar da reserva não só sabia da traição, como estava a poucos passos de Daniel, pronto para atirar.
Os relatos da mesma testemunha – uma camareira do motel – indicam que a frase seguinte foi uma pergunta, em tom de desespero. “Por que você está fazendo isso comigo?”, teria dito o ajudante, enquanto era alvejado pelo coronel, no final de um estreito corredor.
A Polícia Civil de Marília confirmou, nesta quinta-feira (25), a conclusão do inquérito que apurou o crime. O coronel da reserva foi indiciado por homicídio duplamente qualificado (motivo torpe e emboscada), o que dificultou a defesa da vítima. O caso ainda vai ser analisado pelo Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP).
MOMENTOS FINAIS
As imagens que fazem parte do inquérito policial e os relatos colhidos pela Polícia Civil indicam que Daniel, que era funcionário de uma construtora de Dhaubian, saiu da chácara onde estava trabalhando [propriedade vizinha] mais cedo no sábado (30). Ele trabalharia, geralmente, até as 17h, mas na véspera do dia fatídico, deixou a labuta às 14h.
O ex-detento que, após cumprir sua pena, era empregado de um militar da reserva, viajou de ônibus para Assis (distante 75 quilômetros de Marília). O próprio homem teria relatado a um colega de serviço que iria se encontrar com a esposa do patrão, que também é policial militar.
A mulher tinha união estável há sete anos com o coronel, mas se envolveu com o funcionário. Naquele sábado, disse ao marido que iria visitar familiares. O coronel também ficaria fora, em atividade de caça na região de Marília.
A investigação apontou que Daniel voltou para Marília de ônibus. Ele utilizou serviços de um motorista de aplicativo para ir da rodoviária até o motel, onde chegou às 6h08 de domingo (31).
As imagens do circuito interno de segurança mostram que o ajudante parou em um guichê na entrada e conversou com uma funcionária.
O diálogo foi reproduzido pela testemunha aos investigadores. Questionado de onde estava vindo, Daniel teria afirmado que “estava cansado, após passar a noite com Adriana”. Em seguida, antecipa seu destino, segundo a testemunha: “se Dhaubian descobrir, ele me mata”.
EMBOSCADA
Apenas dois minutos após entrar no estabelecimento, uma câmera da área interna mostra quando o homem caminha até o quarto 19, onde estava morando. No caminho, cumprimenta uma camareira no corredor.
Já no final da estreita passagem, é possível ver a movimentação e a claridade provocada pelos disparos de arma de fogo. Naquela manhã, o coronel chegou mais cedo que o habitual, segundo as testemunhas.
Geralmente, ele pegava a lista de compras depois das 6h, para o café da manhã dos hóspedes que utilizavam as instalações do motel. Mas naquele domingo, se antecipou em 30 minutos para esperar Daniel, morto com quatro tiros: um de raspão no ombro direito, outro também de raspão no flanco direito, um na nádega esquerda e outro na região sacral, que teria sido disparado por trás.
Em seguida, o coronel deixa o local, onde começa a intensa movimentação, primeiro de funcionários, depois da esposa e, por fim, da Polícia Militar.
MOTIVAÇÃO
As investigações revelaram que Dhaubian sabia que a mulher estava tendo um relacionamento com o funcionário e também tinha a informação de que eles teriam passado a noite juntos.
Na véspera, a esposa saiu de carro em direção a Assis dizendo que iria visitar os familiares, como era comum. Mas além de informantes, Dhaubian tinha um rastreador no celular da companheira.
Os comentários sobre a perigosa relação já ocorriam entre os funcionários – inclusive com relatos de que Daniel já não fazia mais questão de esconder.
INTRIGA E TRAIÇÃO
Conforme o relato da esposa, o empregado havia feito uma gravação na qual o coronel também confessa manter relações extraconjugais. Em seu depoimento, a mulher atribui como causa da ira do marido à possível descoberta da confissão.
A investigação também aponta que a cena do crime teve interferências de ambos; tanto do coronel quanto da esposa.
Dhaubian é suspeito de ter plantado a arma da própria mulher – uma pistola pertencente à Polícia Militar – próximo ao corpo do empregado. Seria um esforço para simular legítima defesa.
A suspeita é reforçada pela existência de uma mancha de sangue na arma, que estava em cima de uma pegada, não condizente com o calçado da vítima.
Já a policial – que chegou de Assis pouco após a morte de Daniel – teria retirado da cena o celular do amante e entregue para uma camareira guardar. Quando a Polícia Militar já estava no motel e preservava o local, a esposa do coronel teria solicitado ao filho que entregasse o telefone aos militares.
Outras “pontas soltas” do caso poderão ser esclarecidas após a polícia receber todos os laudos periciais, inclusive os relatórios sobre o conteúdo do telefone celular de Daniel.
O próximo passo será a análise do Ministério Público, que poderá pedir novas diligências. O prazo da prisão temporária do coronel – que já teve dois pedidos de liberdade negados – termina no próximo dia 2 de dezembro.
A Polícia Civil, que investiga – em outro inquérito – a procedência e regularidade de um verdadeiro arsenal sob responsabilidade do militar aposentado, já se manifestou pela prisão preventiva de Dhaubian.