Religiosa aciona Justiça por cirurgia sem transfusão de sangue
Uma idosa de 69 anos, representada por seu filho, acionou a Vara da Fazenda de Marília para conseguir uma cirurgia de retirada de um tumor craniano sem a realização de transfusão de sangue devido a suas convicções religiosas.
Como mostra decisão publicada nesta quarta-feira (27), o juiz Walmir Idalêncio dos Santos Cruz negou o pedido liminar com o objetivo de analisar melhor o caso.
Consta que a idosa possui “volumosa lesão nodular sólida intracraniana e extra-axial na alta convexidade de região frontal esquerda, com cauda dural e base de implantação no osso frontal”.
Para tratamento, seria necessário um procedimento cirúrgico de remoção do nódulo que mede cerca de cinco centímetros.
Segundo consta na ação, no entanto, a “idosa se declarou Testemunha de Jeová, informando a recusa a receber transfusão de sangue”.
Isso, mesmo em início “de demência, confusa, apresenta episódios de amnésia de fatos recente, esquece e não consegue realizar atividades da vida diária, refere zumbido nos ouvidos”.
Conforme a petição inicial, documento que inaugura o processo, o caso dela foi analisado pelo Hospital das Clinicas da Faculdade de Medicina de Marilia (HC/Famema). Após a declaração da idosa de que não receberia transfusão, a cirurgia teria sido desmarcada.
Aparelho
“A equipe de neurocirurgia informou que não possuía infraestrutura para realização da cirurgia, uma vez que não possui o equipamento ‘Cell Saver’”, consta no processo.
Tal aparelho reutiliza o sangue do próprio paciente, sem a necessidade de transfusão a partir da doação de outra pessoa. “Assim, único empecilho para a realização da cirurgia é a falta do referido equipamento”, diz a inicial.
Consta ainda a informação de que as tentativas de realização do procedimento em hospitais de outras cidades – como Ribeirão Preto e São José do Rio Preto – que possuem o Cell Saver, acabaram frustradas.
Foi feito o pedido liminar – ou seja, urgente – para que o HC/Famema providencie o aparelho e realize a cirurgia imediatamente, sob pena de multa diária no valor de R$ 1 mil. Além do hospital estadual que é referência para a região, a Prefeitura de Marília também é parte do no processo.
Decisão
O juiz, no entanto, entendeu que “embora deva ser respeitada a garantia constitucional de liberdade de credo”, como tem decidido o Tribunal de Justiça de São Paulo, “não se pode conceber que o exercício de garantia acabe por transferir a terceiros os ônus dela decorrentes”.
De acordo com ele, não cabe ao Estado “o ônus de atender as particularidades confessionais, religiosas e/ou filosóficas de cada indivíduo, com incremento de custo financeiro, sob pena de subversão do princípio da reserva do possível”.
O magistrado ainda esclarece seu entendimento, de que “o procedimento cirúrgico ainda não se realizou apenas porque a paciente se opõe à transfusão sanguínea necessária para sua efetivação”.
Com base em tais argumentos, o pedido por uma decisão liminar foi negado, mas não se trata de um posicionamento definitivo da primeira instância. O processo está apenas começando e foi aberto prazo para manifestação do Ministério Público.
O caso terá prioridade de tramitação, pois a autora é idosa.