Relações Conflituosas
Olá caro leitor!
Hoje proponho um tema para a reflexão que é possivelmente um dos temas mais presentes na realidade do ser humano: conflitos de relacionamento. Brigas, desentendimentos, xingamentos, palavras tortas e distanciamento são palavras que estão associadas a sentimentos e emoções como a raiva, a insegurança, o medo, a disputa e o orgulho e que são inerentes às relações humanas. Mas vamos deixar um pouco de lado tudo isso e vamos falar de algo que também existe. Vamos falar de Amor.
Falar sobre Amor é uma tarefa complicada. Creio que defini-lo é ousado e que os felizardos conseguem isso – verdadeiramente – são os artistas e os poetas. Assim, convido você, leitor, a uma breve viagem pra dentro, para a gente passear por ele. Sim, pelo Amor. Mas para isso, usemos algo de fora: uma escultura exposta na reedição do festival Burning Man (2015), em Black Rock City nos EUA. (imagem abaixo).
Formando duas pessoas vazadas sentadas de costas uma para a outra, a gigante escultura “Love” foi criada pelo escultor ucraniano Alexander Milov. Nas palavras do próprio autor, ela representa “[…] um conflito entre um homem e uma mulher e a expressão interna e externa da natureza humana. Seu interior é moldado por crianças transparentes, que detêm as mãos pelas grades. Quando escurece, as crianças começam a brilhar. Esse brilho simboliza pureza e sinceridade que une as pessoas e dá a oportunidade de consertar as coisas quando chegar em tempos sombrios“.
Bem, em oposição ao que é destrutivo, que vai se acabando e se separando (ver artigo “Destrutividade Humana”, publicado em 25 de novembro), o que é o Amor se não, quem sabe, uma força interna que guia para o encontro, para a união, pela atração e por fim, para a construção de algo? Algo que busca a junção considerando o que é maior?
Na sabedoria da antiguidade essa ideia é representada pelo Cupido. Eros, como era conhecido pelos gregos, era um lendário personagem que vivia uma série de desencontros com a confusa Psique, sua prometida. Mesmo estando Psique e Cupido separados, este se manteve como um guia, para que ela o encontrasse. Ao final terminam juntos pela vontade dos deuses. E tiveram um filho: Prazer (resumo adaptado de “O Livro de Ouro da Mitologia” de Thomas Bulfinch). Cupido, ou Eros, era o deus do amor e Psique, filha de um rei e significa mente/alma em hebraico.
Pois bem, não é difícil perceber a semelhança entre a escultura de Milov e a estória entre Cupido (o Amor) e Psique. Em oposição ao que é destrutivo e vai se acabando, o Amor é uma força interna que une e junta em direção a coisas maiores. Este é o cupido. E este é o Amor de Milov.
Coisas antagônicas existem, ao mesmo tempo, no universo interno: a raiva, o medo e tudo aquilo que distancia; mas também aquilo que junta. O fato é que, por mais que haja desavenças que separam, há sempre uma parte interna que perpassa tudo isso e puxa para a união. Aparecendo ela mais ou ficando, às vezes, mais escondidinha.
Como numa pizza, penso que existe uma parte em nós, no nosso território interno, que trabalha para o encontro. Porém, há outra parte que, confusa, também sofre com a insegurança e com os medos. O ser humano busca a aproximação, assim como o Cupido. Mas confuso, por vezes acaba estragando. E perdendo. Mas hei de frustrar você, amigo leitor. Penso que essa parte mais negativa não some. Não há cura para os tormentos da mente.
No entanto, os conflitos relacionais e a emergência (ou o emergir) do Amor não dizem respeito só ao terreno amoroso e afetivo. Lembro-me aqui do fato ocorrido na Primeira Guerra Mundial, em que no natal de 1914 soldados da França e da Alemanha paralisaram espontaneamente a guerra para uma confraternização. O ilustre fato ficou conhecido por “Trégua de Natal” e foi retratado no filme “Feliz Natal” de 2005.
Por fim, quem sabe possamos perceber a coisa um pouco diferente: pensar no Amor como sendo um norte para a mente em momentos de turbulência. Uma força que mora dentro da gente e que aproxima, junta e pende para o construtivo e para algo maior, nos permitindo passar por conflitos que a mente humana (tão confusa) sofre. A Ucrânia, país de Milov, vive tempos difíceis onde a Guerra Civil confere um clima conflituoso e armado entre forças separatistas e o governo federal. A obra de Milov, com suas crianças, surge nesse contexto. E o que será que pode surgir de nós no contexto rotineiro das nossas relações?
Um abraço e até a próxima coluna!