Primeira injeção contra obesidade é aprovada pela Anvisa
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou a primeira medicação injetável de aplicação semanal para tratar a obesidade do País. A decisão foi publicada no Diário Oficial da União de segunda-feira, 2. Especialistas recomendam que o tratamento com a caneta de semaglutida (2,4 mg), que tem aval em países como Estados Unidos e Canadá, deve ser feito com supervisão médica.
O uso da substância – já aprovada para tratar o diabete tipo 2 no País, mas em dosagem menor – pode fazer com que pacientes adultos percam, em média, 17% do peso corporal em pouco mais de um ano. O hormônio consiste em um agonista do receptor de GLP-1 que sinaliza ao cérebro a sensação de saciedade. A aplicação subcutânea ocorre uma vez por semana e já é testada por pesquisas científicas.
Como mostrou o Estadão há um ano, o método, desenvolvido para tratamento do diabete, se revelou como um importante aliado no combate à obesidade. Um dos primeiros estudos que indicou como a caneta pode ser útil para pacientes com obesidade, segundo especialistas, foi publicado em março de 2020 na revista científica The New England Journal of Medicine.
Os pesquisadores demonstraram que, quando combinada a uma alimentação regrada e ao aumento da atividade física, a dosagem semanal de 2,4 mg de semaglutida propiciou perda média de peso de 15,2%, ante 2,6% no grupo placebo – a dosagem usada para o tratamento da obesidade é quase o dobro dos 1,3 mg usados para tratar o diabete tipo 2.
Como resultado, a caneta, cujo nome comercial é Wegovy, foi aprovada no mesmo ano do estudo pela agência reguladora dos Estados Unidos (FDA, na sigla em inglês) para tratar o sobrepeso e a obesidade, um dos principais problemas enfrentados pelos americanos. Também recebeu aval da Europa e do Canadá.
Estudos mais recentes da Novo Nordisk, fabricante do produto, indicaram que pacientes que usaram a substância conseguiram uma perda média de peso de 17% em pouco mais de um ano, contra 2,4% no grupo placebo. “É a medicação que chega com estudos demonstrando a maior potência em termos de redução porcentual do peso”, afirma o médico endocrinologista Paulo Miranda, presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM).
Não houve ocorrência de efeitos colaterais graves nos estudos, mas foram relatados eventos gastrointestinais, como náusea e vômito, o que reforça a necessidade de acompanhamento médico. “De maneira geral, a medicação é bem tolerada, porque os efeitos colaterais são reversíveis, com a redução da dose ou com a suspensão da medicação”, afirma Miranda. Segundo ele, os resultados não têm demonstrado efeitos adversos graves ou de maior preocupação.
Aprovação no Brasil
No Brasil, a farmacêutica dinamarquesa Novo Nordisk solicitou no fim de 2021 o uso da caneta à Anvisa para tratar a obesidade. Após passar por análise, o pedido agora foi aprovado pela agência reguladora, mas ainda não há previsão de quando irá chegar ao Brasil ou quanto irá custar.
Conforme a fabricante do produto, o medicamento é indicado para dois grupos: pessoas com sobrepeso (com IMC maior que 27) e com algum tipo de comorbidade; pessoas com obesidade (com IMC superior a 30).
Para a diretora da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso), a médica endocrinologista Cynthia Valerio, “a aprovação da semaglutida para o tratamento da obesidade pela Anvisa é uma enorme conquista para os pacientes com obesidade e sobrepeso no Brasil” “É uma medicação que vem inaugurando uma nova era no tratamento da obesidade”, afirma.
Mas, a endocrinologista pondera que o tratamento deve ser aliado a outras ações. “O remédio apoia a mudança do estilo de vida, mas nunca deve ser encarado como um tratamento isolado”, reforça “A obesidade hoje é um problema de saúde pública tão grande que a gente tem de pensar como uma arma a mais, que vem agregar junto a outras já existentes.”
Segundo dados do Atlas da Obesidade, cerca de 30% da população brasileira deve ter obesidade até 2030. Atualmente, estima-se que aproximadamente 41 milhões de pessoas (20% do total de habitantes) convivam com a obesidade.
Nutricionista esportiva, Renata Brasil destaca que a caneta de semaglutida é eficaz para redução de gordura corporal. Mas, alerta que a substância, já comercializada para pacientes com diabete em farmácias em dosagem diferente e a um preço de quase R$ 1 mil por mês, tem sido usada de forma indevida.
“Esse medicamento tem sido banalizado, principalmente pela facilidade que se tem na aquisição, já que não depende de receita ou tratamento médico”, diz. Ela reforça, em meio a isso, a importância de procurar um profissional capacitado para avaliar o histórico familiar do paciente e fazer um encaminhamento seguro. “O emagrecimento pode vir a causar um ‘efeito rebote’, em que a pessoa acaba engordando tudo de novo, ou às vezes até mais, se não tiver um acompanhamento nutricional ”
Para a vice-presidente da Associação Brasileira de Nutrição, Daniela Cierro, a aprovação da medicação não pode negligenciar a terapia nutricional, que, defende ela, também ajuda a combater possíveis efeitos colaterais. “Saber comer, olhar para os nutrientes que podem entrar em carência e o que vai contribuir para o funcionamento orgânico é fundamental para o sucesso (do tratamento)”, diz.
Conforme a Novo Nordisk, o medicamento passa agora por uma formulação de preço pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos. Depois, seguirá os demais trâmites de importação e logística para somente após isso chegar às farmácias, o que pode atingir o segundo semestre.
Caneta de liraglutida
Também desenvolvida pela Novo Nordisk, já está aprovada pela Anvisa desde 2016 para tratamento da obesidade. Diferentemente da semaglutida, no entanto, ela é de aplicação diária. Não há estudo comparativo entre a efetividade das duas substâncias para tratar a obesidade, mas uma pesquisa conduzida pela farmacêutica dinamarquesa apontou que a Saxenda pode diminuir a massa corporal em até 8% após administração por um ano – índice menor que o apresentado pela semaglutida.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.