Presidente do Ipremm esclarece dúvidas sobre a Previdência municipal
Tramita na Câmara Municipal de Marília o projeto de lei de que trata a reforma da Previdência municipal, que tem trazido discussões entre os servidores, já que há severas mudanças nas regras de aposentadoria com o aumento de tempo e idade, o que resulta numa maior contribuição.
Os questionamentos giram em torno da real necessidade desta reforma ou se seria suficiente alterar somente as alíquotas de contribuição, já que o servidor que hoje contribui com 11%, passará a contribuir com 14%, além do aumento da cota patronal que sobe de 14% para 16%.
Em entrevista, a presidente-executiva do Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) do município, Mônica Regina da Silva, busca esclarecer as dúvidas sobre as alterações e a necessidade, assim como as consequências, caso a reforma não aprovada.
1. O que é o regime próprio de Previdência Social?
Todo regime próprio de Previdência é regido pela Constituição Federal, art. 40, que estabelece a instituição de um regime que garanta o pagamento de benefícios presentes e futuros por meio de critérios financeiros e atuariais.
Isto significa que para a existência de um regime de Previdência é necessário observar critérios que garantam a sua existência a curto e longo prazo.
2. E de que modo isto se dá?
Isto se dá por meio de contribuições do ente patronal, que no caso é a Prefeitura e suas autarquias, além da Câmara dos Vereadores, e contribuições dos servidores, cujos recursos devem ser capitalizados por meio de aplicações financeiras, de acordo com a política de investimentos, somados aos valores recebidos a título de compensação previdenciária entre os regimes de Previdência, objetivando sempre o crescimento do patrimônio de modo a garantir o custeio do pagamento dos benefícios ao longo dos anos de acordo com a projeção do cálculo atuarial. O que se dá de forma diferente do regime geral, que além das contribuições previdenciárias também é custeado com outras receitas como, por exemplo, concursos de prognósticos.
3. Pessoas questionam a necessidade da reforma da previdência.
Quando houve a previsão constitucional de criação de regimes próprios aos municípios, não havia menção sobre o equilíbrio financeiro atuarial. Na verdade, a decisão dos gestores se baseou em sair do Regime Geral, onde se pagava uma alíquota patronal elevada – aproximados de 21%. No âmbito do regime próprio em Marília, por exemplo, a cota patronal inicial foi estatuída em 5%. O que em verdade, criou uma falsa ideia de economia, já que o ideal seria instituir uma regra de transição estabelecendo um prazo mínimo para iniciar os pagamentos de benefícios pelo RPPS. Ao contrário disso, passou a pagar de imediato os benefícios sem reserva financeira.
Somado a isto, houve um maior comprometimento financeiro da Previdência com as concessões pontuais de vantagens aos servidores, que se somavam aos rendimentos e incorporavam para fins de aposentadoria, sem, contudo, a devida análise dos impactos para a Previdência o que, por sua vez, resultou no desequilíbrio do sistema ao longo dos anos – situação que também ocorreu em todas as esferas da administração.
Com isto, foi necessária a criação de emendas constitucionais que visaram trazer a higidez do sistema previdenciário, o que se iniciou com a emenda 20/1998, que estabeleceu pela primeira vez o equilíbrio financeiro e atuarial além de critérios mais rígidos para concessão de benefícios, como tempo de contribuição mínimo.
Em seguida, vieram as ECs 41/2003 e 47/2005 que limitaram as questões de paridade e integralidade. Hoje se verifica que tais mudanças não foram suficientes, o que implicou em mais discussões no âmbito federal resultando na EC 103/2019 que promoveu mudanças tanto no Regime Geral de Previdência Social quanto no Regime Próprio de Previdência da União, trazendo novos critérios para concessão de aposentadorias e pensões por morte, além do aumento da alíquota de contribuição do servidor (está última valendo para todas as esferas da administração), e indicou que os Estados e municípios também deverão promover mudanças nas suas legislações previdenciárias, caso se verifique que as regras atuais não são suficientes para a preservação da Previdência local, que é o caso de Marília, já que se encontra em déficit financeiro e atuarial.
4. Em que consiste o equilíbrio financeiro e atuarial?
Nada mais é do que a busca pela preservação de pagamentos presentes (equilíbrio financeiro) e futuros (equilíbrio atuarial). Isto significa que não podemos apenas olhar o quadro presente do RPPS, mas deve-se verificar e preservar a sua viabilidade para o futuro, no intuito de manter sua higidez de modo a garantir aposentadorias e pensões ao longo do tempo e para todos os seus segurados, dai o caráter solidário do regime.
5. Por que apenas o aumento da alíquota de contribuição não seria suficiente?
Quanto a este aspecto, fez-se estudo de impacto, apenas com o aumento da alíquota de contribuição do servidor para 14%, promovido pelo atuário que presta serviços para o Instituto, cujo resultado indicou que somente esta medida seria insuficiente para salvaguarda do RPPS ao longo do tempo, pois ainda se afiguraria em déficit financeiro atuarial.
Durante todo o desenvolvimento deste estudo, passou-se pela análise de todos os cenários que visassem menor prejuízo ao servidor, mas que também trouxesse superávit de acordo com a determinação constitucional.
Importa dizer, ainda, no que se refere à reforma da Previdência, que houve indicação de soluções mais gravosas para o município de Marília apontadas pela então Secretaria de Previdência, vinculada ao Ministério da Economia, as quais não foram implementadas neste momento.
6. O que obriga o município promover a reforma da Previdência?
A obrigação do município em promover a reforma da Previdência vem da própria Constituição Federal, uma vez que ela indica que um regime próprio de Previdência Social deve ser saudável, ou seja, deve estar em situação de superávit financeiro e atuarial capaz de garantir o pagamento dos benefícios concedidos dentro de tal regime.
Logo, se o regime de Previdência de um município não se encontra em boa situação financeira e atuarial, surge a obrigação, principalmente após a EC nº 103/2019, de promover medidas que alterem este quadro – entre elas, a reforma do plano de benefícios previdenciários de acordo com a realidade social e econômica do município.
Além disso, o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, órgão que tem a atribuição de fiscalizar a atuação da administração pública deste município, já determinou que Marília promova a revisão de sua legislação previdenciária para conter o severo quadro do nosso regime. E ressalto que o termo utilizado no julgamento de contas de 2019 foi exatamente este: “determinar”. Veja que um órgão de caráter fiscalizatório está determinando, e não sugerindo, uma mudança previdenciária, o que indica a gravidade de nossa situação.
7. As medidas a serem adotadas pelo município serão suficientes?
De acordo com o estudo atuarial elaborado com base no projeto de lei de reforma da previdência protocolado junto à Câmara, termos um superávit de aproximado de R$ 118.326,021, o que apesar de não ser muito, atende ao mandamento de equilíbrio do sistema.
Acaso futuramente não venham a ser suficientes, outras deverão ser adotadas, como exemplo a instituição de alíquota extraordinária.
8. Existem outras medidas, além da reforma da Previdência, que poderiam ser adotadas?
Sim. Num quadro em que a promoção de alterações do plano de benefícios do regime não seja suficiente, a emenda 103 autoriza a instituição de alíquotas extraordinárias a serem custeadas pelo servidor para alcançar o superávit, o que exigiria maior contribuição do servidor. No entanto, como chegamos ao superávit apenas com a reforma, não se vislumbra no momento a necessidade de instituição desta alíquota.
9. A reforma previdenciária do município de Marília não se afigura demasiadamente rígida?
Entende-se que não, pois ela segue a própria emenda 103/2019 ainda nos critérios mais brandos estabelecidos por esta, já que a alteração constitucional promovida em 2019 possibilita a adoção de critérios mais rígidos e onerosos, inclusive, para o servidor, estes relativos a tempo de contribuição, idade para se aposentar e regras de transição para obtenção dos benefícios.
A exemplo, podemos citar outros entes que adotaram critérios bastante rígidos e custosos para o servidor, como o município de Barretos e o próprio Estado de São Paulo que, inclusive, passaram a exigir contribuição de servidores aposentados que recebem a partir de um salário mínimo, além da instituição de alíquota extraordinária para todos os servidores ativos e inativos.
10. Quais as consequências caso não seja aprovada a reforma da Previdência?
A inércia do município em, eventualmente, não efetivar a reforma da previdência implicará em sanções diretas ao chefe do Executivo que, fatalmente, responderá por crime de responsabilidade, e ainda o município será impedido de obter os repasses da União e Estado, e também será obstado em firmar convênios.
Além da possibilidade de indicação pela Secretaria Especial de Previdência e Tribunal de Contas de extinção do RPPS, posto quem, sem a reforma não e alcançará resultado superavitário, cuja consequência será a remessa dos novos segurados ao RGPS, onerando-se mais o município com o retorno dos atuais aposentados e os iminentes para a sua folha de pagamento, cujas implicações financeiras para o município se afiguram muito duras, trazendo prejuízo para a população como um todo, dado que o Ente ficará impedido de promover as devidas políticas públicas que devem se voltar em benefício dos cidadãos em decorrência de seu elevado comprometimento com a folha de pagamento, que é vedado por lei.
Desta forma, a ausência de reestruturação no âmbito do Ipremm, com a reforma, implicará em ônus severo que extrapola questões internas, já que o orça mento é do município como um todo, onde o gestor deve executar políticas públicas voltadas a todos os cidadãos, e nestes se enquadram os servidores. Penar de maneira pontual só dendê a agravar ainda mais o quadro da Previdência e impactar de forma negativa o desenvolvimento da cidade como um todo.
Além disso, há leis que determinam como se deve prever e executar o orçamento, impondo, aliás limites de gastos e aplicação mínima em determinados segmentos, como saúde e educação. Gerir o município é algo complexo e demanda imensa responsabilidade. Por isso, a necessidade da implementação da reforma da Previdência.
11. Quais as suas expectativas face ao projeto de reforma da Previdência? Seria ele suficiente para a recuperação do regime previdenciário de um modo geral?
A reforma da previdência se mostra um passo inicial na busca de preservação do regime próprio de previdência do município de Marília.
De forma isolada, ela não se mostra suficiente a garantir ao longo dos anos a sua existência e o custeio dos presentes e futuros benefícios, posto que há a necessidade de criação da previdência complementar, por imposição constitucional, bem como de reestruturação de todo o RPPS sob o aspecto financeiro, com análise técnica sobre entrada de recursos e custeio das despesa, o que já foi motivo de debate junto a Secretaria Especial de Previdência e que, tão logo seja concluída a reforma, será iniciada a sua efetiva recuperação.
Trata-se, portanto, de um trabalho contínuo que se modifica ano a ano, a exemplo do já mencionado aumento da expectativa de vida dos brasileiros, que faz com que o pagamento dos benefícios se alonguem no tempo.