Polícia Civil indicia médico por morte de gestante na Gota de Leite
A Polícia Civil de Marília concluiu nesta quarta-feira (1º) um inquérito policial que apura suposta negligência médica na morte de uma mulher de 27 anos em uma maternidade da cidade. A vítima teve quadro de hemorragia após o parto e não resistiu.
A denúncia foi registrada pelo marido da vítima. Na queixa, o homem conta que estava casado há 15 anos e, junto, o casal tinha três filhos. Na quarta gestação, a mulher teria feito o pré-natal no posto de saúde do distrito de Rosália e estava de 40 semanas.
O marido relata que o parto ocorreu no dia 25 de março de 2020, em uma maternidade de Marília. A polícia não confirmou para a reportagem, mas o Marília Notícia apurou que a instituição se trata da Gota de Leite.
O homem acredita que, por negligência médica dos profissionais, a esposa apresentou quadro hemorrágico. A criança nasceu em condições normais e sobreviveu.
A mãe, porém, precisou ser encaminhada para o Hospital das Clínicas (HC), onde morreu no dia seguinte, por volta das 6h.
DENÚNCIA
Na denúncia, o marido diz que foi com a esposa para fazer a internação do parto e a mulher pediu que ele voltasse para casa, pois precisava cuidar dos outros filhos. A vítima teria dito que assim que o bebê nascesse pediria para avisar o esposo.
Segundo o relato, o homem e uma cunhada tentaram falar várias vezes com a gestante, sem sucesso. Após várias tentativas, a cunhada teria ligado na maternidade e foi informada que a criança ainda não tinha nascido.
Três horas depois, a família ligou novamente na maternidade e recebeu a informação de que o bebê tinha nascido e que mãe e filho estavam bem.
O marido alega que, depois de uma hora, recebeu telefonema dizendo que a mulher havia tido complicações pós-parto e seria necessária sua presença na maternidade.
O declarante afirma que chegou ao local e logo percebeu uma ‘correria’ no corredor. Observou que uma enfermeira perguntou ao médico qual medicação foi dada à paciente, se referindo à vítima. Segundo depoimento do marido, o médico teria respondido que não tinha medicado a mulher.
O marido afirma ainda que o médico se dirigiu até ele e perguntou se a vítima tinha algum problema psiquiátrico, pois teria gritado ofendendo as enfermeiras e tentado agredi-las e que, por conta disso, teria sido preciso amarrá-la na cama.
O profissional teria dito ainda que, por a mulher estar muito alterada, o coração dela havia parado de bater e que haviam chamado o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu).
O marido da vítima conta que aguardou a transferência da esposa e que, na ficha dela, teria sido colocado que ela não havia feito o pré-natal.
Já no Pronto-socorro do HC, o marido chegou a ser questionado sobre o pré-natal e desmentiu a versão da ficha preenchida na maternidade.
Conforme o declarante, a médica do HC informou na ocasião que a vítima estava com hemorragia e tinha tido uma parada cardíaca ainda na maternidade. O homem foi, então, informado que seria necessária uma operação de emergência para tentar parar com o sangramento.
Tempos depois, a médica teria retornado e informado que o estado da vítima era grave e que ela poderia ter outra parada cardíaca, pois havia perdido muito sangue e não estava sendo possível localizar a origem da hemorragia.
O marido alega que, sem opção, autorizou a cirurgia. A mulher, então, sofreu uma nova parada cardíaca e não resistiu.
TESTEMUNHA
No dia seguinte, uma testemunha teria comentado com o irmão do marido que uma das enfermeiras da maternidade, sua ‘conhecida’, teria contado que houve negligência no atendimento da gestante.
O marido também disse que soube que a enfermeira precisou pedir afastamento, pois estava em estado de choque pelo que presenciou.
A enfermeira teria contado que houve troca de turno dos médicos e que, logo em seguida, a vítima começou a gritar. A profissional teria constatado que a vagina da mulher estava preta, provavelmente já com hemorragia.
O médico foi acionado para tomar providência sobre o caso e teria dito que era para deixar a vítima gritando mais um pouco, pois era supostamente ‘usuária de droga’.
O relato diz que o profissional voltou a dormir e que, quando o bebê nasceu, estava com um dedo da mão roxo e com algumas manchas nas costas. A mãe ainda teria ficado sozinha após o parto, sem nenhuma assistência.
INQUÉRITO
Consta no inquérito que, já no quarto, a mulher começou a pedir socorro e dizia que ia morrer. Chamado, o médico teria apontado o dedo para ela e dito que a vítima era escandalosa e usuária de drogas.
Supostamente o médico ainda teria olhado para um casal que estava no quarto e falado “pode processar, é mais um nas costas”, “isso não dá em nada, pois ela é drogada”.
Conforme o relato, foi quando a mulher teria sido amarrada e teve a primeira parada cardíaca.
A polícia fez diligências durante dois anos, ouvindo médicos envolvidos e enfermeiras. Também foi pedido laudo complementar.
O delegado José Carlos Costa, coordenador de Central de Polícia Judiciária (CPJ), indiciou o médico que fez o parto por homicídio culposo – quando não há intenção de matar. O caso segue agora para apreciação da Justiça.
OUTRO LADO
A Gota de Leite foi procurada pela reportagem e informou que não vai se manifestar. A defesa do médico apontado no caso também foi acionada pelo Marília Notícia e pontuou que “não comentamos casos que estão [em] discussão judicial.”