Com pediatria cheia, mães vivem angústia em busca de leito
Explosão da demanda por atendimento pediátrico nos hospitais, postos de saúde e consultórios particulares – causada principalmente por doenças respiratórias – já começa a produzir alguns dramas entre os marilienses.
São relatos como a da publicitária Mariane Alexia de Souza, de 24 anos, que está há dois dias “internada” com o filho de três meses no Pronto Atendimento (PA) da zona Sul à espera de um leito hospitalar.
O pequeno Theo Alfen teve hipóxia neonatal e sofre convulsões. Passou mais de dois terços da vida intubado em uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI). A alta só veio na semana passada, porém, o menino apresentou um quadro de bronquiolite e precisou voltar ao serviço de emergência.
A mãe relata a espera angustiante. “Estamos aqui desde a segunda-feira (2) e a informação é que não tem leito. Ele já está cadastrado na Cross (sistema de regulação), mas a vaga não sai. Estou preocupada porque ele precisa de um local com mais recursos”, afirma a mãe.
Theo já está sendo submetido ao tratamento com antibióticos. Mariane caminha pela enfermaria pediátrica, se achega ao filho, sem deixar a máscara [fundamental para protegê-lo] e conta as horas para ver o filho tratado – livre das convulsões e do quadro respiratório – em casa.
“A luta pela saúde dele tem sido muito grande. A imunidade ainda deve ser baixa, porque desde que nasceu, praticamente só ficou no hospital. Agora aqui no PA… Daqui há pouco em outro hospital. Fico com muito medo da infecção do meu filho agravar”, relata a mãe.
FALTA DE RECURSOS
O caso de Theo apenas ilustra situação que o Marília Notícia apurou por fontes diversas. Há relatos de sobrecarga no Departamento de Atenção à Saúde Materno Infantil, que funciona no HC II, o popular Hospital Materno Infantil (HMI).
Profissionais de medicina e enfermagem, além das equipes de apoio, já estariam esgotados com número excessivo de pacientes pediátricos nos últimos meses. Além disso, há pedidos para ampliação de leitos e contratação de servidores, para evitar casos como o de Theo.
Em seu site institucional, o principal hospital que recebe pacientes pelo Sistema Único de Saúde (SUS) em Marília aponta a existência de oito leitos de UTI Neonatal, oito para Cuidados Intermediários e sete em UTI Pediátrica, que recebem crianças com mais de 28 dias.
São outros 24 leitos nas especialidades de pediatria, mais dez de ginecologia e 20 de obstetrícia que funcionam em sistema de alojamento conjunto, para o cuidado mãe/bebê.
PÓS-PANDEMIA
Pediatras e profissionais de outras áreas da medicina ouvidos pelo MN alertam para uma crise de saúde no pós-pandemia que tem as crianças como principais vítimas. Alguns médicos têm chamado o fenômeno de “reset na imunidade”, com o termo emprestado da informática.
O isolamento social, seguido do distanciamento e uso ostensivo das máscaras, poupou que as crianças fossem vítimas da Covid-19 ou mesmo favorecessem a proliferação das doenças entre os adultos. Porém, fez com que muitas delas perdessem a resistência a vírus e bactérias.
“Sabe aquele período de desespero, que os pais pensam até em tirar a criança da escola, porque não saem do pediatra, ficam noites sem dormir, tem que entrar com antibiótico? Então, isso está acontecendo agora com muitas crianças ao mesmo tempo. Era como se o sistema imunológico tivesse que voltar a reconhecer as ameaças patogênicas de quando tinha um ou dois anos de idade, tudo novamente”, explica um pediatra ouvido pelo MN.
Quadros virais, diarreias, vômitos, sintomas alérgicos estão mais frequentes, combinados com escassez de antibióticos. O médico afirma que o outono é o “inimigo número um” do pediatra e vê uma nítida antecipação da curva de aumento das doenças infecciosas.
“Estamos em uma situação assustadora porque agora era para ser só o começo do período sazonal, mas já estamos com muitos pacientes. A temperatura ainda vai cair mais, o tempo ainda vai ficar mais seco. Então o cenário é bastante preocupante”, alerta o profissional.
OUTRO LADO
O MN questionou a direção do HC/Famema sobre a falta de vaga para Theo, a suposta superlotação e também o apontamento de saturação (de recursos humanos e materiais) recebida pela reportagem.
Em nota, a instituição informa que o Hospital das Clínicas Materno Infantil se encontra com alta demanda de pacientes com queixas de síndromes gripais, cujos leitos destinados somam oito na enfermaria e dois em UTI (sendo um de UTI Neonatal e outro de UTI Pediátrica).
“O aumento dos casos pode ser identificado a partir do dia 18 de abril; de lá para cá a média de ocupação das UTIs do Hospital Materno Infantil atinge a marca de 113% e na enfermaria 103%.”