O possível fim do licenciamento ambiental e suas consequências
Após assistirmos a uma tragédia ambiental em Minas Gerais de proporções incalculáveis há apenas 6 meses, uma notícia divulgada na semana passada está causando uma grande polêmica e preocupando os ambientalistas brasileiros: a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado emitiu um parecer favorável à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 65/2012, que permitirá a aprovação de obras públicas sem o cumprimento das etapas exigidas para a obtenção do licenciamento ambiental.
A notícia não foi recebida com a devida importância pela maioria da população, principalmente para quem não atua na área ambiental e também porque a proposta foi aprovada quando as atenções estão voltadas ao processo de impeachment da Presidente. Entretanto, o assunto é de fundamental importância para a conservação do meio ambiente e podemos correr sérios riscos de desastres ambientais no Brasil.
Se a proposta realmente for aprovada, a instalação de empreendimentos de grande porte e com potencial poluidor poderão ser aprovados apenas com a apresentação de Estudo Prévio de Impacto Ambiental (EPIA). Essa autorização deverá ser irrevogável, pois a proposta pretende adicionar o sétimo parágrafo ao art. 225 da Constituição Federal, para assegurar a continuidade de obras públicas após a concessão da licença ambiental. Isso afetará todas as leis e regulamentações sobre Avaliação de Impactos Ambientais no Brasil, pois nenhuma outra lei no país poderá entrar em conflito com a Constituição Federal.
O Licenciamento Ambiental é um instrumento da Política Nacional de Meio Ambiente, instituída pela Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981. Seu principal objetivo é promover o controle prévio à construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadores de recursos ambientais, considerados efetiva e potencialmente poluidores, bem como os capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental.
O que a tragédia de Mariana, em Minas Gerais, tem a ver com isso? A tragédia de Mariana, assim como vários acidentes ambientais de menores proporções, podem ocorrer devido à falhas nos estudos que devem ser realizados para a obtenção de Licença Ambiental. Isso vale também para empresas ligadas à exploração de petróleo e indústrias potencialmente poluidoras.
Para que a mineradora Samarco fosse instalada em Mariana-MG, foi exigido o licenciamento pertinente para as atividades de mineração. Para a construção da ciclovia que desabou no Rio de Janeiro na semana passada, também foi exigido o licenciamento ambiental. Mesmo assim, as tragédias aconteceram. Se conseguirem flexibilizar o processo de Licenciamento Ambiental e acabarem com as exigências do processo de licenciamento, as consequências poderão ser desastrosas ao meio ambiente.
O órgão ambiental competente é quem deve definir os critérios que serão exigidos para a obtenção de licença, considerando principalmente o porte do empreendimento e os riscos ambientais. Alguns exemplos de empreendimentos e atividades sujeitas ao licenciamento ambiental são as indústrias de extração e tratamento de minerais, indústria de papel e celulose, de borracha, couros e peles, indústrias químicas, terminais de minério, petróleo e derivados e produtos químicos, indústria têxtil, indústria de produtos alimentares e bebidas, obras civis, empreendimentos de geração e transmissão de energia, obras de transporte, terminais e depósitos, atividades agropecuárias e qualquer empreendimento que utilize recursos naturais. Já imaginou empreendimentos desse tipo serem aprovados sem o processo de licenciamento ambiental?
O Licenciamento Ambiental é realizado através de um procedimento administrativo que ocorre em três etapas: Licença Prévia, Licença de Instalação e Licença de Operação. Portanto, os projetos deverão ser avaliados em suas diferentes fases: concepção/planejamento, instalação (construção) e operação, recebendo uma licença específica. A Licença de Operação deve ser periodicamente renovada para garantir que um empreendimento já licenciado continue não causando danos ao meio ambiente e à sociedade.
Diversos estudos podem ser exigidos para a obtenção da licença ambiental, dependendo do porte do empreendimento e dos impactos que poderão ser causados na sua área de influência. A Resolução CONAMA nº 001/86 estabeleceu diretrizes gerais para a regulamentação do licenciamento ambiental, determinando a submissão do Estudo de Impacto Ambiental e seu respectivo Relatório de Impacto Ambiental – EIA/RIMA ao sistema de Licenciamento, definindo também critérios para sua aplicação. O EIA/RIMA é um estudo detalhado que deve ser elaborado para identificar e avaliar todas as alterações que determinada atividade poderá causar ao meio ambiente, por isso, é um importante documento que fornece subsídios ao processo de licenciamento ambiental. O Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) deve apresentar as conclusões do EIA e tem como objetivo informar à sociedade sobre os impactos, medidas mitigadoras e programas de monitoramento do empreendimento ou atividade. Esses estudos devem ser apresentados à sociedade e aos governantes através de audiências públicas para que seja decidido se a obra será aprovada, se deverá ser modificada ou se deverá ser impedida de ser implantada.
Outros estudos também podem ser exigidos para a obtenção de licença ambiental, como o Relatório Ambiental, Diagnóstico Ambiental, Plano de Manejo, Plano de Recuperação de Área Degradada, Análise Preliminar de Risco, Plano de Controle Ambiental, Relatório de Controle Ambiental, entre outros. O órgão ambiental competente é quem define quais serão os estudos ambientais relacionados ao respectivo processo de licenciamento, que deverão ser realizados por profissionais qualificados e equipes multidisciplinares, sob responsabilidade e custas do empreendedor.
Muitas empresas de consultoria ambiental são responsáveis atualmente pela elaboração desses estudos, que devem contemplar a análise e identificação dos impactos ambientais do projeto e propor medidas mitigadoras e de controle ambiental, garantindo o uso sustentável dos recursos naturais. Medidas mitigadoras são aquelas propostas a corrigir impactos negativos ou a reduzir sua magnitude.
O Licenciamento Ambiental passou por adaptações até chegar à versão atual, pois no início aplicava-se apenas à fontes de poluição de atividades industriais e projetos como aterros de resíduos. Atualmente, os processos de licenciamento devem abranger não apenas as emissões de poluentes, mas incluem também os seus efeitos sobre a biota e os impactos sociais associados. Todos os empreendimentos devem comprovar quais serão as medidas adotadas para minimizar ou compensar seus impactos, como será feita a captação de água, tratamento de esgoto, disposição de resíduos, métodos que serão implementados para promover a drenagem de águas pluviais, entre outros.
O licenciamento ambiental é considerado um dos mais importantes mecanismos de controle de degradação ambiental no Brasil, pois é a maneira que o Poder Público dispõe para compatibilizar o desenvolvimento econômico com a preservação do meio ambiente. Apesar de tantas exigências quanto aos estudos de impactos ambientais, as tragédias estão se tornando cada vez mais frequentes. Muitos fatos não são divulgados para a população, mas acidentes com vazamentos de produtos químicos, poluição dos recursos hídricos por efluentes industriais, derramamento de petróleo, entre outros, são eventos que acontecem comumente no Brasil.
O Parlamento brasileiro busca realizar alterações na legislação ambiental referente ao licenciamento há muito tempo e de forma silenciosa, pois na concepção de muitos, o licenciamento ambiental impõe limitações ao desenvolvimento econômico do país. A PEC 65 foi apresentada em dezembro de 2012, mas apenas no dia 7 de março de 2016 a Comissão do Senado Federal emitiu parecer favorável à sua aprovação. No dia 27 de abril, a Comissão do Senado aprovou o parecer sem a discussão com a sociedade e sem a participação de especialistas na área.
Ainda será necessário que a PEC 65/2012 passe por uma votação no Plenário do Senado. Caso seja aprovada, a proposta seguirá para tramitação na Câmara e depois retornará ao Senado, para então passar pela sanção presidencial.
A simples apresentação de um Estudo Prévio de Impacto Ambiental, que pode ser realizado por uma equipe de profissionais contratados pelo próprio empreendedor não substitui o processo de Licenciamento Ambiental e também não é suficiente para garantir que um empreendimento não cause danos ao meio ambiente. Portanto, é necessário que a população participe e que a PEC 65/12 não seja aprovada!.
O que podemos fazer?
1.Qualquer pessoa pode entrar no site do senado e votar CONTRA na consulta pública sobre a PEC 65/2012:
https://www12.senado.leg.br/ecidadania/visualizacaotexto?id=120446
2.Podemos assinar o abaixo assinado no site da AVAAZ:
3.Participar da campanha da Anamma que apresenta várias possibilidades de se manifestar sobre a causa:
http://www.anamma.org.br/#!pec-65/q9ocg
Votar não custa nada, diante do tamanho do problema que a falta de licenciamento pode causar. Diga não à PEC 65/12 e faça a sua parte!