Lula poupa Forças Armadas de cortes nas emendas em novo gesto aos militares
O presidente Lula (PT) poupou recursos das Forças Armadas do corte no Orçamento de 2024. Ao sancionar o texto, o petista vetou R$ 5,6 bilhões em emendas parlamentares, dinheiro carimbado para deputados e senadores.
Como mostrou a Folha de S.Paulo, a tesourada do petista atingiu em cheio ministérios comandados pelos partidos do centrão, como Turismo e Esporte chefiados por Celso Sabino (União Brasil) e André Fufuca (PP), respectivamente.
Três unidades orçamentárias ligadas às Forças Armadas tiveram o mesmo tratamento de ministérios considerados centrais pelo Palácio do Planalto, como Saúde e Educação, e foram poupados do corte.
A manutenção dos valores é mais um dos gestos do petista à caserna, que incluíram uma série de compromissos militares em suas viagens no início do ano.
O Comando do Exército manteve o montante de R$ 10 milhões em emendas de comissão que tinha sido aprovado pelo Congresso, enquanto o Comando da Aeronáutica receberá R$ 7 milhões desse tipo de recurso o corte na Aeronáutica foi mínimo, de apenas R$ 11 mil (0,2% da previsão inicial).
O valor mais alto em emenda de comissão foi destinado ao Fundo Naval, da Marinha, com mais de R$ 122 milhões. A verba foi protegida por Lula.
Emendas são recursos que deputados e senadores enviam para obras e projetos e, com isso, colhem capital político. Da outra ponta, é uma forma de os ministérios engordarem o caixa em um orçamento muito restrito e vinculado ao Legislativo.
No caso dos Comandos do Exército e da Aeronáutica, a verba reservada para emendas de comissão se aproxima do valor que ministérios como o da Ciência e Tecnologia e o do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior receberiam, também por meio de emendas. No entanto, o presidente vetou esses repasses para ambas as pastas.
Já a cifra do Fundo Naval é praticamente a mesma que a do Fundo de Assistência Social, área prioritária para o presidente, mas que também sofreu com cortes.
Generais relataram à Folha de S.Paulo que somente tiveram seus orçamentos modificados no âmbito do novo PAC (Projeto de Aceleração de Crescimento). Os cortes de quase R$ 350 milhões foram feitos pelo Congresso, e Lula não conseguiu recompor a previsão inicial.
O governo estipulava entregar às Forças Armadas e ao Ministério da Defesa R$ 6 bilhões para investimentos nos projetos estratégicos em 2024. O valor baixou para R$ 5,6 bilhões na Lei Orçamentária deste ano.
O principal corte foi feito nos investimentos do Exército, que viu o PAC reduzido de R$ 1,5 bilhão para R$ 1,3 bilhão. A Aeronáutica teve uma redução de R$ 130 milhões, e a Marinha, de R$ 7 milhões.
Outro corte significativo feito pelo Congresso foi sobre a dotação orçamentária do Ministério da Defesa para a administração da pasta. Técnicos relataram que a redução representa dois terços do valor previsto inicialmente de R$ 126 milhões previsto na proposta original de orçamento para R$ 42 milhões no orçamento sancionado por Lula.
A situação foi apresentada na quinta-feira (25) para o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro. A pasta ainda avalia formas de recuperar ao menos parte dos recursos retirados pelo Congresso, já que a verba é considerada insuficiente para manter o funcionamento da sede.
A relação entre Lula e as Forças Armadas foi marcada por desconfianças desde a transição, mas houve um gradual distensionamento no último ano.
As primeiras viagens do mandatário neste ano foram em bastiões do PT no Nordeste, mas foram recheadas de compromissos militares, num gesto à caserna.
O mandatário participou de uma cerimônia de implantação do Parque Tecnológico Aeroespacial em Salvador, num projeto idealizado pelo Ministério da Defesa com o Comando da Aeronáutica, até a assinatura do termo de compromisso para construção da Escola de Sargentos.
Ele esteve ainda em cerimônia de transmissão de cargo do Comando Militar do Nordeste, no Recife, quando o general Kleber Vasconcellos passou o posto para o general Maurílio Ribeiro.
O pano de fundo da desconfiança sempre foi a avaliação, entre conselheiros de Lula, de que oficiais de alta patente estavam comprometidos com o projeto político de Jair Bolsonaro (PL). O próprio Lula já sinalizou ter visto participação de fardados nos ataques antidemocráticos de 8 de janeiro.
Poucos dias depois das cenas de vandalismo em Brasília, ele declarou em entrevista à GloboNews que os ataques eram um “começo de golpe de Estado” e que integrantes das Forças Armadas que quiserem fazer política têm de tirar a farda e renunciar do seu cargo.
O veto de Lula nas emendas parlamentares de 2024, anunciado na segunda-feira (22), é relevante porque pode desencadear uma crise com o Congresso. Ministros e integrantes do Planalto já acionaram líderes e os presidentes das duas Casas para tentar contornar a situação. Parlamentares já falam em derrubada do veto do petista.
Além dos militares, o chefe do Executivo poupou dos cortes pastas mais ligadas à sua gestão, como das Mulheres e o do Meio Ambiente.
“O critério foi preservar a continuidade de políticas públicas e os pisos para saúde, educação e investimentos”, disse o Ministério do Planejamento, em resposta a questionamento da Folha sobre os cortes neste ano.
Ao sancionar o Orçamento deste ano, na segunda-feira, o petista aplicou um corte de R$ 5,6 bilhões nas chamadas emendas de comissão, que, segundo líderes do Congresso, serão usadas para acordos políticos que fortalecem as cúpulas da Câmara dos Deputados e do Senado.
Esse tipo de verba funcionará, segundo esses líderes, como as extintas emendas de relator, que eram a principal moeda de troca nas negociações do governo Bolsonaro e do Legislativo. O mecanismo foi considerado inconstitucional pelo STF (Supremo Tribunal Federal) no fim de 2022.
Apesar da tesourada, o total em emendas parlamentares em 2024 será recorde: R$ 47,5 bilhões.
Existem três tipos de emendas: as individuais (que todo deputado e senador têm direito), as de bancada (parlamentares de cada estado definem prioridades para a região) e as de comissão (definida por integrantes dos colegiados do Congresso).
Por Marianna Holanda, Thiago Resende e César Feitoza