Lira reage ao STF e instala comissão para analisar PEC das drogas na Câmara
O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), oficializou a criação da comissão especial que irá analisar a PEC (proposta de emenda à Constituição) das Drogas. O ato foi publicado nos canais oficiais da Casa na noite desta terça-feira (25), após decisão do Supremo Tribunal Federal em julgamento sobre o tema.
O STF formou maioria a favor da descriminalização do porte de maconha para uso pessoal, depois de nove anos de julgamento. A PEC das Drogas foi apresentada pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD), e aprovada por ampla maioria em abril pelos senadores, em reação ao julgamento do STF.
Ela foi aprovada na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara dos Deputados no último dia 12.
Com a aprovação na CCJ, cabe ao presidente da Câmara designar a comissão especial para tratar do mérito da proposta. Há um prazo de 40 sessões para votar o texto no âmbito do colegiado, sendo que o período para emendas se esgota nas 10 primeiras sessões.
Lira já tinha dado declarações públicas de que a PEC seguiria o rito normal na Casa, descartando atropelos. Apesar de o tema ter sido aprovado no dia 12 na comissão, ele ainda não tinha instalado o grupo.
O ato da presidência é do dia 17, mas foi publicado nos canais oficiais da Casa e disparado pela assessoria de imprensa do alagoano na noite desta terça. Segundo o texto, a comissão será formada por 34 membros titulares e 34 suplentes, que ainda precisam ser designados.
Lira está fora do país, em Lisboa, Portugal, para participar de evento jurídico. Durante sessão de votações da Câmara nesta terça, o líder do PL na Casa, deputado Altineu Côrtes (RJ), criticou a decisão do Supremo e cobrou providências de Lira e de Pacheco.
“Hoje foi na matéria da liberação da maconha, mas quantas vezes o Supremo tem invadido a competência do Congresso e legislado por nós? O que vale: o voto popular que coloca aqui deputados e senadores para legislar ou o voto dos ministros do Supremo?”, disse Côrtes.
“Espero que o Congresso reverta e dialogue com o Supremo Tribunal Federal e a gente coloque as coisas em seu devido lugar. O Supremo deve exercer o seu papel, que é muito importante, mas jamais legislar em nome do Congresso”, afirmou o líder do PL.
O deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) também criticou o Supremo e afirmou, em publicação nas redes sociais, que “é lamentável ver o STF usurpando mais uma vez a competência do Legislativo”.
A PEC das Drogas constitucionaliza a criminalização de porte e posse de drogas. A proposta determina que é crime possuir ou carregar drogas, independentemente da quantidade e da substância -proibição que existe hoje apenas em lei. Ela não define critérios objetivos para diferenciar o usuário do traficante.
Mais cedo nesta terça, Pacheco afirmou em declaração à imprensa que respeita o entendimento do STF, mas chamou a medida de inusitada e disse, ainda, que ela criaria um vácuo e uma distorção jurídica.
“Acho inusitado que depois de 35 anos de vigência da Constituição Federal, agora se aponte uma inconstitucionalidade no artigo 28, que inclusive coibiu a existência de drogas no Brasil durante muito tempo”, afirmou.
“Respeito decisão, mas o Supremo Tribunal Federal descriminalizar a maconha cria um vácuo e quebra lógica jurídica […] Eu discordo da decisão”, disse Pacheco.
O relator da PEC na CCJ, deputado Ricardo Salles (PL-SP), diz que irá procurar Lira para pedir para ser designado o presidente do grupo. “Foi uma ação rápida do presidente da Câmara em defesa das competências e prerrogativas do Legislativo”, afirma.
O líder da oposição a Câmara, deputado Filipe Barros (PL-PR), diz que foi pego de surpresa com a decisão de Lira, que classificou como “excelente”. Segundo ele, os partidos já conseguem indicar no sistema da Câmara quais serão seus representantes na comissão.
“A decisão do presidente Lira é excelente e foi mais rápida do que imaginávamos, eu levaria esse assunto a ele no colégio de líderes na próxima semana”, diz. “Agora, a oposição irá focar em conversar com os partidos políticos para que eles indiquem os deputados que irão compor a comissão, para que ela já possa funcionar na próxima semana. Nosso objetivo é, cumprido os prazos regimentais, votar no plenário da Câmara antes das eleições de outubro”, afirma Barros.
Na CCJ da Câmara, foram 47 votos favoráveis à PEC e 17 contrários. Partidos da esquerda tentaram obstruir a votação, e o governo federal não orientou sua bancada.
Após passar pela comissão especial, a PEC precisa ser analisada no plenário da Câmara, e são necessários 308 votos (de 513) para a sua aprovação, em dois turnos de votação. Caso seja aprovado, o texto será promulgado pelo Congresso, uma vez que emendas constitucionais não precisam de sanção do presidente da República.
Há uma avaliação entre deputados da esquerda à direita que a proposta tem votos suficientes para ser aprovada no plenário da Casa.
O presidente nacional do PP, senador Ciro Nogueira (PI), diz à reportagem que a decisão do STF “deixa três exemplos péssimos”. “O Legislativo não legislar; o Judiciário legislar; e a legislação permitir o retrocesso do porte de maconha. Continuarei insistindo para que a Constituição seja cumprida e a Câmara cumpra o seu dever e decida o assunto.”
Apesar da instalação da comissão especial, parlamentares da oposição dizem que o tema deverá avançar na Câmara no segundo semestre, dada a proximidade do recesso parlamentar (que começa oficialmente no dia 18 de julho).
Eles dizem que a prioridade de Lira é aprovar a regulamentação da reforma tributária até a segunda semana de julho, realizando um esforço concentrado dos parlamentares em torno do tema. Não teria prazo, portanto, para realizar todas as sessões da comissão especial.
Além disso, os deputados também afirmam que outro fator que poderá atrasar a tramitação da PEC na Casa é a eleição municipal, prevista para outubro. Isso porque tradicionalmente a Câmara fica esvaziada durante o processo eleitoral.
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POR VICTORIA AZEVEDO