“Foi horrível, achei que ia morrer”, diz vítima de violência contra a mulher
A Lei Maria da Penha foi sancionada em 7 de agosto de 2006 e surgiu da necessidade de inibir os casos de violência doméstica no Brasil, por isso este mês ficou conhecido como o ‘Agosto Lilás’ – mês da conscientização pelo fim da violência contra a mulher.
O Marília Notícia conversou com uma auxiliar de escritório, de 21 anos, que não quis se identificar e foi agredida pelo ex-namorado.
Ela relatou que o namoro durou quatro meses e que ele nunca demonstrou nenhum tipo de agressividade neste tempo, que era inclusive “super tranquilo”.
O relacionamento terminou e o rapaz tentou reatar com a mulher que estava grávida. Diante da negativa ela passou momentos de horror e acabou ferida com um canivete.
“Foi horrível, achei que ia morrer. Fui obrigada a andar com o carro até um lugar que, segundo ele, eu iria ficar até o bebê nascer. Eu desviei umas ruas e vi um posto. Entrei e pedi ajuda”, relatou a vítima ao MN.
Ela não imaginava que isso fosse acontecer, já que estava marcada apenas uma conversa. “Resolvemos tudo, estava tudo bem aparentemente, ele disse para levá-lo até a casa dele e eu iria embora. Na verdade acho que já tava tudo planejado. Ele tava estranho”, disse a jovem.
“Me dá muito medo. Tenho medo de encontrar ele em algum lugar e algo de ruim acontecer contra mim e meu filho”, finalizou.
O rapaz foi preso, passaria pela audiência de custódia e a jovem pediu medida protetiva de urgência contra ele.
Delegacia de Defesa da Mulher (DDM)
O MN também conversou com a delegada da DDM de Marília, Viviane Sponchiado, que disse que na delegacia são pedidas quase uma medida protetiva por dia. Em 2018, foram 340 medidas no ano todo. Em 2019, de 1 de janeiro até 31 de julho, foram 261 pedidos.
Esses números são de medidas protetivas expedidas através da DDM. As vítimas podem ainda pedir a medida diretamente no Ministério Público, por meio da Defensoria Pública ou através de um advogado particular.
“Eu acho importante quando as denúncias aumentam, porque significa que mais mulheres estão procurando a Justiça, estão dando voz ao que está acontecendo. O número pequeno pode ser um número irreal, pode ser um número mascarado”, disse Viviane.
A delegada explicou ainda que em alguns crimes menores a vítima pode escolher se ela quer um processo ou não, isso funciona, por exemplo, para ameaças e crimes contra a honra, injúrias, difamações.
“Nestes casos, a vítima pode escolher se ela quer processar ou não. Pode ser que ela se sinta melhor não processando, pode ser que o processo para ela seja muito difícil e ela prefira não ter. (…) Nos casos mais graves não cabe às vítimas a escolha, por exemplo, nas lesões, aí a vítima não escolhe. Acontecendo uma lesão o agressor vai ser processado, vai ser responsabilizado, independente da vítima querer ou não. Isso mudou em 2012 e desde então os processos relacionados a agressões físicas todos tem continuidade”.
Segundo Viviane um xingamento e pequenas condutas que cerceiam a liberdade devem preocupar as mulheres. Em muitos casos a violência começa ‘leve’ e vai aumentando com o tempo até ficar algo agressivo.
A DDM tem uma equipe multidisciplinar que cuida de todos os tipos de crime que são investigados pela delegacia. Essa equipe está à disposição da população com assistente social, psicóloga, enfermeira, psiquiatra e dentista.
“A gente gostaria que todas as vítimas viessem já na primeira forma de agressão, mesmo as mais leves. Mas sabemos que nem sempre é assim. Não julgamos aquelas vítimas que não vem logo no começo, aquelas que demoraram talvez duas, três, quatro agressões para procurar ajuda. Porque a gente sabe que o companheiro antes de ser agressor é a pessoa que elas amam, é a pessoa com quem ela divide a vida. Sabemos da dificuldade que é procurar ajuda”, conta a delegada.
Dados históricos de Marília
Marília registrou 2.096 casos de mulheres vítimas de violação doméstica, sexual e de outros tipos no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), do Ministério da Saúde, nos nove anos entre 2009 e 2017.
O casos são identificados e registrados pela Sistema Únicos de Saúde (SUS) e o último ano com dados disponíveis acumula 22,5% de todas as notificações do período.
Em 2017 foram 472 mulheres com notificações sobre violência, o que significa a média de mais de um caso por dia. O ano retrasado registrou um aumento de 95% na quantidade de notificações em relação a 2016, quando foram verificados 241 casos.
Entre 2009 e 2017 em mais da metade dos casos o local da violência foi a própria residência da mulher. A violência física é a mais comum, com ocorrência em 83% dos casos. Violência sexual (14%), estupro em si (10%) e violência psicológica ou moral (6,5%) também são frequentes.
Foram constatados 131 casos de ferimento com objetos perfuro-cortantes, 60 casos de enforcamento, 25 situações de tortura e 18 de agressões com objetos quentes.
Em 20% das notificações no período, o autor da violência foi o cônjuge da vítima e em 4,9% foi o ex-cônjuge.
Em 15,5% dos casos a autoria foi de desconhecidos e em 8,6% foi de amigos ou conhecidos. Em 5,8% os responsáveis foram namorados ou ex-namorados e 2,2% os próprios pais.
A faixa etária que mais concentra vítimas é dos 20 aos 29 anos (26,8%), seguida da faixa entre 30 e 39 anos (20,6%). As mulheres entre 15 e 19 anos são 15,3% das vítimas e aquelas entre 40 e 49 anos somam 13,7%.
De acordo com a escolaridade, o grupo que mais concentra vítimas (45,6%) é o de mulher que possuem o segundo ciclo do ensino fundamental incompleto, ou seja, não terminaram a 8ª série.
Já as mulheres que possuem ensino superior completo são 2,9% das vítimas – o mesmo percentual daquelas que ainda estão cursando uma graduação ou não chegaram a concluir a faculdade, mas cursaram durante algum tempo.
Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos
O MN também pediu dados sobre os casos de violência contra a mulher ocorridos em Marília e registrados pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos.
Em 2018 inteiro foram registradas 13 ameaças, este ano nos primeiros seis meses apenas uma.
Quatro mulheres foram mantidas em cárcere privado no ano passado. Em 2019, até junho houve apenas um registro.
Ainda de acordo com o Ministério de janeiro a dezembro de 2018, foram contabilizadas 63 ocorrências de violência doméstica e familiar. Este ano, no primeiro semestre já aconteceram 43.
38 casos de violência física foram registrados nos 12 meses do ano passado, este ano já são 33 em apenas seis meses.
Por outro lado, em 2018 duas mulheres foram estupradas e em 2019 ainda não houve registro.