Feminismo é Baboseira?
“Ah, que esse cara tem me consumido
A mim e a tudo que eu quis
Com seus olhinhos infantis
Como os olhos de um bandido.
Ele está na minha vida porque quer.
Eu estou pra o que der e vier.
Ele chega ao anoitecer.
Quando vem a madrugada, ele some…
Ele é quem quer,
Ele é o homem!
Eu sou apenas uma mulher!”
(música “Esse Cara” – Caetano Veloso)
O que falar sobre esse dia oito de março? O que falar sobre o dia internacional da mulher? Ou melhor, o que escrever sobre as mulheres? Peguei-me pensando, caçando palavras e memórias para encontrar grandezas suficientemente à altura delas para conversar com vocês. Até me atrasei para soltar o artigo.
Confesso que em meio a tantas coisas, não sabia o que escrever e tropecei mentalmente algumas vezes pelo meu dia oito de março. Esbarrei em Frida Kahlo, Chiquinha Gonzaga, Joana d’Ark, Maria Madalena, Janis Joplin, Clarice Lispector, Adriana Calcanhoto, Lou Salomé e cada uma das mulheres que rodeiam a minha vida (sobretudo as delas próprias). Quanta gente notável! Bem, o Feminismo é baboseira, então? – perguntaria algum leitor. Não sei. Mas hoje eu gostaria de focar na história do dia oito de março.
Curiosamente a maioria dessas grandes mulheres que me veio à mente – com as exceções de Maria Madalena e Joana d’Ark – fazem parte de uma estória que se iniciou agora ha pouco, logo ali… Por volta do século passado. E talvez você também tenha dificuldade de lembrar-se das demais mulheres, porém não porque elas não existiram. Bem, perguntaria o leitor, e o Feminismo? É baboseira? Não sei.
Bem, não é difícil pensar nas lideranças do mundo, como o papa, o presidente da França, dos EUA, do Japão, da FIFA, os líderes das famílias de antigamente (e até as atuais), os comandantes de frotas, sargentos, cientistas, pensadores, filósofos… Isso significa que a mulher é menos inteligente ou que não se esforçou suficientemente para a ascensão? Eu não teria tanta certeza. O fato é que é o dia da mulher tem expressividade.
As histórias que remetem à criação do dia internacional e as lutas pelos direitos da mulher são tensas. Em 1911 ocorreu um incêndio minimamente marcante em Nova Iorque. Foi com manifestações pela redução da jornada de trabalho que 129 tecelãs da Fábrica de Tecidos Triangle Shirtwaist cruzaram os braços pelo direito a uma jornada de 10 horas na primeira greve dos EUA conduzida por mulheres. Violentamente reprimidas pela polícia, as operárias refugiaram-se nas dependências da fábrica e no dia oito de março de 1857 os patrões e a polícia trancaram as portas e atearam fogo no local. As tecelãs morreram carbonizadas (extraído do site www.redemulher.org.br).
Contudo, a história de lutas das mulheres por direitos sociais dignos não começou aí. Datando do período da Revolução Industrial, no século XVIII, as trabalhadoras eram contratadas por um salário bem inferior ao dos homens – mais de 60% inferior – e cumpriam até 17 horas diárias sem qualquer garantia de segurança e de saúde no trabalho, sendo submetidas a agressões físicas e ameaças sexuais e verbais.
Ademais, é também é no aspecto da moral religiosa que as mulheres foram caladas. No início do século passado a sociedade, ao restringir a sexualidade ao casamento, se inclinava a manter a mulher no espaço privado, longe do âmbito público e da “tentação” ao saber e à autonomia. Eram somente criadas para serem esposas adequadas e mães de família, se restringindo ao cercadinho do lar. Na idade média, aquelas que fugiam às regras sociais eram queimadas na fogueira, tidas como bruxas e/ou prostitutas. Mas não precisamos ir muito longe com datas para notar o quão estamos perto de repreensões moralistas, basta darmos uma olhada no oriente médio ou mesmo nas saias (jeans) atuais.
Finalmente, foi na segunda metade do século passado com as lutas por direitos, a entrada no mercado de trabalho com a devida retaguarda do estado e o acesso à formação universitária que a mulher foi se retirando da exclusividade doméstica em direção ao espaço público, antes reservado quase que exclusivamente aos homens. As mudanças nos contratos matrimoniais e a pílula anticoncepcional foram também conferindo à mulher um maior espaço na sociedade, enquanto alguém desejante e que tem voz. Feminismo tem a ver com a busca da igualdade de direitos e não de papéis, tampouco é o contrário de machismo. E precisamos falar sobre Feminismo.
Por fim, para refletir sobre essa questão precisamos considerar a caminhada histórica da humanidade. Na coluna de hoje expus uma pequena parcela da força das mulheres e a hashtag #trocopresenteporigualdade foi difundida nos mares cibernéticos não à toa. Cada vez mais a mulher vem conquistando o seu espaço num mundo em que a briga por direitos está relacionada às relações de poder. E ela segue tendo que dar conta dos novos papéis em direção a uma autonomia que antes era exclusividade de um mundo não redondo, mas em formato de pênis. E depois a mulher é que é o sexo frágil.
Um abraço e até a próxima coluna!