Ex-secretário de Camarinha e dono de loja foram alvos da Polícia Federal
Na última terça-feira (18) a Polícia Federal deflagrou a segunda fase da Operação Reboot, que investiga a compra de 450 tablets supostamente superfaturados pela Secretaria Municipal de Saúde de Marília em 2016 com recursos do Ministério da Saúde.
O Marília Notícia obteve a informação através de uma fonte de dois dos locais onde teriam sido cumpridos os mandados de busca essa semana. Um dos endereços pertence a Hélio Benetti, ex-secretário da Saúde no governo Vinicius Camarinha. O outro local é de propriedade ligada aos donos da Kao Sistemas de Telecomunicações Ltda, que atende pelo nome fantasia de W3 Telecom, empresa que venceu a licitação dos tablets da Saúde.
O dono da W3 Telecom é Fakhouri Júnior, cunhado de Danilo Bigeschi, também ex-secretário da Saúde de Vinicius e apontado pela PF como envolvido no esquema.
Benetti é citado na ação de improbidade administrativa sobre o caso da compra de tablets supostamente superfaturados que tramita na Vara da Fazenda Pública.
Na segunda etapa da operação foram cumpridos três mandados de busca e apreensão expedidos pela terceira Vara Federal de Marília, após manifestação favorável do Ministério Público Federal (MPF).
Foram dois mandados cumpridos em Marília e um na cidade de Cotia (distante 421 quilômetros).
“Durante a análise do material apreendido na primeira fase da operação foram identificados outros possíveis envolvidos, o que justificou o requerimento de novas medidas constritivas”, afirmou comunicado oficial emitido na terça-feira.
A investigação da PF está na fase final e os envolvidos poderão responder pelos crimes de organização criminosa (três a oito anos de reclusão), fraude à licitação (dois a quatro anos de detenção), corrupção passiva (dois a 12 anos de reclusão), corrupção ativa (dois a 12 anos de reclusão) e lavagem de dinheiro (três a dez anos de reclusão).
O MN tentou contato com Hélio Benetti e a empresa na manhã desta sexta-feira (21), porém não conseguiu retorno. O espaço está aberto para manifestações.
Prejuízo e investigados
O prejuízo estimado aos cofres públicos é de aproximadamente R$ 500 mil por conta de um suposto direcionamento da licitação, segundo a Polícia Federal.
Entre os citados estão o deputado estadual e ex-prefeito Vinícius Camarinha e o atual vereador e ex-secretário da Saúde do município, Danilo Bigeschi, ambos do PSB. Os dois negam qualquer irregularidade.
Eles já foram denunciados pelo Ministério Público Estadual sobre o mesmo caso e a Advocacia Geral da União (AGU) pede a ida do processo para a Justiça Federal.
O Ministério Público Federal já declarou suspeitar que os tablets podem ter sido utilizados para financiar a campanha de Danilo para o Legislativo municipal – ele foi o vereador mais votado, com mais de 3,8 mil votos.
Operação Reboot
Em março de 2018 a PF cumpriu seis mandados de busca e apreensão em Marília na primeira fase da operação Reboot.
Ao todo foram expedidos 12 mandados pela 3ª Vara da Justiça Federal e a Câmara foi um dos alvos das buscas – mais especificamente o gabinete do vereador Danilo.
Agentes da PF também estiveram na Prefeitura e na sede da empresa W3 Telecom, na esquina da rua Taquaritinga com a 15 de Novembro, entre outros pontos da cidade.
Em 2016 o Marília Notícia publicou reportagens sobre as compras suspeitas já apontadas pelo Comus (Conselho Municipal da Saúde), envolvendo empresas ligadas a parentes do vereador e ex-secretário de Saúde, Danilo Bigeschi.
Naquela ocasião, além de Marília, foram cumpridos dois mandados na capital do Estado, um em Osasco, dois em São Caetano do Sul e um em Sete Barras, todos em São Paulo.
As medidas foram determinadas pela Justiça Federal que encontrou indícios da prática de irregularidades no âmbito na Secretaria Municipal de Saúde durante o procedimento licitatório, um pregão presencial.
O certame resultou na compra de 450 tablets, ao valor unitário de R$ 2.405 e total de R$ 1.082.250, com recursos do Ministério da Saúde.
Segundo apurado pela PF, as empresas participantes do procedimento licitatório seriam todas vinculadas a um único indivíduo “que possuiria relação de parentesco com pessoa que, à época, era ocupante do cargo de Assessor da Secretaria Municipal de Saúde”.
Ainda em 2016, em outro procedimento licitatório, a Secretaria Municipal de Educação adquiriu outros 500 tablets praticamente idênticos aos do procedimento investigado, mas pelo valor unitário de R$ 1.172.
A denominação da operação da está relacionada a manobras percebidas pelos investigadores que consistiram no arquivamento e reinício (reboot) do procedimento licitatório investigado, com valores discrepantes.
Outro lado
Em nota nesta terça ao Marília Notícia, o agora deputado estadual Vinicius Camarinha afirmou que não está denunciado na ação criminal. “Não fui e nem sou alvo de nenhuma operação da PF e nem respondo a nenhuma ação criminal por corrupção. Conforme lei municipal, todas as licitações da Prefeitura eram realizadas por cada secretaria. Tenho confiança nos secretários e interesse que tudo seja esclarecido.”
O vereador Danilo Bigeschi disse no ano passado por meio de assessoria de imprensa que “desconhece qualquer irregularidade em compra de equipamentos e serviços pela Secretaria Municipal de Saúde. Ele enfatiza ainda que nunca participou de processos licitatórios e que trabalha na secretaria há 20 anos como servidor público concursado, que possui ficha limpa, reputação ilibada e sempre se colocou à disposição da Justiça quando solicitado. Eleito pela primeira vez para vereador em 2016, ele reitera a todos que continuará trabalhando em prol da população, que repudia denúncias infundadas associadas ao seu nome e que confia na Justiça dos homens e de Deus”.
Ainda em 2018 a empresa que venceu a licitação dos tablets da Saúde enviou a seguinte nota ao MN:
“A KAO SISTEMAS DE TELECOMUNICAÇÕES, que atende pelo Nome Fantasia de W3 TELECOM, empresa que exerce suas atividades com o foco exclusivo na comercialização de bens e serviços a empresas e grupos econômicos, universidades, hospitais e prefeituras, com sede há mais de 10 (dez) anos na cidade de Marília, vem realizando suas atividades empresariais normais, tanto nesta comarca como na Capital do estado e em clientes por todo o Brasil, o que certifica a expertise para a realização de suas atividades com reconhecida eficiência, vem a público esclarecer que: 1. Participou do PREGÃO PRESENCIAL N.° 135/2016, tendo apresentado melhor proposta de preço e qualificação técnica para a prestação dos serviços contratados, sendo vitoriosa no certame; 2. Nunca foi procurada por qualquer pessoa, instituição pública ou privada, ou ONG para dar quaisquer esclarecimentos sobre o processo licitatório que participou e ganhou. A empresa tem seus telefones divulgados para seus clientes, cadastros em fornecedores e website (www.w3telecom.com.br), inclusive no serviço de auxílio à lista da Embratel com o nome KAO SISTEMAS DE TELECOMUNICAÇÕES LTDA; 3. Que a contratação, além da compra dos tablets consistem nos serviços de manutenção dos aparelhos e suporte técnico aos usuários, cujos serviços estão à disposição da Prefeitura Municipal de Marília desde o dia 01/08/2016. Desconhecemos quaisquer ilegalidades na referida contratação e permanecemos á disposição do Conselho Municipal de Saúde e a imprensa para os esclarecimentos que se fizerem necessários”.
Prefeitura
A atual gestão da administração local também se manifestou sobre o caso. “A Prefeitura de Marília, por meio da Secretaria Municipal da Saúde, informa que o município tem todo interesse no esclarecimento dos fatos divulgados hoje (terça-feira) pela Polícia Federal na Operação Reboot II, ocorridos na gestão anterior do ex-prefeito Vinicius Camarinha. Informa ainda que, além deste inquérito na PF, existe processo administrativo junto à Corregedoria Geral do Município. Caso comprovada responsabilidade dos gestores à época, as sanções serão aplicadas nos termos da lei. Além do mais, existe uma Ação Civil Pública sobre o mesmo assunto envolvendo os ex-gestores”.