‘Em Marília, sempre foram muito violentas as eleições’, diz advogado Samuel Castanheira
O advogado Samuel Castanheira tem se destacado como um dos poucos profissionais especializados em Direito Eleitoral na região de Marília. Ele conta uma carreira consolidada e de grande importância para o cenário político local, tendo atuado em diversas campanhas desde 2008.
Nascido em Suzano, na Grande São Paulo, Castanheira se mudou ainda criança para Dracena, onde viveu até os 16 anos. Ele veio para Marília para concluir o ensino médio e ingressou na faculdade de Direito pelo Univem, já com o objetivo de trilhar carreira na advocacia.
No final de sua graduação, Castanheira prestou um concurso público para a Prefeitura de Marília e foi aprovado. Durante quase três anos, atuou em diversos cargos jurídicos, passando por setores como execução fiscal, licitação, Secretaria de Obras, além de ser procurador-geral de entidades como o Departamento de Água e Esgoto de Marília (Daem), Empresa Municipal de Mobilidade Urbana (Emdurb) e Companhia de Desenvolvimento Econômico de Marília (Codemar).
Apesar de sua atuação na administração pública, Samuel Castanheira sempre manteve seu escritório particular, trabalhando até tarde da noite para consolidar sua carreira. Ele pediu exoneração do serviço público e decidiu se dedicar exclusivamente à advocacia. Desde então, sua atuação na área só cresceu.
Atualmente, seu escritório conta com 41 colaboradores e atende uma grande variedade de clientes, incluindo grandes instituições. A especialização em Direito Eleitoral tornou-se um diferencial, atraindo clientes de diversas localidades, desde Valinhos e Leme até Panorama.
No ano passado, Castanheira recebeu o título de Cidadão Mariliense. Ele atendeu a equipe do Marília Notícia em seu escritório, falou sobre a legislação eleitoral, sobre a política e eleições na cidade.
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MN – Em que parte da Prefeitura você trabalhou?
Samuel Castanheira – Comecei na execução fiscal e depois fui para o setor de licitação. Passei na Secretaria de Obras, fui procurador-geral do Daem, procurador da Emdurb e terminei como procurador-geral da Codemar.
MN – Tudo isso em três anos?
Samuel Castanheira – Eu girei bem na Prefeitura. Então, pedi, acho que em 2012, minha exoneração. Sempre mantive o escritório. Eu saía da Prefeitura às 17h30, ia para o escritório e ficava até 22h trabalhando. Minha ideia sempre foi advogar. Nunca foi ficar em nenhum cargo público.
MN – Quando foi seu primeiro trabalho eleitoral?
Samuel Castanheira – Me formei em 2007 e minha primeira eleição em 2008. Foi com o Bulgarelli. A partir disso que comecei a trabalhar na área eleitoral. O escritório hoje tem 41 colaboradores. Para o interior, é um escritório de médio porte. Temos grandes clientes também, grandes instituições, mas a parte que eu faço é do Direito Eleitoral.
MN – Em todo esse período você já trabalhou para muitos políticos?
Samuel Castanheira – Trabalhei para vários vereadores, e gente de toda a região começou a vir atrás de mim. Acabou ficando um trabalho legal e muita gente começou a vir para cá. Eu faço a região toda aqui praticamente. Pompeia, Oriente, Vera Cruz, Alvinlândia, Ubirajara. Tenho cliente desde Valinhos, Leme, até Panorama. Nesse raio todo, eu já tive cliente. Alguns continuam, outros deixam de ser candidatos mais para frente, mas eu tenho bastante clientela nesse trecho todo. Agudos, Bauru.
MN – Como que você ajuda os candidatos?
Samuel Castanheira – Existe um processo muito grande e cada vez mais uma judicialização nas eleições. Você primeiro assessora para que não cometam nenhum tipo de abuso, que possa culminar numa cassação, do diploma ou do mandato. Além dessa assessoria, a gente também defende nas ações. Fora isso, tem ainda a parte de propaganda irregular, propaganda antecipada.
MN – Tem muita novidade na legislação eleitoral?
Samuel Castanheira – Todo ano praticamente surge uma novidade eleitoral. A cada dois anos tem eleições, mas constantemente tem alteração na legislação eleitoral. É um campo que muda muito.
MN – E são poucos os advogados que atuam nessa área?
Samuel Castanheira – Hoje eu acho que tem na prova da OAB apenas duas questões de Direito Eleitoral. Acho que só no ano passado começou a cair questões sobre o assunto. É uma matéria que você não tem nem na grade do curso de Direito. Ninguém fala de Direito Eleitoral. É um negócio que fica perdido. Ninguém sabe praticamente. Não é algo tão simples de você começar, pois é sazonal. Para valer a pena, você tem que realmente ter bastante cliente. Não vai tentar pegar um cliente só por eleição.
MN – Mudou muito de quando você começou até agora?
Samuel Castanheira – Mudou. Hoje, por exemplo, não existe mais coligação na proporcional que tinha antes. Tem vários detalhezinhos que mudaram, desde tamanho de propaganda, tipo de propaganda e gastos eleitorais. Tem sempre mudado algo.
MN – Tem algum exemplo de mudança?
Samuel Castanheira – Carro de som podia e agora não pode mais. Só em carreata que pode. Carreata, passeata ou comício. Lembra que teve uma época que tinha um monte de carro de som rodando a cidade o dia inteiro. Não pode mais. Acho que desde 2018 que não podia mais. São várias pequenas alterações que vão surgindo.
MN – Você disse que pode carro de som na carreata, mas é preciso avisar que ela será feita?
Samuel Castanheira – Tem que avisar o órgão responsável, que é a Emdurb. Você tem que avisar que vai ter a carreata, até para irem acompanhando. É mais uma questão de logística da cidade do que propriamente eleitoral, mas tem que ter esse aviso prévio.
MN – Se não avisar, pode ter problema?
Samuel Castanheira – O certo é avisar. Tem a questão dos decibéis também, mas é um negócio tão difícil de você medir. Como é que você mede o decibéis? Porque a legislação eleitoral não fala em tipo de carro, ela fala em decibéis para definir que tipo de carro de som. Trio elétrico, por exemplo, não pode em carreata. Só no comício.
MN – Tem alguma novidade para essa eleição em especial?
Samuel Castanheira – Pré-candidato é uma coisa que não existia. Agora todo mundo pode falar que é pré-candidato. Acho que é uma evolução legislativa que vai acontecendo, pois antigamente você não podia falar nada.
MN – Quando pode efetivamente fazer a campanha?
Samuel Castanheira – Dia 16 de agosto. A partir do dia 16 pode fazer propaganda eleitoral e pedir voto. Se já estiver com o registro deferido, CNPJ, já pode começar a fazer santinho e entregar.
MN – Qual sua opinião sobre as pré-candidaturas?
Samuel Castanheira – Essa figura do pré-candidato, para mim, não faz muito sentido. Você só não pode pedir voto e nem falar que é candidato. Você vai lá e se apresenta como pré-candidato para buscar o apoio de alguém, não é? Acho que são questões que vão mudando com o tempo. Antes eram 90 dias de campanha e (hoje) reduziu pela metade.
MN – Pelo que você tem visto, tem gente que já tá em plena campanha?
Samuel Castanheira – Todos estão. A pessoa não vai postar, não vai registrar, mas está todo mundo indo atrás do seu voto. Essa que é a verdade. Por mais que não esteja pedindo expressamente, já está buscando o apoio.
MN – Você acha que, do jeito que está hoje, alguém pode ser acusado de abuso do poder econômico ou algo nesse sentido?
Samuel Castanheira – Pode, com certeza. Para ficar uma coisa mais concreta para entender, por exemplo, o impulsionamento de pré-candidaturas pela internet. Você pode fazer.
MN – Existe um limite?
Samuel Castanheira – A legislação não traça um limite objetivo de quanto você pode ou não. Existe uma orientação que a gente passa para o candidato. Como você não tem um CNPJ de candidato, então, obrigatoriamente, tem que fazer com o seu CPF. Essa é uma obrigação. Você não pode fazer impulsionamento no CPF de terceiro. Orientamos que a pessoa não gaste mais de 10% daquilo que ela pretende gastar numa campanha. Então, em números fáceis, se ela quiser gastar R$ 100 mil reais em toda a campanha, que ela não gaste mais de R$ 10 mil com impulsionamento na pré-candidatura.
MN – Mas a legislação não traz nenhum valor?
Samuel Castanheira – A lei não fala em valor, mas ela fala em gasto moderado. Então, ela não coloca um valor. Ela não coloca um valor específico, uma porcentagem. A orientação que a gente tem dado é essa. Para depois não falar que o advogado disse que podia e não podia. A gente fala em 10% no máximo, não gastar mais que isso.
MN – Quais tipos de abuso podem acontecer?
Samuel Castanheira – Existe o abuso do poder econômico, com a pessoa que gasta muito, e existe também o poder do abuso dos meios de comunicação. Tem também o abuso do poder político. A pessoa usar demais uma administração pública em prol da sua candidatura. Tem várias questões que têm que ser observadas. Aquele que está no cargo público tem várias condutas vedadas. A propaganda institucional não pode mais ser realizada três meses antes da eleição. Não pode contratar, nem dispensar sem justa causa. Não pode ir em uma inauguração de obra pública. Tem várias questões que têm que ser observadas, e esse é o trabalho que a gente faz.
MN – De que forma você orienta os candidatos em relação à boca de urna?
Samuel Castanheira – No dia da eleição, a minha orientação para todos os candidatos é fazer o seu voto ir para casa, curtir com a família e esperar o resultado da eleição. Não vai ser no dia que vai acontecer. Não vai ser um ou dois votos que vai mudar algo. Não vale o risco. Tem que evitar derrame de santinho. Primeiro, você não pode jogar papel na rua, entupindo todas as bocas de lobo. Já fazem bem menos do que antigamente, mas teve um período que você olhava pra rua e não dava pra ver o asfalto, nem a calçada, era só papel.
MN – Entre os pré-candidatos que estão hoje disputando o cargo de prefeito, tem algum que tenha algum impedimento?
Samuel Castanheira – Eu não tenho conhecimento. Acho que dessa vez, vai [disputar] todo mundo. Vamos tomar conhecimento disso até o dia 15 de agosto, quando é o prazo final para fazer registro de candidatura. Feito o registro, a gente vai entrar no sistema e vai pegar as certidões. Principalmente, as certidões de distribuição de ações. Porque ali você vai ver se tem alguma inelegibilidade. Feita essa análise, você vai ver se ele tem alguma ação que pode ensejar alguma questão de inelegibilidade.
MN – Se encontrar algo assim, o partido já pede a inelegibilidade?
Samuel Castanheira – O partido político, o candidato, pode impugnar esse registro. Ou o próprio Ministério Público ou os dois juntos. Normalmente, os partidos já entram assim que percebem. Precisa ver a estratégia do candidato. Às vezes é bom ter um candidato ali porque vai pegar o voto do outro adversário. Tem tudo isso na política. Como a minha parte é técnica, não é política, eu levo a possibilidade de impugnar determinado candidato.
MN – Tem muita judicialização antes e depois da eleição?
Samuel Castanheira – Tem muita judicialização. Vemos bastante rigor hoje da Justiça Eleitoral. Por isso que tem que andar muito na linha e ter uma boa assessoria jurídica, além de uma boa assessoria contábil também para fazer a prestação de contas. Tem que estar muito bem alinhado, pois os tribunais têm caçado bastante candidato. Não é pouco. Existia um ditado que a pessoa falava, “vale tudo, só não vale perder a eleição”. Hoje não é mais assim. Hoje existe uma preocupação maior, porque o tribunal está rigoroso mesmo.
MN – Você vai assessorar quantos candidatos? Você tem uma noção?
Samuel Castanheira – Só para prefeito acho que 10 ou 11.
MN – E juntando com vereador?
Samuel Castanheira – Aí são mais de 200.
MN – E quem dá mais trabalho? Vereador ou prefeito?
Samuel Castanheira – O problema não é quem dá mais trabalho, mas quem é mais visado. Sempre é o prefeito. É mais difícil um candidato para vereador brigar com o outro. Agora, na majoritária, é briga de foice.
MN – Como está hoje a situação das coligações?
Samuel Castanheira – Só para prefeito. O vereador não pode ter coligação. Antigamente você podia juntar vários partidos e fazer uma coligação para vereador. Você pegava vários partidos, juntava todos, via lá a quantidade de candidatos que poderiam ter e concorria com a coligação. A coligação, ela se encerrava no dia seguinte da eleição. Então ela perdurava até esse momento. Hoje, cada partido só pode lançar candidatos isolados para vereador. Na majoritária pode juntar.
MN – Quantos candidatos para vereador os partidos podem ter?
Samuel Castanheira – É a quantidade de vagas que tem na Câmara, mais um. Então, numa cidade pequena que são nove, você pode colocar 10 candidatos. É o máximo de candidatos que você pode colocar num partido político para concorrer à eleição do município. Aqui em Marília, com vagas 17, cada partido pode lançar 18 candidatos.
MN – Isso é para ter um equilíbrio?
Samuel Castanheira – Existe uma dificuldade muito grande de completar a chapa. Existe uma obrigação legal de 70% de um gênero, hoje não fala mais em sexo, mas precisa ter 70% de um gênero e 30% de outro. Normalmente faltam mulheres.
MN – Quantos votos você acredita que são necessários para um vereador se eleger?
Samuel Castanheira – O quociente eleitoral em Marília deve ficar de 6 mil a 7,5 mil votos. Um partido, para fazer uma cadeira, primeiro tem que ter isso [de votos]. Juntando todos os candidatos, tem que chegar a seis mil, sete mil votos. A partir daí, entre 1,2 mil e 1,7 mil votos para o candidato ter chance.
MN – Quantos votos você acha que precisa para um prefeito ganhar?
Samuel Castanheira – Para falar em um número desse, tem que imaginar o cenário pronto. Tem o João Pinheiro, Hadassa, Vinicius, Eduardo e Ricardinho. Nós estamos falando em cinco candidatos. Desses, quem realmente vai sair? As convenções vão acontecer até o dia 5 de agosto. Aí nós vamos ter um panorama muito mais claro do que vai acontecer nas eleições. Vai depender de quantos candidatos vai ter.
MN – Para vereador não existe mais a coligação, mas para prefeito ela segue sendo importante?
Samuel Castanheira – É difícil um prefeito sair com um partido só. O maior cabo eleitoral que o prefeito tem é o [candidato a] vereador. É uma quantidade grande de pessoas que vai ter um santinho na mão, entregando e pedindo voto. É o cara [candidato a vereador] que está pedindo para ele. Ele vai pedir com toda a força do mundo. Então, a quantidade de candidatos a vereador que você tem junto conta muito.
MN – Alguns candidatos estão tentando colar na imagem do Bolsonaro, mas você vê a eleição municipal parecida com a polarização nacional ou ela é diferente?
Samuel Castanheira – Não tem nada a ver. Na verdade, a eleição do Bolsonaro já foi uma eleição atípica, em geral. Quem era o Bolsonaro seis meses antes da eleição? Eu vejo que alguns surfaram nessa onda depois da eleição dele, mas hoje eu não acredito que seja a mesma coisa. Para mim, a eleição está bem diferente. Não vai ter muito a ver com o Bolsonaro. Eu acho que tem uma diferença muito grande entre as eleições municipais e nacionais.
MN – E qual é o caminho para ser eleito? Tem um segredo?
Samuel Castanheira – É um trabalho. A gente brinca que a nova campanha começa no dia seguinte da eleição. A campanha é de quatro anos. Tem um caso ou outro que cara surge do nada? Tem. O Bolsonaro teve um pouco disso.
MN – Hoje são 13 cadeiras e no próximo ano serão 17. Acredita que teremos renovação na Câmara?
Samuel Castanheira – Se você parar para analisar hoje, de todos os vereadores da Câmara, o Júnior Morais vai tentar para prefeito em Alvinlândia. O Rogerinho acho que não vai tentar para vereador. Tem o próprio Nascimento, que lançou candidatura para prefeito. Um chute meu: acho que uns sete ou oito voltam.
MN – Você acredita que a política mariliense é mais violenta que em outras cidades?
Samuel Castanheira – Em Marília, sempre foram muito violentas as eleições. Em 2008, foi a primeira eleição que eu fiz, do Bulgarelli. Marília teve mais ações judiciais do que o Estado inteiro do Mato Grosso. Eu lembro que fazia por dia assim, fácil, só de defesa, 15 ou 20 por dia. Eu não dormia. Acabou a eleição e eu troquei o toque do meu celular. Era o dia inteiro tocando meu celular. Era bizarro. Teve tiro, teve briga, teve paulada. Marília é uma cidade que tem muita briga, e muita briga judicial também. Para o advogado é bom, pois tem mais serviço. A minha linha não é essa, eu sou mais tranquilo.