Copom corta Selic em mais 0,5 ponto, para 11,25% ao ano, e sinaliza manter ritmo
O Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central decidiu nesta quarta-feira (31) por unanimidade reduzir em 0,5 ponto percentual a taxa básica de juros (Selic), para 11,25% ao ano, e manter a sinalização por cortes da mesma magnitude nas próximas reuniões.
Dessa forma, o comitê preserva o ritmo do afrouxamento monetário aplicado desde agosto do ano passado mesmo com a entrada no BC de mais dois diretores indicados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a pressão de parte do PT por uma redução maior.
Os novos diretores concordaram que cortes de 0,5 nas próximas reuniões são adequados para o ciclo de alívio na Selic. “Os membros do Comitê, unanimemente, […] avaliam que esse é o ritmo apropriado para manter a política monetária contracionista necessária para o processo desinflacionário”, afirma o texto.
Os novos diretores são Paulo Picchetti e Rodrigo Teixeira, que assumiram seus cargos no dia 2 deste mês e participaram do Copom pela primeira vez nesta semana. Os indicados por Lula no BC agora são quatro (considerando também Gabriel Galípolo e Ailton de Aquino Santos), de um total de 9 membros da diretoria o que inclui o presidente do BC, Roberto Campos Neto.
Entre os trechos que o Copom decidiu manter no texto divulgado nesta quarta, está aquele que defende que o governo persiga as metas para as contas públicas já apresentadas.
“Tendo em conta a importância da execução das metas fiscais já estabelecidas para a ancoragem das expectativas de inflação e, consequentemente, para a condução da política monetária, o Comitê reafirma a importância da firme persecução dessas metas”, afirma o texto, repetindo o trecho dos textos anteriores.
Entre as poucas novidades trazidas em relação ao comunicado de dezembro, o Copom acrescentou, ao analisar o ambiente externo, que a conjuntura atual é marcada pelo debate sobre o início da queda dos juros nas principais economias. Para o colegiado, o cenário ainda exige “cautela por parte de países emergentes”.
Apesar de manter as projeções para inflação em seus cenários de referência, em 3,5% em 2024 e 3,2% em 2025, o Copom modificou levemente as expectativas para os preços administrados de 4,5% para 4,2% em 2024 e de 3,6% para 3,8% em 2025.
O colegiado também acrescentou a expressão “em grau maior” ao se referir a 2025 quando analisa a capacidade de inflação ficar ao redor das metas. De acordo com o comunicado, a decisão desta quarta é compatível com a estratégia de convergência para o objetivo traçado para o ano de 2024 e, “em grau maior”, para o de 2025.
De qualquer forma, o Copom afirma que o país está em trajetória de desinflação. Ainda assim, aponta que permanecem fatores de risco como pressões inflacionárias globais e a resiliência na inflação de serviços.
“A conjuntura atual, caracterizada por um estágio do processo desinflacionário que tende a ser mais lento, expectativas de inflação com reancoragem apenas parcial e um cenário global desafiador, demanda serenidade e moderação na condução da política monetária. O Comitê reforça a necessidade de perseverar com uma política monetária contracionista até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas”, completa.
Analistas apontavam antes do encontro que um novo corte de 0,5 seria a medida adotada, considerando os indicadores recentes de inflação. De acordo com o boletim Focus, divulgado nesta terça-feira (30), o mercado espera que o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) termine 2024 em 3,81% na semana anterior, a previsão era de 3,86%.
O ciclo de alívio monetário começou após a taxa básica de juros ter passado por 12 altas consecutivas de março de 2021 a agosto de 2022, respondendo ao aumento nos preços de alimentos, energia e combustíveis. Depois disso, ela ficou congelada no patamar de 13,75% ao ano até agosto do ano passado.
A economista-chefe do Banco Inter, Rafaela Vitória, afirma que tanto o corte de 0,5 ponto percentual como o comunicado do Copom ficaram dentro do esperado. Uma janela para possível aceleração na redução da Selic, argumenta, havia acontecido em dezembro, quando os indicadores de inflação havia surpreendido positivamente. No entanto, mesmo naquele momento o comitê optou por um tom mais conservador.
“De lá para cá, a gente não viu novas surpresas de baixa para justificar a reabertura dessa discussão. Então o Banco Central está firme nesse plano de voo. Na minha opinião, é um ritmo conservador e cauteloso. O cenário é mais benigno tanto pela inflação de custos quanto as medidas subjacentes de serviços. E a gente ainda está com um patamar de Selic muito elevado em 11,25% ao ano”, afirmou.
A economista, por outro lado, acredita que essa postura conservadora pode abrir espaço para mais cortes no restante do ano. “Nesse ritmo mais cauteloso que o Banco Central vem adotando, vai ter um espaço maior para cortar ao longo do ano. Então os cortes de 0,5, na minha opinião, são mais de dois. E possivelmente a gente pode ter uma Selic abaixo do que o mercado espera”, completa.
Ela ainda discorda sobre o comunicado do Copom referente aos preços no exterior (de acordo com o texto, “núcleos de inflação permanecem em níveis elevados em diversos países”). A economista vê a situação melhor em relação aos meses anteriores, sem que isso possa atrapalhar os planos do comitê futuramente. Acrescenta, por outro lado, que um possível fator de risco para os preços internos podem ser eventuais estímulos do governo para impulsionar o consumo.
Já Luis Otávio Leal, economista-chefe da G5 Partners, chama a atenção para um comportamento “paradoxal” do Copom, que praticamente manteve os mesmos termos do comunicado de dezembro, mas mesmo assim coloca a perspectiva de duas reduções de 0,5 ponto percenual nos próximos dois encontros.
“Então, a coisa talvez mais paradoxal desse comunicado tenha sido que ele, [mesmo] mantendo tudo, ele dá uma informação nova. E eu acho que esse é o principal ponto, já era a grande questão se ele ia manter o plural [de cortes nas próximas reuniões, ou seja, ao menos duas] ou se não ia manter o plural”, afirma.
“Então, apesar de ele já ter meio que mapeado as próximas duas reuniões, não necessariamente a gente vai ter um trajeto sem percalços até as reuniões de março e maio. Principalmente entre março e maio”, completou.
Ele explica que esse intervalo vai ser importante, em primeiro lugar por causa das decisões de março e maio do FED, o banco central americano, que deve iniciar um ciclo de queda nos juros. Além disso, ele acrescenta que em março o governo vai precisar indicar se vai seguir perseguindo a meta de déficit zero, já que no fim daquele mês precisará anunciar (conforme determina a legislação fiscal) a necessidade de contingenciar ou não recursos durante o ano considerando as projeções atualizadas de receitas e despesas.
A nova queda nos juros é observada após o tema, em grande parte do ano passado, ser motivo de discórdia entre Lula e o BC. O mandatário desferiu diversos ataques contra Campos Neto, a quem chamou repetidas vezes de “cidadão”, se recusando a pronunciar seu nome, questionou suas intenções e disse que ele não tinha compromisso com o Brasil.
A situação começou a mudar após as primeiras reduções na taxa básica de juros. O primeiro encontro entre Lula e Campos Neto ocorreu apenas em setembro do ano passado, em uma reunião no Palácio do Planalto.
O momento que selou a pacificação aconteceu poucos dias antes do Natal, quando Campos Neto foi convidado e participou do churrasco de fim de ano de Lula, na residência oficial da Granja do Torto, com a presença de todos os ministros do governo.
Antes da decisão do comitê, no entanto, integrantes do partido de Lula, o PT, pressionavam o Copom para que efetuasse um corte mais arrojado na taxa de juros.
Em suas redes sociais, a presidente da legenda, deputada Gleisi Hoffmann (PT-PR), havia afirmado que o cenário econômico era favorável a uma redução maior e que 0,5 ponto percentual era “muito pouco”.
“O Brasil está pronto para retomar o crescimento com pujança, estimulado pelos investimentos do PAC, da Petrobras e da Nova Indústria Brasil, entre outros. Falta o BC fazer sua parte e começar a reduzir para valer a indecente taxa de juros”, escreveu a parlamentar.
“Cortar só 0,5 ponto da Selic outra vez, como antecipam a mídia e o mercado, é muito pouco. Está na hora de o BC pensar em suas responsabilidades com o país e fazer sua parte no esforço de reconstrução e crescimento”, afirmou.
Por Renato Machado