Caso Silvio Almeida vira munição para direita e tem divergência na esquerda
A demissão do ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, acusado de assédio sexual contra a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, virou munição para a direita, e o caso tem gerado divergências dentro do campo político da esquerda.
Bolsonaristas usam o episódio que culminou na demissão do ministro para criticar os adversários, inclusive o presidente Lula (PT), que soube do episódio pelo menos sete dias antes de as acusações serem tornadas públicas, como mostrou a Folha de S.Paulo. Dentro da própria esquerda, apesar de uma majoritária solidariedade a Anielle, houve nomes que defenderam Almeida.
Ele foi demitido por Lula na sexta-feira (6), um dia depois da publicação de reportagem do portal Metrópoles que apontou que uma das supostas vítimas de assédio sexual seria a titular da Igualdade Racial.
Após a divulgação das acusações, uma série de nomes da direita foi às redes sociais para criticar o ex-ministro, o governo Lula e a esquerda. A área dos direitos humanos era, no início do mandato petista, uma das principais apostas governistas, diante da má imagem, inclusive internacional, que o governo Jair Bolsonaro (PL) tinha nesse setor -o ex-mandatário tem histórico de declarações preconceituosas contra minorias.
O ex-presidente chamou o ex-auxiliar de Lula de “taradão da Esplanada” horas depois de o caso ser divulgado na quinta (5). Ele e seu filho senador, Flávio Bolsonaro (PL-RJ), compartilharam nas redes a manchete da notícia das acusações de assédio.
A ministra de Direitos Humanos do governo Bolsonaro e hoje senadora Damares Alves (Republicanos-DF), publicou um vídeo naquela mesma noite em apoio a Anielle e pediu a demissão de Almeida. O deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) falou em “hipocrisia” da esquerda; Carla Zambelli (PL-SP) ironizou o ministro “lacrador” do governo Lula; e Bia Kicis (PL-DF) aproveitou a oportunidade para criticar o movimento feminista.
O ex-ministro negou as acusações e usou inicialmente os canais institucionais do ministério do qual era titular para se defender. A iniciativa foi criticada por Lula. Nas redes sociais, Almeida postou um vídeo citando sua filha e classificou as acusações de falsas.
Uma nota publicada no site do ministério acusou, sem provas, a ONG Me Too, que atua na defesa de vítimas de violência sexual, de ter respaldado o caso de Anielle após tentar, e não conseguir, interferir na licitação do programa Disque 100 da pasta.
A Me Too nega e diz que apenas participou da elaboração do processo do Disque 100 como entidade da sociedade civil, fazendo sugestões e contribuições. O ex-ministro também entrou na Justiça para pedir explicações à entidade sobre o caso.
Após ser exonerado, Almeida disse ainda que não se demitiu, mas pediu para Lula demiti-lo, como forma de mostrar sua inocência. A maior parte da esquerda saiu em defesa de Anielle e criticou o ministro. Houve, no entanto, uma fissura entre os movimentos desse campo ideológico, com manifestações de apoio a Almeida.
O Instituto Luiz Gama, fundado pelo próprio ex-ministro, saiu em sua defesa e disse que o caso se tratou de uma articulação racista para derrubá-lo do cargo. “Se alguém tinha dúvida, agora não há mais. Há um movimento organizado por meio de mentiras para derrubar Silvio Almeida e tirá-lo a força do jogo político”, afirmou a instituição.
No vídeo que postou em suas redes, Almeida recebeu apoio, por exemplo, da cartunista Laerte que comentou: “Estamos com você”. Vice-presidente do PT e deputado federal, Washington Quaquá também defendeu o ex-ministro. “Mesmo se tivesse errado, mereceria de mim um perdão cristão”, disse.
Já a Coalizão Negra por Direitos, o Movimento Nacional de Direitos Humanos e o Mulheres Negras Decidem criticaram o ex-ministro e se solidarizaram com Anielle. Diversos ativistas afirmaram nas redes sociais que o caso representa uma derrota geral para a esquerda e para os movimentos negro, das mulheres e dos direitos humanos.
A ministra da Igualdade Racial publicou nota na sexta-feira na qual pediu respeito a sua privacidade e disse que contribuirá “com as apurações, sempre que acionada”.
Almeida assumiu o Ministério dos Direitos Humanos com um discurso elogiado durante sua posse, em que, inclusive, citou Anielle. No cargo, reativou a Comissão de Anistia e impulsionou programas e projetos em defesa da memória da escravidão e reparação à população negra.
Em um de seus últimos atos, recriou a Comissão de Mortos e Desaparecidos da Ditadura. Contudo, viu Lula vetar eventos a respeito do regime militar neste ano, em razão do aniversário de 60 anos do golpe, ocorrido em março.
Esther Dweck, ministra da Gestão e Inovação em Serviços Públicos, foi nomeada como ministra interina. À Folha ela afirmou que se reunirá com a equipe pela primeira vez nesta segunda-feira (9). “Minha expectativa é que seja temporário, até ter um nome definitivo”, disse.
Após a demissão, a secretária-executiva do Ministério dos Direitos Humanos pediu para ser exonerada. Rita Cristina de Oliveira ocupava o cargo desde o início do governo e era uma das principais aliadas de Almeida.
POR JOÃO GABRIEL