‘Boate azul’ na beira do Mar da Galileia
Com exceção das luzes de Madri, vistas do aeroporto ‘Aeroporto Adolfo Suárez’, o primeiro cenário internacional que bati meus olhos foi o Mar da Galileia, em Israel, no final de outubro de 2022. Assim que entrei no quarto do hotel ‘Rei Salomão’, em Tiberíades, cidade com quase 40 mil habitantes, corri à sacada e me deparei com as águas que dois mil anos atrás molharam o Verbo. Olhei o seu contorno, identificando o ponto de encontro da areia e da água.
Naquela praia de água doce, Cristo iniciaria o seu ministério, escolheria sete dos seus 12 apóstolos – que eram pescadores de profissão, incluindo Pedro, o 1º papa – e andaria sobre as ondas revoltosas em noite de Evangelho e ensinamentos.
Fiquei, como se diz lá na minha terra natal, pasmado, com a mente indo longe, para um canto bem remoto. Me veio aquela música formidável que a dupla Duduca e Dalvan (letra e composição de José Spera, Manoelito Nunes e Mizael), ‘Rastros na areia’. Certamente, a areia citada no sonho da música era a da praia daquele formidável lago chamado Mar da Galileia.
No outro dia, contornamos aquele cenário inconfundível que até então eu só via através das letras dos Evangelhos contidos na Bíblia Sagrada. Passamos pela extinta Magdala, onde vivia a apóstola Maria Madalena, e entramos num kibutz que permite o passeio de barca. Singrar as águas que alimentaram de fé e esperança o povo da Galileia, em primeiro, e o mundo todo, mais tarde, consistiu num dos mais significativos momentos da minha existência.
O lago é calmo, e sua tranquilidade transcende para o nosso espírito, que, no meu caso, se sentiu acolhido.
A viagem seguiu seu curso. Conhecemos, depois, Haifa, nas margens do Mar Mediterrâneo. O Monte Carmelo, de onde Deus levou em uma carruagem o severo e autêntico profeta Elias, foi outro ponto emocionante.
A gruta onde Elias viveu é hoje a bela igreja católica de Stella Maris. Na minha primeira passagem por Haifa, logo na porta de entrada para a igreja que abriga a gruta do profeta, enquanto conversava em português com minha amiga jornalista Carolina Godoy – que se formou comigo na Unimar, em 2000, e por quase dez anos dividiu comigo a mesma redação – uma freira sorriu e veio conversar conosco.
Era a irmã Hellen, brasileira da Ordem Carmelita em missão pela França e enviada para Israel com a proposta de auxiliar no monastério de Stella Maris. Irmã Hellen, assim como eu e a Carol, também saiu do Interior de São Paulo.
E veio do Interior, da moda caipira, a música que, na segunda estada em Tiberíades, três semanas após a primeira passagem por lá, interpretei no karaokê das nações unidas, ONU.
Como no hotel havia caravanas do mundo todo: dos Estados Unidos à Coreia do Sul, cada grupo que subia no palco cantava uma música de sua origem. Virei para o pessoal da imersão e disse: “Vou lá cantar ‘Boate Azul’!”. E não deu outra, digitei a música no YouTube do DJ e, pronto: “Doente de amor, procurei remédio na vida noturna…”
Quando olho, os americanos dançando de um lado e o pessoal da Coreia dançando do outro. Como estava agradando, ao terminar, o jeito foi logo pedir para cantar uma segunda uma moda brasileira-raiz: “Garçom”, de Reginaldo Rossi!
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Ramon Barbosa Franco é escritor e jornalista, autor dos livros ‘Canavial, os vivos e os mortos’ (La Musetta Editoriais), ‘A próxima Colombina’ (Carlini & Caniato), ‘Contos do japim’ (Carlini & Caniato), ‘Vargas, um legado político’ (Carlini & Caniato), ‘Laurinda Frade, receitas da vida’ (Poiesis Editora) e das HQs ‘Radius’ (LM Comics), ‘Os canônicos’ (LM Comics) e ‘Onde nasce a Luz’ (Unimar – Universidade de Marília), ramonimprensa@gmail.com