Assuntos que nos chegam da Argentina
Conheço um motorista que semana sim e semana não está na Argentina a trabalho. Ele mora no meu bairro e, quando no sábado ou domingo pela manhã saio para comprar pão, consigo trombar com ele na rua mexendo no caminhão, acabo sempre perguntando: “E a Argentina, como estava por esses dias?” Aí ele me relata algo que viveu por lá na sua última passagem.
São relatos de estradas ou das filas de espera nas aduaneiras das terras de Lionel Messi e de Rodolfo Walsh.
Duas recentes notícias que a imprensa brasileira trouxe da Argentina me fizeram refletir por esses dias. A primeira trata-se de uma pesquisa sobre o exercício do Jornalismo profissional durante o período da pandemia de Covid-19. Este levantamento foi desenvolvido pela Associação de Entidades Jornalísticas Argentina (Adepa) em coautoria com a ONG Info Ciudadana, que desde 2011 trabalha com investigação jornalística, estudos técnicos e capacitação dos profissionais da Imprensa.
Em reportagem publicada pela edição da Folha de S. Paulo do dia 25 de abril de 2023, a jornalista Júlia Barbon escreveu que “ao mesmo tempo em que lidava com uma demanda de informações e um ritmo de produção sem precedentes, [o jornalismo profissional] sofria uma súbita queda de investimentos, uma piora nas condições de trabalho e importante reestruturação na forma de atuar virtualmente”.
Ainda vivemos o pós-Covid e, em determinadas categorias, a reestruturação do novo normal vem passando por uma reformulação, no mínimo, sofrível.
Observo que na imprensa e no jornalismo profissional estão nesta adaptação, tanto na crise de identidade com o público quanto nas novas práticas que incorrem em uma nova dinâmica dos operários da notícia.
“Transformações e Aprendizados dos Meios de Comunicação Ibero-Americanos no Pós-Pandemia” é um relatório com 170 páginas. Informa que na maioria dos países da América Latina, incluindo o próprio Brasil, os jornalistas profissionais foram reconhecidos como trabalhadores essenciais, ainda assim essa condição não significou a qualificação da atividade como de risco – embora repórteres, cinegrafistas e jornalistas que cobriram a pandemia foram expostos ao coronavírus.
A pesquisa evidencia o compromisso dos jornalistas com a cobertura dos fatos – ainda que trágicos e tristes – e aponta em sua conclusão, que apesar de todas as adversidades, o jornalismo profissional foi a principal fonte de informação dos latino-americanos durante a pandemia.
O outro assunto que vem da terra do tango, de Astor Piazzolla e de Jorge Luís Borges, é a utilização de inteligência artificial na fábrica da Ford, em Pacheco.
Se o chatbot ameaçava os jornalistas e poetas escrevendo textos e poesias, agora os metalúrgicos e mecânicos estão na sua mira: até parafuso das novas Rangers os robôs “inteligentes” andam apertando por lá. É como diz um velho e sábio ditado brasileiro: se isso já está acontecendo no nosso vizinho, é melhor “colocarmos as nossas barbas de molho”.
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Ramon Barbosa Franco é escritor e jornalista, autor dos livros ‘Canavial, os vivos e os mortos’ (La Musetta Editoriais), ‘A próxima Colombina’ (Carlini & Caniato), ‘Contos do japim’ (Carlini & Caniato), ‘Vargas, um legado político’ (Carlini & Caniato), ‘Laurinda Frade, receitas da vida’ (Poiesis Editora) e das HQs ‘Radius’ (LM Comics), ‘Os canônicos’ (LM Comics) e ‘Onde nasce a Luz’ (Unimar – Universidade de Marília), ramonimprensa@gmail.com