Após cem anos, Jogos voltam a Paris com reforço na segurança, Coubertin e gols
Palco dos Jogos Olímpicos de 1900 e de 1924, Paris deu na tarde de quarta-feira (24) início a mais uma edição do que hoje é um megaevento esportivo. Cem anos após uma competição marcante -que teve Tarzan na água, finlandeses voadores e a primeira cerimônia de encerramento próxima aos moldes atuais-, a capital francesa é novamente também a capital esportiva do planeta.
A festa de abertura está marcada para sexta (26), mas o futebol e o rúgbi, para haver tempo de conclusão até a celebração final, tiveram início dois dias antes. Os primeiros jogos foram da chave masculina de futebol, às 15h locais, Argentina x Marrocos e Uzbequistão x Espanha, mas só o segundo foi de fato em Paris- o primeiro foi realizado em Saint-Etiénne, a mais de 500 km.
E a partida que marcou a volta das Olimpíadas à cidade-luz teve muita preocupação com segurança, o que não chegou a surpreender. As medidas contra o terrorismo são um ponto tratado como prioritário pela organização, e o policiamento era ostensivo no entorno do estádio Parque dos Príncipes.
“Não está aberto, não está liberado, não importa”, resmungou um policial, ignorando a credencial da reportagem e dizendo que o acesso ao estádio ainda não era permitido, cerca de duas horas antes do apito inicial. Um voluntário, então, indicou um caminho possível, onde a entrada foi autorizada, após minuciosa revista, com máquinas de raio-X.
A França tem um vasto histórico de atentados terroristas, e o habitual temor das autoridades se multiplicou com a realização do megaevento. Na última terça (23), a polícia prendeu na região de Bordeaux um homem de 18 anos, acusado de ter arquitetado ataques. Prendeu também um russo, cuja idade não foi divulgada, suspeito de ter “planos para desestabilizar os Jogos”.
O jogo de abertura se desenrolou sem o registro de maiores incidentes. Quem conseguiu passar com antecedência pelos procedimentos de segurança e entrou no estádio uma hora antes de a bola rolar viu uma apresentação no telão que recordava o histórico olímpico de Paris. Em campo, havia um homem fantasiado de Pierre de Coubertin, parisiense que criou os Jogos Olímpicos da era moderna.
Fundador do COI (Comitê Olímpico Internacional) no fim do século 19, o Barão de Coubertin o presidiu até 1925 e esteve à frente dos Jogos de 1924. Na ocasião, uma das estrelas foi Johnny Weissmuller, que defendeu os Estados Unidos e conquistou três medalhas de ouro na natação e uma de bronze no polo aquático. Depois, virou estrela também no cinema, como Tarzan.
Aquela edição teve ainda uma geração de corredores conhecidos como os “finlandeses voadores”, liderados por Paavo Nurmi, que conquistou cinco ouros. O grande nome local foi o elegante esgrimista Roger Ducret, que levou três ouros e duas pratas, em um evento que marcou a história olímpica e foi um sucesso de público, com 600 mil ingressos vendidos.
Desta vez, os candidatos a destaque dos Jogos são nomes como Noah Lyles, Simone Biles e Armand Duplantis. Mas, antes que eles entrem ação, Paris reviu Coubertin e viu jovens do Uzbequistão e da Espanha ainda pouco conhecidos o futebol olímpico é majoritariamente sub-23, ainda que cada time possa ter três atletas sem limite de idade.
A seleção espanhola não conta com Lamine Yamal, 17, e Nico Williams, 22, os excelentes garotos que foram importantes na recente conquista da Eurocopa. “Com eles, seria fácil demais”, brincou o torcedor José Maria Poyatos, que se animou ao perceber que o interlocutor era brasileiro. “O Brasil não se classificou? Aí, fica mais tranquilo. Os árbitros são muito amigos de vocês.
Nas arquibancadas do Parque dos Príncipes, porém, quem fez barulho foi a torcida do Uzbequistão, munida de instrumentos de percussão, que entoava incansavelmente “O’z-be-kis-ton”. E o time, que obteve em maio o vice-campeonato da Copa da Ásia sub-23, criou muitos problemas aos favoritos, com uma marcação agressiva.
Mas a Espanha acabou sobressaindo. Abriu o placar em finalização de Marc Pubill e levou o empate no fim do primeiro tempo, em pênalti assinalado com a ajuda do vídeo e convertido por Eldor Shomurodov.
Na etapa final, a equipe europeia chegou a desperdiçar um pênalti, com Sergio Gómez, que se recuperou em seguida e marcou o gol da vitória por 2 a 1.
Os torcedores uzbeques lamentaram a bola na rede, mas não se calaram. Continuaram sua festa e chegaram a se juntar aos espanhóis e ao público neutro em uma “ola” que deu repetidas voltas no estádio -não lotado, mas também não distante de sua capacidade máxima, de 48 mil espectadores- e tirou sorrisos do presidente da Fifa (Federação Internacional de Futebol), Gianni Infantino.
Após um século, os Jogos Olímpicos estão de volta a Paris.
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POR MARCOS GUEDES