Com contratos de R$ 13,2 mi, terceirizada acumula atrasos e críticas
R$ 13,2 milhões é o valor de dois contratos vigentes do município com o Instituto de Apoio à Pessoa com Deficiência e à Inclusão Social (Iape), responsável por prestar serviços de apoio a alunos com deficiência nas escolas públicas de Marília. Apesar do montante milionário, a empresa é alvo constante de reclamações por parte dos funcionários, principalmente, das cuidadoras, em relação a frequentes atrasos nos salários e outros direitos trabalhistas. O problema tem se repetido desde o início do primeiro contrato com a Prefeitura de Marília, firmado em 2021.
Inicialmente, a Prefeitura de Marília contratou o Iape em 2021, por R$ 5.332.971,60. Este primeiro contrato hoje já conta com oito aditivos e segue vigente. Em 14 de junho de 2021, ele chegou a ser suspenso, por causa da pandemia da Covid-19, mas foi retomado em 16 de agosto do mesmo ano. O documento ainda foi prorrogado até 5 de março de 2023 e sofreu um acréscimo de 25% no valor. Posteriormente, mais um reajuste de 11,3% foi registrado.
Entre os aditivos do contrato, houve ainda a alteração na descrição dos quantitativos, passando o total para 90 cuidadores numa escala de 6h e outros 110 atuando por 8h. Também houve mais uma prorrogação de contrato, inicialmente até 5 de março de 2024, e agora outra até 5 de março de 2025.
Além do primeiro contrato com o município, que vai totalizar R$ 6.666.214,50 com os oito aditivos, o Iape ganhou uma nova concorrência, que atualmente também está em período de vigência no valor de R$ 6.552.994,80, em parcelas de R$ 546.082,90. Desta vez, o documento foi assinado no dia 26 de janeiro deste ano e segue em vigor até 26 de janeiro de 2025.
No total acumulado com os dois contratos, o valor movimentado pela empresa junto ao Executivo municipal soma R$ 13.219.209,30. O motivo para o segundo contrato, segundo a Prefeitura, foi o aumento na demanda pelos cuidadores.
Apesar a alta quantia destinada pelo município para a prestação do serviço, os funcionários não estão satisfeitos. Entre os relatos mais recentes, uma funcionária da empresa – que atua desde o início do ano – compartilhou sua frustração com a situação profissional na qual se encontra. Segundo a mulher, que prefere não se identificar, os atrasos de pagamento são recorrentes, tanto no salário quanto no vale-alimentação. Além disso, a comunicação da empresa com os trabalhadores não seria eficiente.
“Desde que entrei na empresa, já atrasaram várias vezes o pagamento e o vale-alimentação. Quando precisamos faltar por motivo de saúde, apresentando atestado médico, eles não pagam o valor referente ao vale-alimentação e nos penalizam. Também prometeram seguro de vida e plano odontológico, mas até agora nada. Fizeram fotos para os nossos crachás, mas não recebemos. O FGTS não está sendo depositado, sendo que cada pessoa recebe um salário diferente ”, desabafa a cuidadora.
As dificuldades enfrentadas pelos funcionários se intensificam durante os períodos de recesso, quando, segundo a trabalhadora, os pagamentos são inferiores aos valores repassados pela Prefeitura de Marília e muitas vezes parcelados. Ela também relata a falta de suporte emocional, de treinamento e de apoio da empresa, com um ambiente de trabalho marcado por grosserias e descaso, o que tem levado muitas cuidadoras a desistirem do emprego.
“Nós estamos lutando pelos direitos das crianças, mas não temos o reconhecimento da empresa e nem da Prefeitura de Marília”, destaca.
A situação de precariedade relatada pelas cuidadoras gerou reações na Câmara dos Vereadores em agosto deste ano. Uma audiência pública chegou a ser convocada para discutir os atrasos salariais e a falta de cumprimento das obrigações trabalhistas por parte do Iape.
Mesmo com reuniões e audiências realizadas, os problemas estariam persistindo, o que traz insegurança tanto para os funcionários quanto para os alunos que dependem do apoio nas escolas.
Além dos atrasos salariais, as cuidadoras relatam que a empresa não oferece as condições adequadas para a execução dos serviços. Segundo o contrato, o Iape seria responsável pela seleção de cuidadores capacitados, fornecimento de uniformes, materiais de trabalho e gestão das questões trabalhistas.
No entanto, o relato das cuidadoras revela que esses pontos não vêm sendo cumpridos adequadamente, o que certamente reflete na qualidade do serviço prestado e no bem-estar dos alunos.
O MN registrou reclamações das cuidadoras em janeiro, março, julho, agosto e dezembro de 2022, bem como em abril de 2023.
CONTRATOS
Os acordos entre a Prefeitura de Marília e o Iape são dois contratos para a prestação de serviços de apoio a alunos com deficiência matriculados nas escolas da rede municipal de ensino. O objetivo seria garantir o acesso, a participação e o aprendizado desses alunos, considerando suas necessidades educacionais especiais.
Os serviços oferecidos pelo Iape devem incluir o apoio aos alunos com limitações motoras que enfrentam dificuldades no autocuidado, com cuidadores atuando por 6h ou 8h em creches, pré-escolas e escolas de ensino fundamental; auxílio no acesso ao espaço físico escolar, adaptação de materiais e currículos e promoção de um ambiente inclusivo; e o acompanhamento dos alunos em aulas e atividades extras, quando necessário.
Os contratos indicam a seleção de pessoal capacitado para atuar como cuidadores, com idade mínima de 18 anos, responsabilidade, equilíbrio emocional e habilidades para lidar com as necessidades dos alunos. A empresa também se responsabiliza pela supervisão dos serviços, fornecimento de uniformes e materiais, e gestão de questões trabalhistas e previdenciárias.
O valor global do último contrato vigente é de R$ 6.552.994,80, em parcelas de R$ 546.082,90, para um período de 12 meses, com pagamentos mensais efetuados pela Prefeitura. O primeiro contrato, também vigente, totaliza R$ 6.666.214,50.
De acordo com a administração municipal, a empresa deve apresentar relatórios mensais sobre os serviços prestados e participar de reuniões com a equipe escolar e os pais dos alunos, quando solicitado.
OUTRO LADO
A Prefeitura de Marília informou que o pagamento para a empresa está em dia, o que não justificaria os atrasos da empresa. Também destacou que, devido ao aumento da demanda, o número estabelecido na primeira licitação chegou ao limite de 25% a mais da solicitação máxima inicial, por isso, teria sido feita a solicitação de uma nova licitação.
De acordo com o Poder Executivo, atualmente são 346 funcionários contratados pela terceirizada. “Todos os postos são acompanhados pelas unidades escolares e pelo setor, inclusive com a definição nominal de quais crianças serão atendidas”, afirma em nota.
A Prefeitura diz ainda que a avaliação dos trabalhos é feita constantemente e que Marília conta com 1.066 crianças sendo atendidas.
O Marília Notícia questionou também se as reclamações poderiam significar quebra de contrato, se os problemas poderiam refletir na qualidade do serviço prestado e se a Prefeitura de Marília estava satisfeita com o Iape, mas ainda não obteve retorno sobre essas perguntas.
O MN também procurou o Iape para se pronunciar sobre as reclamações dos cuidadores, mas até a conclusão desta reportagem, o Instituto não havia retornado. Se houver pronunciamento, o texto será atualizado.
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