Prefeitura herda dívida de R$ 35,5 milhões do Daem pós-concessão
Transformado em agência reguladora, o antigo Departamento de Água e Esgoto de Marília (Daem) mudou de nome e de atribuição após a concessão dos serviços de saneamento básico. Apesar disso, suas dívidas continuam pendentes.
São pelo menos R$ 35,5 milhões a serem quitados, segundo os dados do 1º trimestre deste ano do Sistema de Análise da Dívida Pública, Operações de Crédito e Garantias da União, Estados e Municípios (Sadipem) do Tesouro Nacional.
Quase todo montante – R$ 34,2 milhões – é referente ao reparcelamento de empréstimo não quitado pela então autarquia com a CPFL Paulista. O valor aprovado pela Câmara Municipal em 2021 foi de R$ 12 milhões. O restante é de juros.
A diferença de R$ 1,3 milhão é de precatórios. A dívida do Daem aparece na conta da Prefeitura de Marília. O órgão sucessor, a Agência Municipal de Água e Esgoto de Marília (Amae) é vinculada ao município.
PREVISÃO LEGAL
A “herança” da dívida do Daem já estava prevista na Lei Complementar 938 de 21 de julho de 2022 que instituiu a política municipal de saneamento básico, autorizou a concessão do abastecimento de água e tratamento de esgoto e criou a Amae.
“Todos os créditos e débitos, incluindo o objeto de ações judiciais, anteriores à concessão, pertencentes ao Daem, será de titularidade da agência reguladora”, diz o parágrafo quinto do artigo 47.
Este dispositivo retira da nova concessionária, a RIC Ambiental, em serviço desde 9 de setembro, obrigações financeiras que não sejam aquelas assumidas a partir desta data, ainda segundo a legislação vigente.
DESPESAS DE PESSOAL
Além das dívidas com empréstimos e precatórios, a Prefeitura de Marília também segue responsável pela folha salarial dos servidores remanescentes do Daem e das despesas decorrentes do plano de demissão voluntária.
Segundo decreto que regulamentou o desligamento dos servidores da antiga autarquia, o município se dispõe a pagar indenização do quádruplo da remuneração mensal permanente do cargo efetivo, mais progressões de mérito, promoções e demais valores por decisão judicial.
Até o momento, menos de dez entre mais de 300 servidores agora lotados na Amae aderiram ao programa de demissão voluntária. A maioria das movimentações é de remanejamento para órgãos da administração municipal.
ROMBO BILIONÁRIO
As dívidas remanescentes do Daem são apenas a ponta do iceberg para um volume bilionário de dívidas que a nova chefia do Executivo vai herdar para administrar em seus quatro anos de mandato (2025-2028).
O rombo atual das contas públicas da cidade é de, pelo menos, R$ 1.376.066.488,44, ainda segundo Sadipem. Apesar do valor, a situação da cidade é classificada como “regular” pelo órgão vinculado ao Tesouro Nacional.
No entanto, já representa um impacto de 76% no orçamento municipal previsto de R$ 1,7 bilhão para 2025. O endividamento do município sufoca sua capacidade de investimentos inclusive para as muitas promessas de campanha que foram anunciadas pelas candidaturas.
SERVIDORES
Maior empregadora da cidade com 5.382 servidores ativos, segundo dados de setembro do Portal da Transparência, a Prefeitura de Marília deve mais de R$ 1 bilhão ao seu próprio funcionalismo, inclusos os inativos.
São R$ 557,2 milhões em seis parcelamentos previdenciários e mais R$ 542 milhões em dívidas “não contratuais”, referentes ao passivo atuarial, cujo cálculo varia todo ano, mas pesa em mais de 50% da dívida com o instituto previdenciário municipal.
O parcelamento mais antigo é de fevereiro de 2000, da gestão de Abelardo Camarinha (Podemos), através de confissão de dívida de R$ 9,8 milhões, cujo saldo devedor atual é de R$ 13,5 milhões, segundo Sadipem.
Todos os demais parcelamentos e reparcelamentos ocorreram desde 2017, já na primeira gestão de Daniel Alonso (PL). Sucessor de Vinicius Camarinha (PSDB), Alonso parcelou R$ 175 milhões não pagos até então pela Prefeitura. A dívida previdenciária do município seria ‘”rolada” pelo prefeito em 2020, 2021 e 2023.
EMPRÉSTIMOS
Ainda segundo o Sadipem, Marília deve R$ 41 milhões conforme consta de saldo devedor atual de R$ 61,3 milhões em empréstimos bancários com a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil desde 2018.
Os R$ 36 milhões ainda pendentes com a Caixa, por exemplo, foram obtidos pelo programa de crédito para Financiamento à Infraestrutura e ao Saneamento (Finisa) para obras de pavimentação e de reformas em parques e praças.
Os empréstimos a serem quitados pela próxima gestão demandaram autorização por ampla maioria dos vereadores da Câmara Municipal de Marília, onde Daniel Alonso tem ampla base de governo desde 2017.
PRECATÓRIOS
O Sadipem informa ainda pendências de Marília com precatórios em R$ 124,7 milhões. Trata-se de dívidas transitadas em julgado na Justiça, requeridas por pessoas físicas e jurídicas, mas ainda não pagas.
Em 2009, já na segunda gestão de Mário Bulgareli, a Prefeitura de Marília acumulava R$ 74 milhões em precatórios que, não pagos, hoje somam R$ 115,5 milhões em valores corrigidos até fevereiro de 2024.
Outros quatro registros de precatórios de 2023, na segunda gestão a Alonso, somam R$ 8,9 milhões, em valores corrigidos. A única exceção de pagamento é de outro registro, de 2018, no primeiro mandato do atual prefeito.
Na ocasião, Alonso parcelou precatórios da Empresa Municipal de Mobilidade Urbana de Marília (Emdurb) em 72 vezes após decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP). Faltam ser pagos apenas R$ 255,8 mil de R$ 2,5 milhões.