Harmonia ou caricatura? O dilema do rejuvenescimento facial na era moderna
Ah, o tempo, esse artesão silencioso que esculpe nossos rostos com mãos invisíveis. Na era dos espelhos digitais, onde cada imagem capturada reflete não só a face, mas também as aspirações e inseguranças de um tempo que se vê a si mesmo, o rejuvenescimento facial tornou-se um ofício de urgências. Vivemos uma época em que o rosto, essa nossa máscara diária, é submetido a intervenções que prometem harmonia, mas por vezes nos devolvem caricaturas de nós mesmos.
Andando pelas ruas, percebo uma inquietação que beira a confusão: sorrisos que já não brilham como antes, mas que agora se destacam pela exagerada volumetria de lábios, moldados mais pelo desejo de pertencer a um ideal do que pelo respeito à natureza de quem os possui. Aquela moça linda cuja boca, que antes era pequena, mas encantadora, surge agora inflada ao exagero, não parecendo algo de Deus. E quem a ostenta, sem perceber a dissonância, nem percebe que beira o ridículo. Para que tão grande? Moda!
A flacidez, que deveria ser tratada com cuidado, é enfrentada com o excesso, com a promessa ilusória de uma tal “harmonização facial”. Ah, que ironia… Harmonia vendida em frascos, injetada como quem segue uma receita de bolo, ignorando o fato de que cada rosto é único, cada linha é a assinatura de uma vida. O que é harmônico para um, pode ser dissonante para outro. E assim, vemos rostos inchados, maçãs proeminentes, bocas, queixos e mandíbulas que, embora livres de rugas, carregam o peso de um estranhamento que não se esconde.
Não sou contra preenchimento de face, pelo contrário, faço há 20 anos e adoro, mas tem um ponto que flacidez precisa de algo mais. Se leve, aparelhos, minilifting. Se mais avançada, por que não um lifting? Cirurgia que se bem planejada e executada, faz um resgate do indivíduo. Adoro ouvir meus pacientes contarem sobre o reencontro que tiveram com seu eu do passado há muito esquecido. É indescritível esta sensação seja a do paciente, seja a minha.
Como sempre digo:
“Nada tem o poder de rejuvenescer com naturalidade do que um lifting bem planejado e executado.”
E as sequelas, ah, as sequelas… São os fantasmas que caminham ao lado dessas promessas de rejuvenescimento. Sequelas que, às vezes, nos tomam horas, dias, para serem reparadas, (quando isto é possível) numa batalha contra o tempo e contra o malsucedido. Há poucos dias, passei longas nove horas corrigindo os estragos de procedimentos não muito felizes na “papada” de uma paciente. Felizmente, o lifting ficou ótimo, mas a que custo?
Não deveria ser assim, é assustador. Brinco que a cada dia, os faces parecem um lixão na Baía de Guanabara. Impressionante o que encontro nas cirurgias, o que torna tudo mais difícil e perigoso.
Sempre digo aos meus pacientes que é preferível ter rugas do que perder a expressão, aquela centelha de vida que se revela no olhar. A expressão, sim, essa é a minha verdadeira busca. Não se trata de apagar os sinais do tempo, mas de iluminar o que há de belo na vida que ainda pulsa no rosto. Remover a dor, o cansaço, a tristeza, e deixar que a face se mostre mais alegre, jovem, simpática e… orgânica.
Cada rosto pede um cuidado diferente, um olhar atento e sensível que saiba escolher o melhor caminho, o tratamento mais adequado para aquele momento.
É essencial que os pacientes tenham noção de que tudo isto não é uma coisa simples e que nosso rosto é nosso cartão de visita e contém a “seda” mais preciosa do mundo. Não é só porque uma pessoa tem acesso a “tesoura agulha e linha” que daria minha seda pura para ela.
Quem sabe, no futuro, possamos olhar para trás e ver que superamos esses tempos de sombras e confusão, caminhando para uma era em que a beleza seja, antes de tudo, uma expressão autêntica da vida que vivemos.
Não deixe de conferir as próximas matérias desta coluna onde falarei sobre cada aspecto deste fascinante assunto – Rejuvenescimento facial.
A próxima será sobre lifting facial.
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A médica Érika Malheiros Bastos (CRM 90590-SP/RQE 64165) é especialista em cirurgia plástica. É formada pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), a médica é pós-graduada com mestrado e doutorado pela mesma instituição. É membro titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP), membro da International Society of Aesthetic Plastic Surgery (ISAPS) e da American Society of Plastic Surgeons (ASPS).
Érika comanda a Clínica-Hospital Dia Érika Malheiros – especializada em cirurgia plástica –, que funciona na rua Luís Pereira Barreto, 300, no Jardim Maria Izabel, zona leste.