Datena se lança a prefeito de São Paulo e aprofunda incertezas do PSDB
Conhecido pelo histórico de desistências na política, o apresentador José Luiz Datena foi lançado pré-candidato a prefeito de São Paulo pelo PSDB nesta quinta-feira (13) sob ceticismo do próprio partido, o 11º ao qual se filiou, e o risco de aprofundar divisões numa legenda fragilizada em várias frentes.
“Desta vez, eu vou até o fim”, prometeu ele, que já desistiu de concorrer na última hora em quatro eleições.
O lançamento, realizado em um hotel na região central da capital, reuniu figuras do tucanato que resistiram aos abalos na sigla nos últimos anos. O jornalista entrou no partido em abril, inicialmente para ser vice de Tabata Amaral (PSB). Antes, em um intervalo de menos de um ano, passou por PDT e PSB.
Datena fez um discurso em que se disse agora mais consciente de sua responsabilidade do que das vezes anteriores em que flertou com uma candidatura, pregou o “expurgo de bandidos misturados com a administração” e disse que fará campanha sem colete à prova de bala, mas “com peito aberto”.
Ele fez críticas indiretas a Ricardo Nunes (MDB), citando problemas da cidade e o que chamou de infiltração do crime organizado, especificamente o PCC, na gestão. “Se me deixarem de cadeira de rodas, eu ganho a campanha”, afirmou, insinuando contrariedade da facção com sua candidatura.
As falas no evento definiram o lançamento como um marco do renascimento do PSDB, avesso à polarização e disposto a recuperar protagonismo. Afirmações como a de que Datena chega “para o funeral” foram rebatidas. Ele próprio disse que falar em fragilidade é desconhecer a história do partido.
O jornalista, que apresenta o programa “Brasil Urgente”, da Band, reiterou ao público e aos correligionários que desta vez não desistirá de se candidatar, mas a incerteza sobre a decisão do jornalista é admitida nos bastidores do PSDB, que avalia internamente cenários sem o pré-candidato.
Além da aliança com Tabata, defendido por uma ala, a opção é embarcar na campanha à reeleição de Nunes, caminho que também está longe de ser unanimidade entre as diferentes correntes que ocupam as direções municipal e nacional.
A equação envolve ainda o Cidadania, partido que compõe uma federação com o PSDB e precisa estar alinhado a qualquer um dos movimentos.
Se fosse seguida a lógica de 2020, o PSDB apoiaria Nunes, já que ele era o vice na chapa de Bruno Covas.
Com a morte do tucano, em 2020, o emedebista assumiu a cadeira. Ele usa como estratégia o discurso de que sua gestão é de continuidade da administração Covas, mas sofreu rejeição de parte dos antigos correligionários, sobretudo por sua aproximação com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Datena apareceu com 8% de intenção de voto na pesquisa mais recente do Datafolha, divulgada em 29 de maio, atrás de Guilherme Boulos (PSOL), que marcou 24%, e Nunes, com 23%. O apresentador ficou empatado com Tabata, também preferida por 8% do eleitorado, e Pablo Marçal (PRTB), com 7%.
O pré-candidato tucano fez piada com seu passado de recuos. “Sou o político mais vitorioso da história, eu não perdi nenhuma [eleição]”, disse, rindo. “[Enxergo o] fato de pesar nos ombros a responsabilidade de que realmente desta vez eu não posso me furtar ao chamado da população de São Paulo”, acrescentou.
“Com todo respeito ao presidente Lula [apoiador de Boulos] e ao presidente Bolsonaro [de Nunes], São Paulo vai ser governada pelo PSDB. São Paulo vai ser governada por mim”, afirmou ele, que no pleito de 2022 se encontrou com ambos, mas evitou se colocar como apoiador de um dos lados.
Datena disse ainda que seu interesse na política “nunca foi dinheiro”, mas declarou que não colocará recursos do próprio bolso na campanha e que os custos ficarão a cargo do partido. “Eu não sou um cara rico, não se iludam. Eu não sou um cara milionário, mas […] não preciso roubar.”
Segundo o postulante, “todo voto vai ser bem-vindo e bem recebido, seja de bolsonarista, seja de lulista, seja de gente do centro”. Ele disse que o mais importante é evitar “entregar esta cidade para bandidos”.
O ato de lançamento reuniu o presidente nacional do PSDB, Marconi Perillo, o municipal, José Aníbal, e outros tucanos como o deputado federal Aécio Neves (MG), o prefeito de Santo André, Paulo Serra, e o ex-vereador da capital Mario Covas Neto, o Zuzinha.
Aécio foi um dos mais entusiasmados na mesa, referindo-se a Datena como alguém que “fará a população de São Paulo voltar a acreditar em um projeto político” e defendendo que a candidatura própria do PSDB na cidade terá peso para influenciar os rumos do partido nacionalmente e nos próximos anos.
“São Paulo não é Las Vegas, onde o que acontece lá fica por lá. O que acontece em São Paulo tem importância para o Brasil inteiro”, disse o ex-presidenciável, que em diferentes momentos lamentou não ter chegado ao Planalto nas eleições de 2014 e manifestou discordâncias com Lula e Bolsonaro.
“Enquanto alguns [candidatos] vão se esconder e buscar ser liderados por figuras nacionais, vamos ter um candidato do PSDB para dizer ‘chega, chega de tanta ineficiência, chega de tanto atraso'”, afirmou Aécio.
Indagado sobre a hipótese de Datena desistir, o deputado respondeu não estar trabalhando com “esse se” e disse acreditar que a palavra dada pelo apresentador “é definitiva”. Comentou ainda que uma vantagem do pré-candidato é sua popularidade 88% dos paulistanos o conhecem, segundo o Datafolha.
Aníbal provocou Nunes ao afirmar que “falta governo” na capital e mencionou “a ousadia” do partido “de buscar um caminho próprio”. O presidente falou em afastar a imagem de que Datena é apenas especialista em segurança: “Conhece a cidade e sabe o quanto existe de frustração pela cidade afora”.
A sigla não tem mais vereadores na capital, desde que os oito representantes na Câmara se desfiliaram para engrossar a campanha de Nunes. Os pré-candidatos da sigla a vereadores foram apresentados no evento, que reuniu dezenas de militantes. Parte dos filiados, contudo, já está apoiando Nunes.
Para ser oficializado como candidato, Datena precisa ter o nome homologado em convenção. Os partidos têm que fazer a reunião entre 20 de julho e 5 de agosto e registrar as candidaturas até 15 de agosto.
No caso do apresentador, porém, também precisa ser obedecida a regra de se afastar do programa que apresenta ao vivo de segunda-feira a sábado. A lei estabelece que pré-candidatos à frente de programas de TV ou rádio não podem continuar na função a partir de 30 de junho, um domingo.
O jornalista indicou nesta quinta estar decidido a se afastar da Band por três meses para concorrer e desmentiu rumores de que estaria preocupado em manter seus honorários no período. “Ninguém vai pagar o meu salário da Band enquanto eu estiver em campanha politica”, disse.
Em outras vezes em que ensaiou migrar para a política, Datena enterrou a chance de candidatura ao entrar no ar depois do prazo permitido. Há dois anos, quando estava cotado para concorrer como senador pelo PSC, ele apareceu normalmente na TV e avisou no próprio programa os motivos da desistência.
Apesar de ter aberto seu discurso exaltando o trabalho da imprensa, o jornalista saiu sem responder a perguntas dos jornalistas, como estava previsto. Justificou-se dizendo que precisa poupar a voz e ainda não está plenamente recuperado das três cirurgias que fez nos últimos meses.
Há dois meses, acompanhado de Tabata durante sua filiação ao PSDB, o jornalista disse que “o futuro a Deus pertence”, mas que sua vontade era “estar do lado da Tabata”.
A decisão de lançá-lo pré-candidato surgiu a partir de sua entrada no PSDB, com a avaliação da cúpula de que a popularidade de Datena seria útil na busca de reposicionamento do partido, hoje esfacelado na cidade onde nasceu. Pesquisas de opinião mostrando viabilidade de seu nome reforçaram o cálculo.
No ato desta quinta, o apresentador elogiou Tabata, dizendo que continua respeitando a deputada e a vê como nome promissor da política brasileira, mas falou que “as circunstâncias mudaram” desde a articulação em que a parlamentar viabilizou sua filiação ao PSDB para ele ser vice dela.
A chegada de Datena também está no pano de fundo da saída de tucanos do partido. O ex-senador e ex-ministro Aloysio Nunes Ferreira, quadro histórico do PSDB, pediu desfiliação nesta quinta, sem explicitar seus motivos. Renata Covas Lopes, filha do ex-governador Mário Covas e mãe do ex-prefeito Bruno, também comunicou sua saída. Ela é irmã de Zuzinha, cotado para ser vice do jornalista.
Há especulações de que o movimento de debandada se intensifique, tanto por desconforto com a filiação de alguém visto como distante dos ideais da sigla quanto pela vontade de embarcar na campanha de Nunes.
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JOELMIR TAVARES