Novo componente genético ligado ao Alzheimer é descoberto em estudo
Um estudo liderado por pesquisadores do grupo de Neurobiologia e Demência, do Instituto de Pesquisa Sant Pau, em Barcelona (Espanha), revelou a ocorrência de um gene ligado ao desenvolvimento do Alzheimer.
Na pesquisa, que incluiu mais de 10 mil amostras de pacientes na Europa e cerca de 3.300 cérebros analisados, os cientistas identificaram a presença de duas cópias do gene Apoe4 em 95% dos adultos homozigotos – ou seja, que possuem pares de genes idênticos – com 65 anos ou mais que apresentavam a condição.
Além disso, em 75% dos casos os exames de PET-amiloide, utilizado para detectar a presença de placas da proteína beta-amilóide, ligada à condição, também portavam o gene.
Segundo os autores do estudo, que foi publicado nesta segunda-feira (6) na revista Nature Medicine, cerca de 2% a 3% da população carrega essa condição.
Até então, a presença de um componente do gene era considerada como um fator de risco para o Alzheimer. A presença das duas cópias do gene também indicou o desenvolvimento da doença neurodegenerativa em uma idade mais jovem, indicando que, no futuro, exames que detectem essa variante podem ajudar no diagnóstico precoce.
“Agora, sabemos que quase todos os indivíduos que carregam duas cópias desse gene apresentam os sintomas de Alzheimer”, disse Juan Fortea, primeiro autor do estudo e diretor da Unidade de Memória do serviço de Neurologia do instituto catalão.
“Isso significa que uma parcela significativa da população, até 3%, possui uma variante que é próxima da sua versão genética hereditária [que corresponde a cerca de 10% de todos os casos de Alzheimer], não apenas um fator de risco para a doença”, completa o médico.
Para os autores, a detecção precoce pode ser, inclusive, apontar novos caminhos para o desenvolvimento de drogas que combatam os sintomas da doença – por exemplo, reduzindo a formação das placas cerebrais que levam ao declínio cognitivo.
Para Víctor Montal, pesquisador do Centro de Supercomputador de Barcelona, a expectativa é de que novo estudos clínicos sejam feitos nos próximos anos usando esta variante genética como objeto de estudo.
“Estamos vivendo um momento único nas pesquisas de Alzheimer, com a aprovação de duas drogas anti-amiloides nos últimos anos. Os centros de pesquisa têm aumentado o financiamento para estudos da condição e o nosso estudo se soma a esse esforço, indicando possíveis caminhos para investigar o avanço do Alzheimer conforme ele vai evoluindo”, afirma.
Outro ponto destacado pelos pesquisadores é a idade mais jovem associada à condição genética, de menos de 65 anos, o que pode indicar que portadores do gene Apoe4 têm maior risco para desenvolvimento de uma alteração na ressonância magnética induzida por amiloides, ou Aria.
A médica Risa Sperling, do Hospital Brigham para Mulheres e o Hospital Geral de Massachusetts, que também participou do estudo, afirma que tal alteração ocorreu em participantes do ensaio clínico da lecanemab, uma droga aprovada pelo FDA (agência reguladora de alimentos e medicamentos dos EUA) para o tratamento da doença.
“Mas, para mim, o mais importante talvez seja iniciar o tratamento antes do desenvolvimento dos sintomas, particularmente naqueles que já possuem algum sinal cerebral e que sabemos que, por terem a variante genética, irão desenvolver declínio cognitivo”, completa.
Na mesma edição da Nature Medicine, os autores Qin Xu, Zherui Liang e Yadong Huang, do Instituto Gladstone e da Universidade da Califórnia em San Francisco, escreveram um artigo de opinião sobre o achado, ressaltando o caráter inovador da descoberta.
De acordo com os especialistas, a definição do padrão genético da doença de Alzheimer em portadores de duas cópias do gene Apoe4 pode ajudar no desenho de ensaios clínicos no futuro, especialmente considerando os casos raros de portadores da variante genética que não desenvolvem sintomas clínica e patologicamente reconhecidos da condição.
“A definição da condição de Alzheimer com base na patologia e nos biomarcadores em vez da definição clínica em idosos homozigotos para o gene pode ajudar na inclusão destes portadores em estudos para definição dos sinais de evolução da doença e no desenvolvimento de terapias-alvo”, diz o texto.
POR ANA BOTTALLO