Colapso na saúde mental tem 3,1 mil pacientes e fila de cinco anos
Marília sofre um verdadeiro colapso na saúde mental. O problema, já crônico, mostra que a rede municipal da Saúde não tem estrutura suficiente para a atender uma demanda que só cresce. Dados da pasta obtidos pelo Marília Notícia apontam que o município conta com apenas seis psiquiatras para atender uma fila de 3.172 pacientes. Com isso, o tempo de espera estimado está em 61 meses ou cinco anos.
Em requerimento respondido ao vereador Danilo Bigeschi (PSB), a Secretaria Municipal de Saúde informou que Marília registrou 423 casos de violência autoprovocada – que envolve tentativas de suicídio e atos consumados – em 2023.
“Somente em janeiro e fevereiro deste ano, segundo a Saúde, a cidade já registrou 128 casos [do tipo]. Sabemos que existem muitos subnotificados, ou seja, que não passaram por atendimento e que, portanto, não são registrados. Isso faz com que esses números, infelizmente, sejam muito maiores do que as estatísticas oficiais”, afirma o parlamentar.
De acordo com o registro da Saúde, a rede pública municipal disponibiliza para atendimento da população dois psiquiatras na Policlínica, dois psiquiatras no Centro de Atenção Psicossocial (Caps) Adulto e dois psiquiatras no Caps Infantil. No total, são seis especialistas na cidade.
Em relação ao número de psicólogos, 14 atendem nas 52 unidades de saúde de Marília, um no Centro de Referência em Saúde do Trabalhador Regional de Marília (Cerest), um no Serviço de Atendimento Especializado (SAE), três no Caps Adulto e três no Caps Infantil. Ou seja, são 22 profissionais na rede pública.
Ainda de acordo com os dados da Secretaria Municipal da Saúde, um total de 3.172 pacientes aguardam consulta com médico psiquiatra em Marília, em um tempo médio de espera de 61 meses, uma vez que a oferta mensal de atendimentos é de apenas 52 consultas.
“Trata-se de uma tragédia social que assola a população, fazendo com que pacientes com depressão e outros problemas graves de saúde mental tenham que aguardar cinco anos para passar por uma consulta com um psiquiatra”, pontua Bigeschi.
Em nota, a assessoria de imprensa da Prefeitura esclareceu que a rede da atenção básica em saúde mental conta com uma médica psiquiatra responsável pelo matriciamento – as unidades de saúde agendam os atendimentos.
“A rede possui dois psiquiatras na Policlínica – que recebe o fluxo de demandas reguladas pela Central de Regulação de Ofertas de Serviços de Saúde (Cross), de responsabilidade da Secretaria de Estado da Saúde -, dois psiquiatras no Caps Adulto, dois no Caps Infantil, um psiquiatra no ambulatório da Clínica Aconchego (regulação via Cross) e atendimento psiquiátrico no ambulatório do complexo HCFamema (vagas também gerenciadas através do Cross, Estado)”, afirma.
Conforme a assessoria do Poder Executivo, o encaminhamento para especialidades é realizado pelo médico do posto de saúde, após consulta que identificou a necessidade de um especialista. “Outro ponto essencial é o matriciamento, onde psiquiatra da rede de atenção básica de Marília avalia o paciente e adota os demais procedimentos, inclusive realizando consulta compartilhada. Este matriciamento está à disposição, realizado antes mesmo do encaminhamento para os ambulatórios já citados”, completa a administração.
Apesar de o município jogar a responsabilidade do encaminhamento para o Estado, Bigeschi – que é servidor de carreira da Saúde – destaca que a fila existente é de marilienses que aguardam uma consulta com um psiquiatra na cidade.
“O HC atende a região, mas tem um pronto-socorro para atender pessoas que tentam cometer suicídio. A Secretaria Municipal da Saúde é responsável direta pela fila. O médico clínico-geral, por exemplo, pode atender um paciente com depressão e encaminhar para um psiquiatra do município, porém, há muita demora”, salienta.
HOSPITAL DAS CLÍNICAS
Como o Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Marília (HCFamema) foi citado tanto pela assessoria de imprensa da Prefeitura quanto pelo vereador, o Marília Notícia também solicitou esclarecimentos sobre o atendimento psiquiátrico no complexo estadual, que atende Marília e outros mais de 60 municípios da região.
“Em nosso corpo clínico, temos o total de 11 psiquiatras. Para consultas, o paciente deve ir ao posto de saúde para atendimento médico, onde, caso seja necessário, será encaminhado à psiquiatria. O agendamento é realizado pelo próprio posto em vaga ofertada pelo Departamento Regional de Saúde (DRS-IX) no ambulatório HCFamema”, esclarece em nota.
A assessoria do HCFamema reitera que há municípios que possuem unidades do Caps, para onde pacientes também podem ser encaminhados. “O ambulatório e HC são referências para 62 municípios.
Hoje possuímos unidade de urgência e emergência em saúde mental, para casos classificados com gravidade, encaminhados com referência ou regulados pelo Serviço de Atendimento Móvel e Urgente (Samu)”, conclui.
AÇÕES E CAMPANHAS
No início do ano, a Prefeitura promoveu a campanha “Janeiro Branco” em todas as 52 unidades de saúde de Marília, com o objetivo de intensificar a mensagem permanente de alerta para os cuidados com a saúde mental e emocional da população, a partir da prevenção das doenças decorrentes do estresse, como ansiedade, depressão e pânico.
Para a enfermeira Camila de Andrade Alcalde, técnica responsável pela equipe de saúde mental na cidade, o matriciamento é um instrumento que aproxima a atenção especializada ao nível primário de assistência à saúde, em busca de melhor resolutividade e integralidade do cuidado.
“Todas as unidades já estão capacitadas para acolher as pessoas que possam ter qualquer demanda de saúde mental e a Secretaria da Saúde e sua equipe técnica contam tanto com psicólogos como com uma médica especialista em saúde mental na função de matriciadora”, explica a enfermeira.
COMITÊ
O assunto é urgente. Tanto que, no início do mês, o município criou um comitê para diminuir os casos de violências autoprovocadas e suicídios.
O decreto 14.278 foi assinado pelo prefeito Daniel Alonso (sem partido) no último dia 4. Intitulado Comitê de Valorização da Vida, o grupo será composto por representantes e respectivos suplentes de diversos setores, órgãos, instituições e entidades, incluindo serviços de saúde, assistência social, educação e segurança pública.