De doceria a gigante varejista: conheça a história do Grupo Pão de Açúcar
O Grupo Pão de Açúcar, responsável por alçar o empresário Abilio Diniz ao seleto rol de bilionários brasileiros, teve um início tímido: começou como uma doceria na Avenida Brigadeiro Luiz Antônio, no centro de São Paulo.
O ano era 1948, e o imigrante Valentim dos Santos Diniz, pai de Abilio, resolveu nomear a lojinha em homenagem à primeira visão que teve do Brasil, quando o navio que o trazia de Portugal entrou na baía de Guanabara. Algum tripulante ao lado gritou “olha o Pão de Açúcar!”, e a imagem dos dois morros cariocas ficou gravada na memória do fundador da rede varejista, hoje uma das maiores do país.
A data de inauguração para “seu Santos”, como Valentim era conhecido, também guarda um simbolismo com a terra natal. Era 7 de setembro, “dia em que Portugal perdeu o Brasil e eu ganhei o Pão de Açúcar”, disse ele em entrevista à Revista Exame, em 2002.
A doceria oferecia serviços de buffet, com doces e salgados embalados que viraram febre em casamentos, batizados e festas de firma. O negócio prosperou. Quatro anos depois da inauguração, mais duas filiais foram abertas nas redondezas, e, em 1959, pintou a oportunidade de comprar um terreno ao lado da doceria da Brigadeiro Luiz Antônio. Valentim queria construir um cinema, mas Abilio, que à época finalizava os estudos em administração de empresas na FGV (Fundação Getulio Vargas), o convenceu a abrir um supermercado.
Nascia ali a primeira unidade do Pão de Açúcar, na esteira, também, da grande novidade entre os mercados: o autosserviço. Até então, a clientela solicitava os produtos diretamente no balcão do dono da venda, e o supermercado da família Diniz apostava no modelo de retirar os artigos diretamente das prateleiras.
Em 1963, a segunda unidade do supermercado foi inaugurada na rua Maria Antônia, também no centro de São Paulo. A primeira operação de aquisição veio em 1965, quando a cadeia Sirva-se foi incorporada à operação, levando o Pão de Açúcar a 11 lojas. A partir daí, a rede pulverizou, e, em 1968, já era composta por 64 supermercados. Naquele ano, foi criada a Divisão Internacional, com unidades em Portugal, Angola e Espanha.
Os anos 1970 foram agitados para o Grupo, que estava em franca expansão. Logo no início da década, foi inaugurado o hipermercado Jumbo em Santo André, no ABC Paulista o primeiro do tipo no Brasil, que viveu um verdadeiro frisson pelo modelo hiper até a década seguinte. Dá para entender a predileção: à época, o país começava a viver a chamada “hiperinflação”, quando consumidores estocavam produtos em casa para fugir da variação diária de preços. O Jumbo, de cara, virou um chamariz da rede Pão de Açúcar, que diversificou o portfólio para o atacado.
Os anos seguintes também foram marcados pela compra da Eletroradiobraz, até então um dos titãs do mercado varejista e dono do Baleia, hipermercado concorrente do Jumbo. Dali dois anos, a empresa da família Diniz adquiriu mais redes de supermercados, como Superbom, Peg-pag e Mercantil, para, na década de 1980, abrir o leque com novos formatos de estabelecimentos.
A partir daí, não era “só” Pão de Açúcar, Jumbo e Assaí, mas também Mini-Box, uma “loja despojada” de poucos itens a preços baixos, Sandiz, rede de departamentos, e Peg & Faça, voltada a bricolagem. Tamanha operação levou “seu Santos” a tomar uma decisão difícil: abdicou o nome afetivo de Grupo Pão de Açúcar para adotar o mais generalista Companhia Brasileira de Distribuição, até hoje vigente, embora menos conhecido.
Na mesma década, a empresa apostou em uma reestruturação de negócios para focar no setor de varejo, e parte desse movimento começou com uma reformulação do Jumbo em Extra, mirando acirrar a competição no setor de hipermercados.
A nova estrutura, porém, não foi por acaso. Além da economia do país andar em maus lençóis, havia um imbróglio na família de Valentim: os filhos Abilio, Alcides e Arnaldo, que tinham participações na empresa, estavam em desavenças. Foi então que Abilio se afastou dos negócios e foi convidado pelo então ministro do Planejamento, Mario Henrique Simonsen, para fazer parte do CMN (Conselho Monetário Nacional), na coordenação de boletins econômicos.
Sem Abilio, o Grupo Pão de Açúcar começou a afundar e quase foi à bancarrota. Em 1989, após uma série de desentendimentos, Alcides e Arnaldo aceitaram vender suas participações ao irmão, e Abilio, a convite do pai, assumiu a presidência executiva. Valentim, àquela altura com 76 anos, passou a ocupar o Conselho Administrativo da empresa.
Ali começou a retomada da gigante varejista. Em 1995, com Abilio já como acionista majoritário, o Grupo fez o primeiro IPO (Oferta Pública Inicial, na sigla inglês), quando obteve US$ 112,1 milhões de capital na Bolsa brasileira. Dali dois anos, expandiu para a Nova York, e o segundo IPO captou US$ 172,5 milhões. O Pão de Açúcar foi a primeira empresa varejista do país a estar listada no ADR, título norte-americano lastreado em ações de empresas estrangeiras.
Do IPO em Nova York até às vésperas da virada do milênio, o Pão de Açúcar voltou a expandir operação, comprando redes de supermercados de bairro, como Barateiro e Peralta.
O ÊXODO DA FAMÍLIA DINIZ
Depois dos IPOS, o próximo passo traçado por Abilio Diniz tratava-se de encontrar um parceiro estratégico fora do país. Foi em 1999 que o Grupo Casino, gigante varejista francês, comprou 25% do total de ações, tornando-se sócio minoritário do Pão de Açúcar.
Dali por diante, a participação da família Diniz nos negócios do Pão de Açúcar começou a minguar. Com a aposentadoria de Valentim, Abilio assumiu a presidência do Conselho de Administração da companhia, em 2003, passando o bastão de presidente executivo para Augusto Marques da Cruz Filho, o primeiro fora da família fundadora. Em 2005, foi criada uma nova holding, e o controle do Grupo Pão de Açúcar passou a ser compartilhado: 50% para Abilio, 50% para o grupo Casino. Em 2007, o Grupo se unia ao Assaí Atacadista, ingressando de vez no mercado do “atacarejo”.
Enquanto a família perdia espaço, veio o baque em março de 2008: Valentim havia morrido aos 94 anos, vítima de falência múltipla de órgãos.
Ao mesmo tempo em que a família lidava com o luto, a operação de aquisições continuou a todo vapor. Em 2009, a rede Ponto Frio foi comprada. No mesmo ano, o Pão de Açúcar se uniu às Casas Bahia, tornando-se o maior grupo de distribuição da América Latina.
Foi em 2011 que a disputa pelo controle da rede varejista tomou os holofotes. Frustrado, Abilio tentou uma manobra: propôs uma fusão com o arquirrival do Grupo Casino, o também francês Carrefour. O plano criaria um gigante avaliado em US$ 41,899 bilhões, uma vez que as operações do Carrefour no Brasil dividiram pódio com o Pão de Açúcar como as maiores empresas de varejo e distribuição.
Como esperado, o Grupo Casino vetou o acordo, e Abilio amargou uma derrota difícil. Pouco tempo depois, Jean-Charles Naouri, CEO da empresa francesa, assumiu o comando do Pão de Açúcar, em uma troca que já era anunciada desde 2006.
Em 6 de setembro de 2013, véspera do aniversário de 65 anos da fundação do Grupo Pão de Açúcar, Abilio renunciou à presidência do Conselho de Administração e encerrou, de vez, a participação da família na empresa fundada por Valentim.
“Na véspera do dia que simboliza a liberdade do Brasil, eu também abraço a minha liberdade para continuar perseguindo os meus sonhos”, disse o empresário, na ocasião. Por várias vezes durante o anúncio, Abilio afirmou que os dois anos anteriores não tinham sido fáceis e, ao final, agradeçeu à família por tê-lo “aguentado” durante um período “que não foi prazeroso”.
De lá para cá, o Grupo Pão de Açúcar passou a adotar a sigla GPA como nome oficial, ainda que, formalmente, seja Companhia Brasileira de Distribuição. O objetivo é descolar a empresa do setor de supermercados, mostrando que a marca contempla setores diversos da economia.
Nos últimos anos, a empresa perdeu o posto de maior rede varejista do país. Em 2019, vendeu todas as ações que detinha da Via Varejo, grupo controlador do Ponto Frio e Casas Bahia, e, em 2021, o Assaí Atacadista deixou de fazer parte do GPA e comprou as operações do Extra.
Ainda que a família Diniz não esteja mais atuante no GPA, a raiz continua viva: a sede do grupo segue sendo no mesmo endereço da doceria fundada por Valentim.
POR TAMARA NASSIF
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