Problemas se agravam nos prédios da CDHU e assustam moradores
Moradores dos prédios do Conjunto Habitacional Paulo Lúcio Nogueira, construídos pela Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU), na zona sul de Marília, estão ainda mais preocupados com a atual situação das moradias e o risco de desmoronamento. O local tem apresentado um acelerado processo de quebra dos degraus nas escadas, inclusive com descolamento de concreto, em andares diferentes. Ou seja, como já anunciado – inclusive em perícia – a estrutura pode estar para ruir.
Os moradores relataram ainda que os problemas já identificados e reiteradamente apontados estariam se agravando, em processo mais rápido que o habitual, o que tem assustado os que não contam com opção de moradia e que permanecem no local. A preocupação chegou ao Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP), que anexou uma carta encaminhada sobre o agravo nos problemas.
“Está ocorrendo a quebra de degraus nas escadas, inclusive com descolamento de concreto, no mesmo prédio, em andares diferentes. Outra situação foi o afundamento da casa de energia e a constatação de água embaixo do prédio nesse local. Alguns moradores relatam trincos e buraco na parede”, descreve o documento.
Os moradores alegam que a Defesa Civil foi acionada em todos esses novos casos, mas teriam afirmado que não poderiam fazer nada, pois não teriam como remover os moradores do local. Mesmo assim, isolaram uma área para que os moradores não se aproximassem, devido ao risco.
Imagens da situação, encaminhadas para o Marília Notícia, revelam um cenário de piora dia após dia. A preocupação aumenta com o início do período mais chuvoso do ano. A grande quantidade de chuva, típica dessa época do ano, pode acelerar o processo de degradação dos prédios.
CADASTRAMENTO SOCIAL
Em setembro, a Prefeitura de Marília realizou um cadastramento social de todos os moradores dos prédios da CDHU. Uma força-tarefa foi lançada na semana passada, com um plano de ação de diversas secretarias municipais.
O plano de ação consta no decreto nº 14.136, de 15 de setembro de 2023, publicado na edição do Diário Oficial do Município de Marília (Domm) do dia 16 de setembro.
Os prédios da CDHU ficam localizados na rua Mário Bataiola, 501. Constituído de 44 blocos, a estrutura possui 880 apartamentos e foi construído há 25 anos pelo Governo do Estado de São Paulo.
Atualmente, segundo levantamento da Prefeitura de Marília, 727 apartamentos estão ocupados, com 1.727 moradores, sendo 580 menores de idade, 873 adultos e 196 idosos.
COMEÇO DO PESADELO
O drama que assola os moradores dos populares “predinhos da CDHU” começou a se desenrolar em maio de 2018, quando uma ação civil pública foi proposta pelo Ministério Público do Estado São Paulo (MP-SP) e pela Defensoria Pública, após a representação de um morador do condomínio. Na ocasião, o promotor de Justiça Ezequiel Vieira da Silva deu início a um processo que viria a expor as péssimas condições das edificações.
Na época, a Promotoria solicitou uma vistoria no local ao Corpo de Bombeiros, que revelou uma série de irregularidades alarmantes, incluindo a falta de um sistema contra incêndios, fiação elétrica exposta, um telhado instalado sobre um depósito de gás e a interdição do bloco J2 pela Defesa Civil.
O MP-SP alertou que uma “necessidade urgentíssima” de intervenção do Poder Público era imperativa para evitar uma possível catástrofe no local.
BATALHA JUDICIAL E ALEGAÇÕES
Antes do início do processo judicial, a Prefeitura de Marília, que bem da verdade nada tem a ver com o caso do ponto de vista jurídico, notificou a CDHU, solicitando que esta tomasse as providências cabíveis para resolver os problemas no conjunto habitacional. No entanto, a CDHU se recusou a aceitar a responsabilidade pelos problemas e alegou que os danos eram resultado do mau uso por parte dos moradores.
Durante anos, o caso tramitou nos tribunais, com a CDHU mantendo a posição de que a culpa recaía sobre os condôminos. No entanto, em janeiro de 2023, o Ministério Público do Estado de São Paulo protocolou uma ação que pediu a interdição dos prédios devido ao risco iminente de desabamento, conforme apontado em um laudo pericial.
O perito judicial Paulo César Lapa, em seu laudo emitido em novembro do ano anterior, identificou uma série de problemas estruturais no condomínio, incluindo escadas com ferragens expostas, desagregação do concreto devido à umidade causada por infiltrações, trincos, rachaduras, infiltrações nas lajes e rompimentos no abrigo de gás. Essas condições eram resultado, segundo o laudo, da falta de manutenção adequada.
DECISÃO JUDICIAL E REVIRAVOLTAS
Em 25 de janeiro de 2023, a Justiça decretou a interdição cautelar do Conjunto Habitacional Paulo Lúcio Nogueira e estabeleceu um prazo de três meses para que a CDHU realizasse as reformas necessárias e providenciasse a realocação dos moradores durante esse período. Contudo, essa decisão foi posteriormente suspensa pela 7ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP), em segunda instância.
A análise do desembargador Fernão Borba Franco levou à necessidade de determinar exatamente quais obras seriam necessárias e quais apartamentos deveriam ser esvaziados, uma vez que nem todos os prédios estariam em risco. Além disso, o prazo de três meses para as obras foi suspenso, e uma audiência de conciliação foi marcada para 9 de março.
Durante esse processo, a CDHU recusou uma proposta de solução feita pela Prefeitura de Marília durante a audiência de conciliação, alegando que não havia autorização governamental ou verba específica para atender à demanda.
LUTA DOS MORADORES
Enquanto a batalha judicial se desenrolava, os moradores do Bloco F1 começaram a abandonar seus apartamentos devido ao medo constante de um desabamento, agravado após um incêndio fatal em agosto de 2022. Uma mulher de 55 anos morreu na ocasião.
A falta de segurança e as condições precárias forçaram muitos a buscarem abrigo com amigos e familiares. As crianças que ali viviam foram transferidas para escolas de outras regiões, um transtorno nas rotinas das famílias.
Jéssica Maria dos Santos Nascimento foi uma das moradoras que preferiu não mais se arriscar e decidiu parar de dormir no próprio apartamento. Ela sabia que o risco já era grande no Bloco F1 e acredita que a estrutura ficou ainda mais perigosa após o incêndio.
“Nosso bloco já era o que estava com laudo de interdição, com maior risco de queda. Depois disso, o risco só aumentou. Não tem chances de dormir. Temos que sair, mas não temos para onde ir. Acordamos sem casa e agora estamos contando com a boa ação de alguém para abrigar a gente, mas ainda tem alguns se arriscando e dormindo no prédio”, conta Jéssica.
Outra moradora que já deixou o apartamento em que morava foi a Érica Carvalho. Ela explica que também não se sente mais segura morando no local e que o risco ficou ainda maior agora.
“Não tem condições de ficar lá. Falaram que a gente teria que aguardar, só isso, mas confirmaram que existe risco. Estou dormindo em outro apartamento, no meu filho. Voltar para cá não tem mais jeito. A escada está caindo aos pedaços e não sabemos o que vai acontecer. Só peguei a roupa da nenê, algumas trocas de roupas para mim e só. Todos os móveis ainda estão lá. Estamos aguardando, pois não temos para onde ir”, finaliza Érica.