Justiça inocenta 14 réus por fraude e desvio na Famema
A Justiça Federal de Marília absolveu todos os 14 réus do processo que investigou suposta fraude em processos licitatórios e peculato envolvendo funcionários da Faculdade de Medicina de Marília (Famema) e a Fundação de Apoio à Faculdade de Medicina de Marília (Famar), além de empresas prestadoras de serviços médicos.
A ação penal foi proposta pelo Ministério Público Federal (MPF) em 2017, após a Operação Esculápio deflagrada em 2015. A sentença foi publicada nesta segunda-feira (10) pelo juiz Fernando David Fonseca Gonçalves, da 3ª Vara Federal de Marília.
A determinação considerou improcedente a “pretensão punitiva contida na denúncia” e julgou inocentes os réus Adalberto Pablo dos Santos Gélamo, Antonio Carlos Ribeiro, Cleonilda Bonfim, Everton Sandoval Giglio, Ivan de Melo Araújo, José Cícero Guilhen, Leandro Beloni, Luiz Carlos Pavanetti, Maria Amélia Abdo Barreto, Marilda Siriani de Oliveira, Marcia Martins Muller Brambila, Mércia Ilias, Roberto Guzzardi e Winston Wiira. O acusado Alcides Durigam Junior teve punibilidade extinta, pois faleceu antes da decisão.
FRAUDES
No caso da denúncia de fraudes em processos licitatórios, o juiz entende que a Famar, por não ser órgão da administração pública, não está obrigada a realizar licitações.
“Logo, os dirigentes e funcionários da Famar, quando esta segue seu regimento de contratações e não as disposições da Lei nº 8.666/1993, não cometem o crime tipificado no artigo 90 desse último estatuto. Assim também se dá com os agentes estritamente privados, se fundação de direito e regime privados não observa o regramento para licitações e contratos da administração pública, especialmente devotado aos atores identificados no artigo 1º e parágrafo único, da Lei de Licitações”, declara Gonçalves, em texto.
A decisão defende que o não cumprimento do regulamento próprio da Famar pode ser considerado ilícito, porém, seria um assunto para âmbito extrapenal. Gonçalves ainda alega que o Direito Penal é subsidiado pelo princípio de intervenção mínima e suas normas devem servir como último recurso.
“Para que as normas penais tenham trânsito, o bem jurídico tutelado deve ter sido exposto a dano com relevante lesividade. Sem essa necessária notação, convoca-se a disciplina dos demais ramos do Direito porquanto adequada e suficiente à tarefa de pôr a salvo o bem jurídico a proteger”, consta no documento.
Por fim, sobre a questão, o juiz federal afirma estar em tramitação uma ação civil de improbidade administrativa.
PECULATO
Já sobre a denúncia de peculato, ou seja, apropriação por parte do funcionário público “de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio”, o juiz também descaracterizou a conduta.
De acordo com a decisão, o peculato-desvio, imputado aos réus, caracteriza-se pela “alteração do destino ou pelo descaminho do bem, dinheiro ou verba pública de que o funcionário tinha a posse em razão do seu cargo.”
Gonçalves defende que não há crime no desvio de “coisa móvel” para atender a finalidade pública.
“Para a caracterização do peculato-desvio é indispensável que a conduta típica recaia sobre coisa corpórea, não restando configurada diante da utilização indevida de mão de obra ou de serviços, contanto que estes tenham sido prestados em consonância com a finalidade pública a que estavam prepostos. Ergo, a utilização, em proveito próprio ou alheio, dos serviços executados por empresa que é
para isso contratada, não configura desvio ou apropriação de bem móvel”, afirma.
Mais uma vez, o magistrado declara ser “atípica” a conduta, mas que deve ser investigada nos planos ético e administrativo, em âmbito extrapenal.
DENÚNCIA
Em julho de 2015, agentes da Polícia Federal (PF) deflagraram a Operação Esculápio (que na mitologia greco-romana representa o deus da Medicina e da cura), cujo objetivo foi de apurar irregularidades ocorridas em licitações e contratos firmados pela Famar com empresas prestadoras de serviços médicos.
À época, o Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP) apurou que estariam ocorrendo desvios de dinheiro público que era repassado pelo Governo Federal através da Fundação Municipal de Ensino Superior de Marília (Fumes).
O Ministério Público Federal (MPF), juntamente com a PF, e munidos com mandados de busca e apreensão, colheram centenas de documentos e dispositivos de memória de computadores em 12 endereços na cidade, incluindo a sede da Famema e da Famar. O trabalho teria começado 6 meses antes da operação e escutas telefônicas também foram usadas no trabalho de investigação.
Dois anos depois, em julho de 2017, o MPF denunciou funcionários da Famema, pedindo a devolução de cerca de R$ 178 mil. Foi apontada a utilização de ao menos três empresas no suposto esquema de fraude. Os acusados pelo MPF teriam atuado de forma ilegal em licitações e pagamentos decorrentes delas ao menos entre 2010 e 2014.
Os acusados teriam, conforme a denúncia, “agido com unidade de desígnios, identidade de propósito (isto é, em conluio) e de forma dolosa, fraudaram, mediante ajuste, combinação e outros expedientes (escolha de licitação em modalidade diversa da legalmente exigível, sem a observância do dever legal de publicidade e mediante inserção de informações ideologicamente falsas) as licitações para obterem vantagem.”