Tradicional Clube dos Bancários sofre com abandono e disputa
Símbolo de lazer e entretenimento durante décadas, principalmente, pelas tardes de verão e por seus eventos recreativos, o Clube dos Bancários de Marília virou sinônimo de disputa e de abandono. Um contraste aos seus 47 anos de história.
São várias ações na Justiça, incluindo a venda de parte do patrimônio por R$ 2,1 milhões, em uma controversa negociação, em janeiro do ano passado. A crise de arrecadação que já estava instalada, combinada com a divergência interna e a pandemia, tornaram o futuro incerto.
São dois os principais processos judicias – pelo menos, os mais polêmicos – envolvendo o Clube dos Bancários de Marília.
DISPUTA
Um deles começou em julho do ano passado, quando o advogado Flávio Luiz de Oliveira, que também é sócio patrimonial do clube, recorreu à Justiça para anular suposta venda irregular do ginásio de esportes dos Bancários, atualmente alugado para a Prefeitura.
O negócio, que Oliveira chama de “atípico”, foi fechado pelo então administrador provisório, Mauro Ferreira Silva Filho, com a empresa Santa Avelina Participações e Administração. Como pagamento, R$ 1,1 milhão em duas parcelas em valores líquidos.
O restante estaria garantido em imóveis (terrenos, casa e apartamento) que poderiam ser vendidos pelo próprio clube, para gerar abatimento na compra do ginásio. O contrato foi registrado em um cartório no distrito de Padre Nóbrega, zona Norte de Marília.
DIRETOR AFASTADO
Cinco meses depois, Flávio Luiz de Oliveira provocou a Justiça e ingressou com uma ação declaratória de invalidade (nulidade) de negócio jurídico. Ele apontou ilegitimidade de Mauro Ferreira Silva Filho, administrador provisório, para alienar patrimônio sob sua administração.
Apontou ainda falhas no processo legal da venda, em uma série de supostas irregularidades que envolvem a oferta de outros imóveis como pagamento, assinatura de pessoa que não seria parte legítima, pagamento em conta de terceiro, e ausência de depósitos para o clube.
Para evitar risco de “dano irreparável ou de difícil reparação” à agremiação, o juiz da 3ª Vara Cível de Marília, Luis César Bertoncini, acolheu o pedido do advogado Flávio Oliveira e afastou o então administrador. O processo passou a discutir a legitimidade do diretor e a validade da venda do ginásio.
DINHEIRO E DÍVIDAS
Além de Filho – que faleceu em outubro do ano passado, aos 74 anos –, a ação também questiona a atuação do advogado Fernando Henrique Buffulin Ribeiro. A assinatura dele está no contrato com a Santa Avelina, embora seu nome não apareça no documento como procurador do clube.
Ribeiro teve sua conta corrente utilizada para o recebimento da primeira parceira da entrada de R$ 550 mil. Ao Marília Notícia, o advogado disse que, na época, defendia o Clube dos Bancários e atendeu pedido do então administrador, já que as contas da instituição não poderiam receber o recurso, para evitar bloqueio, em função das execuções.
“Foram pagos R$ 100 mil de comissão de corretor de imóveis e o dinheiro foi repassado ao senhor Mauro para o pagamento dos débitos do clube, conforme está comprovado no processo. Anexamos cópias de comprovante de pagamento das inúmeras despesas, incluindo dívidas trabalhistas, fornecedores, manutenções que o clube precisava fazer para continuar funcionando”, informa ao MN.
Ribeiro diz ainda que ao longo de mais de 14 anos, o aposentado Mauro – um homem que, segundo o advogado não tinha sequer um protesto e ostentava conduta ilibada – mantinha a instituição com dificuldades. “Ele chegou a colocar dinheiro do bolso para manter o clube aberto”, afirma ao site.
O advogado diz ainda que foram pagos, além dos R$ 100 mil do corretor de imóveis, mais de R$ 50 mil em dívidas com um contador. Há anos o profissional não recebia do clube, de acordo com ele.
Os débitos acumulados incluiriam “quatro ou cinco anos” de 13º salário de funcionários. O dinheiro repassado pela Santa Avelina pagou também, segundo o ex-advogado do Clube dos Bancários, peças para reparação de motores das piscinas e obras para sanar rachaduras.
“Causa estranheza que o senhor Mauro tocava tudo na raça, sem a ajuda de praticamente ninguém. Mas foi só entrar dinheiro no caixa, para pagar dívidas, que apareceram pessoas para questionar a legitimidade dele. Acho que ele faleceu de tristeza”, analisa Ribeiro.
Na versão do advogado, o abandono já rondava o clube muito antes da negociação. Com a queda na arrecadação e acúmulo de dívidas, há anos a participação dos diretores estaria precária, com poucos interessados em compor diretoria e conselhos. Sem eleições, Filho era o presidente provisório.
Nas contas do ex-assessor jurídico, nos meses finais de suas atividades, o Clube dos Bancários operava com média de R$ 9 mil em receitas mensais, para R$ 14 mil de despesas fixas por mês.
PODERES LIMITADOS
Autor da ação, Flávio Oliveira afirma acreditar em sentença declaratória da nulidade. “A decisão será da Justiça, mas entendemos que a venda ocorreu de forma irregular, inclusive de forma bastante atípica. Nenhum numerário adentrou aos cofres do clube”, adverte.
O ex-administrador provisório, conforme aponta, tinha poderes limitados e não poderia alienar patrimônio do clube. Além disso, descumpriu prazo de 90 dias – dado pela Justiça, quando assumiu a função – para convocar eleições.
Oliveira aponta ainda que não teria havido autorização do Conselho Deliberativo para a negociação. Ele questiona a validade de uma ata antiga, que foi anexada ao processo, na qual o colegiado autorizava a venda de outra parte do clube – testa para a avenida João Ramalho.
“Houve, inclusive, uma inobservância do tabelião (que registrou o contrato). Isso já gerou um inquérito, que está em vias de se transformar em processo. No nosso entendimento, essa situação caracteriza uma fraude”, diz.
CADÊ O DINHEIRO?
Para o advogado Flávio Luiz de Oliveira – sócio patrimonial do Clube dos Bancários –, os recibos de pagamentos anexados ao processo não comprovam o uso de todos os recursos recebidos da Santa Avelina Participações e Administração.
“Os parcos comprovantes (de pagamentos) não chegam aos valores envolvidos na parcela paga. Então fica a questão de onde estão estes recursos, que nos cofres do clube não entraram”, questiona.
Embora tenha feito assembleia e definido diretoria – situação que pode acabar com o ciclo de administradores provisórios, o clube está tecnicamente inativo. Os funcionários foram demitidos, a secretaria está fechada, os sócios não podem ser recebidos e não há arrecadação.
O local não tem Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros (AVCB) e não pode realizar eventos. A receita do aluguel do ginásio também não entra nos cofres do clube (veja abaixo o motivo) e a venda questionada – caso a nulidade seja declarada – poderá acontecer de fato.
“Evidente que, havendo essa deliberação, a venda de ativos é uma das principais alternativas para que o clube possa honrar compromissos. Mas isso precisa ser feito da maneira correta”, diz Oliveira.
VAI TER GINÁSIO?
A compradora do ginásio, representada pelo advogado Flávio Luis Zambom, tenta evitar a nulidade do negócio. Com o ex-diretor falecido e o então procurador do clube afastado, a perda dos R$ 550 mil, que já teriam sido investidos, é um risco iminente.
Segundo Zambom, a empresa ainda tem interesse em deter o ginásio e não teria a intenção de mudar a finalidade. “Hoje está locado para o município. A ideia é fazer melhorias, agregar valor. É um local importante para a cidade e não se vislumbra outro projeto, diferente do atual”, garante.
O advogado afirma que houve, por parte da diretoria, desconhecimento propositado de todo o esforço para preservação do patrimônio do clube e do enfrentamento dos problemas que o administrador provisório enfrentava.
“Desde a venda da outra área (testa da avenida João Ramalho) a autorização já estava determinada para o ginásio. Agora é fácil ignorar as dívidas, pois elas foram pagas e isso está comprovado. Necessário agora que se estabeleça a verdade, para que o clube receba o restante do valor”, diz.
INQUILINA
Por mês, o Clube dos Bancários deixa de receber R$ 14.143,81 referentes ao aluguel do Ginásio e anexo, utilizado pela Prefeitura de Marília como sede da Secretaria de Esportes, Lazer e Juventude Marília (SELJ).
O dinheiro passou a ser depositado em juízo, depois que o município ingressou com uma Ação de Consignação em Pagamento e teve aval da Justiça. A autorização consta em despacho do juiz da Vara da Fazenda Pública de Marília, assinado em dezembro do ano passado.
Somente após decisão na ação, que discute a propriedade, é que os valores serão desbloqueados, em favor da Santa Avelina Participações ou do Clube dos Bancários de Marília.
O MN tentou contato com familiares de Mauro Ferreira Silva Filho, falecido em outubro do ano passado, mas não conseguiu localizar nenhum representante, à exceção do advogado que afirmou ter defendido a gestão do ex-diretor.
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