Marília prevê corte no investimento federal em leitos de UTI Covid
Em meio a conflitos protagonizados pelo governador João Doria (PSDB) e o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), a Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo denunciou, nesta sexta-feira (5), cortes do Ministério da Saúde para leitos em Unidades de Terapia Intensiva (UTI). Marília está entre as cidades que devem perder recursos.
A redução da participação federal direta aumenta a pressão sobre as prefeituras. A mudança deve gerar impacto em Marília a partir do dia 16 de fevereiro, quando vencem portarias federais de habilitação, para fins de financiamento, de dez leitos no Hospital Beneficente Unimar (HBU) e dez na Santa Casa de Misericórdia.
A Prefeitura trabalha com a hipótese de não haver renovação. Nesse caso, recursos federais (não relacionados à pandemia), subvenções estaduais e fontes do tesouro municipal seriam usados para pagar a conta.
Estrutura hospitalar
O Sistema Único de Saúde (SUS) tem atualmente em Marília 60 leitos de UTI específicos para tratamento de pessoas com sintomas graves da Covid-19.
São 30 vagas no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Marília (HC/Famema), sob gestão do próprio Estado, referenciadas para os 62 municípios da regional de Saúde.
Já a outra metade das vagas está distribuída entre o Hospital Beneficente Unimar (20 leitos) e a Santa Casa de Marília, que tem dez. As duas instituições são conveniadas com a Prefeitura para atendimento preferencial aos moradores locais.
O que muda
Até o dia 16 de fevereiro, segundo a Secretaria Municipal da Saúde, dos 30 leitos no HBU e Santa Casa, 20 seguirão custeados exclusivamente com recursos federais – por meio das portarias de habilitação.
Os outros 10 leitos (metade dos disponíveis pelo SUS na Unimar) já estão sendo pagos diretamente pela Prefeitura, que utiliza recursos federais, estaduais ou municipais, conforme a disponibilidade.
“Há risco de não ocorrer a prorrogação da habilitação (a partir de 17 de fevereiro) desses leitos pelo Ministério da Saúde, porém, não significa que o município os perderá, mas terá que buscar outros recursos para seu custeio”, informou a Prefeitura em nota.
“Poderão ser utilizados outros recursos federais, não especificamente Covid, e também recursos estaduais e municipais”, apontou a assessoria de imprensa.
Embate
Em coletiva na Capital, nesta sexta-feira (5), o governador João Doria disse que o Ministério da Saúde deixou de financiar 3.258 leitos intensivos no Estado de São Paulo. Não foi especificado se a conta já inclui as portarias à vencer em fevereiro, como é o caso de Marília.
O chefe do Executivo paulista declarou que vai entrar na Justiça para questionar a redução do investimento. Doria reclamou ainda da “quebra do pacto federativo” e citou viés político, como causa da retirada de recursos.
O Ministério da Saúde negou o corte e, em nota, afirmou que desde maio “habilitou 4.302 leitos de UTI exclusivos para o tratamento de pacientes com Covid-19, solicitados pelo Estado de São Paulo”.
Em Marília, fontes ouvidas pelo MN lamentaram o embate e afirmaram esperar entendimento entre as autoridades do Estado e da União.
“No nosso caso sempre houve uma ocupação elevada. Há um grande esforço para atender a demanda, mas precisamos dos recursos. Desejamos que haja uma conciliação. Que os governos trabalhem em unidade para superar esse momento tão difícil”, disse ao site uma fonte da gestão hospitalar na cidade.
O MN procurou a Secretaria de Estado da Saúde para questionar destalhes sobre os cortes, mas ainda não recebeu informações.
Também procurou a administração do HC/Famema. Vale lembrar que a instituição do governo do Estado prevê – mas ainda não instalou – dez novos leitos para referência regional. Até o fechamento desta reportagem, a autarquia não havia se manifestado.
Confira abaixo, na íntegra, a nota do Ministério da Saúde enviada ao MN:
O Ministério da Saúde informa que não houve nem há nenhum ato administrativo de desabilitação de leitos de UTI para Covid-19, pois os atos normativos do Ministério da Saúde são pactuados de forma tripartite com o CONASS e o CONASEMS e são publicados por meio de portaria em Diário Oficial da União, garantindo os princípios do SUS de gestão participativa e descentralizada.
Em virtude do término do Estado de Calamidade Pública, conforme o decreto legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, que reconhecia a ocorrência do estado de calamidade pública, com efeitos até 31 de dezembro de 2020, os recursos de créditos extraordinários destinados pelo Governo Federal para enfrentamento à pandemia (cerca de R$ 41,7 bi) foram destinados a estados e municípios e aplicados pelo Ministério da Saúde até 31 de dezembro de 2020.
A fim de concluir os repasses aos Estados e ao Distrito Federal, o Ministério da Saúde publicou em DOU a portaria nº 3.896, de 30 de dezembro de 2020, que transferiu R$ 864.000.000,00 (oitocentos e sessenta e quatro milhões de reais), para continuar o enfrentamento das demandas assistenciais geradas pela emergência de saúde pública de importância internacional causada pelo novo Coronavírus, sendo R$ 126.522.037,23 destinados ao Estado de São Paulo, dos quais 22,35% (R$ 27.834.843,14) eram destinados a leitos de UTI previstos no Plano de Contingência Estadual.
Esse montante seria o suficiente para o Estado de São Paulo manter 580 leitos durante 30 dias, com a diária dobrada aplicada em 2020, ou 1.160 leitos com a diária preconizada pelo SUS de R$ 800,00. Além disso, pelas portarias anteriores de habilitação de leitos de UTI exclusivos para Covid-19 (o que não fecha nenhum leito nem impede que os demais leitos sejam empregados para os pacientes de Covid-19), deixariam de estar disponíveis exclusivamente para Covid-19 apenas 180 leitos de UTI no mês de janeiro 2021.
Na última reunião da Comissão Intergestores Tripartite (CIT), ocorrida em 28 de janeiro de 2021, e na assembleia do CONASS que a antecedeu, o Ministério da Saúde apresentou a possibilidade de que esses recursos fossem empregados além dos percentuais previstos na portaria 3.896, na manutenção dos leitos de UTI.
Ressalta-se que, em 31 de dezembro de 2020, o saldo remanescente em conta dos fundos municipais e estaduais de saúde oriundo de repasses federais feitos pelo Ministério da Saúde era de R$ 24 bilhões, sendo R$ 9,5 bilhões na esfera estadual e R$ 14,5 bilhões na esfera municipal. Recursos estes para serem empregados no enfrentamento à pandemia pelos entes federados.
De um saldo total de R$ 4.262.946.040,44 (Estado de São Paulo e seus municípios), estavam R$ 1.415.545.710,65 na Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo e a soma dos saldos das secretarias de saúde dos municípios de São Paulo era de R$ 2.847.400.329,79 (com 10% desse saldo seria possível manter 8.881 leitos de UTI por um período de 30 dias, com uma diária de R$ 1.600,00, o que pode ocorrer conforme a discricionaridade do gestor local em aplicar os recursos disponíveis, de acordo as necessidades da rede de atenção à saúde).
Já no mês de janeiro de 2021, foram repassados mais R$ 732.897.176,96 ao Estado de São Paulo e R$ 1.273.073.136,56 aos seus municípios.
Além disso, foram destinados R$ 22,5 bi para a aquisição de vacinas que estão reabertos para aplicação no corrente ano. Já foram disponibilizados aos entes federados, até a presente data, 8.900.000 doses de vacinas aprovadas pela Anvisa, das quais 2.074.548 doses para o Estado de São Paulo.
Desta forma, o governador do Estado de São Paulo mente ou tem total desconhecimento do ato. Como o ônus da prova cabe àquele que acusa, resta ao governador comprovar o que chamou de crime e de quebra de acordo federativo. Esse tipo de desinformação é um desserviço ao povo brasileiro.