Compra de motos pelo Daem gera denúncia de fraude
A Justiça de Marília acolheu denúncia do Ministério Público (MP), após Inquérito Civil, e tornou réus o ex-presidente do Departamento de Água e Esgoto de Marília (Daem), José Carlos de Souza Bastos, o “Beca”; a chefe do setor de licitações do órgão, Lílian Maria Forin, e mais cinco empresários ligados a duas empresas revendedoras de motocicletas.
O MP investigou a compra de 12 motos pela administração da autarquia, em 2017, sem licitação. A denúncia aponta suposto processo licitatório forjado – com a intenção de não haver empresa vencedora – para posterior aquisição, sem concorrência.
A investigação apurou ainda a “triangulação”, que teria feita entre uma empresa de Marília e a contratada para fornecer as motos, uma revenda de Itapetininga.
Ocorre que a empresa mariliense, após ter dado orçamento para participar do certame, foi quem acabou fornecendo os veículos para a empresa contratada (de Itapetininga), que fechou o negócio com o Daem. Assim, a promotoria entendeu que a revenda local acabou sendo beneficiada.
Com a denúncia formal aceita, Beca, Lilian e os empresários dependerão agora de uma manifestação do Ministério Público se o órgão aceita ou não uma conciliação, para extinguir o processo.
A defesa do ex-presidente pediu a extinção do processo, ou proposta para conciliação, já que a investigação não apontou prova de obtenção de vantagem pessoal, obtida para direcionamento da concorrência.
Também alegou baixo valor do superfaturamento apontado – cerca de R$ 500 a mais por moto, em pesquisa de mercado feita pelos peritos do MP. A defesa do ex-presidente negou dano ao erário, já que os veículos foram entregues e devidamente patrimoniados ao Daem.
Entenda o caso
Em 2017, o Daem adquiriu – e exibiu em praça pública – 12 motocicletas novas, como demonstração de que o Departamento tem viabilidade, se for bem administrado. A apresentação teve direito a faixa e permanência por vários dias em frente a Prefeitura.
Após denúncia, porém, o Ministério Público apurou que os R$ 119.880,00 foram investidos sem licitação, uma vez que dois processos licitatórios anteriores haviam fracassado.
Ao verificar especificações dos veículos, o órgão constatou que os requisitos exigidos nas motos tinham o potencial de restringir a participação a revendedores de uma única montadora. A apresentação de orçamento teria envolvido, inclusive, empresa que está impedida de contratar com o poder público.
Com o fracasso dos certames, amparado por parecer da Procuradoria do Daem, o então presidente autorizou o compra, que foi feita de uma empresa de Itapetininga. Porém, para o Ministério Público, a não concorrência já estava estabelecida desde o início.
“Os elementos dos autos indicam a configuração de fraude à licitação dada a evidência de vínculo subjetivo entre todos os requeridos de forma a favorecer, indevidamente, a empresa local, ora requerida”, escreveu o promotor, na denúncia.
“Embora trate-se de empresas autônomas, o citado pregão e posterior dispensa de licitação foram concebidos apenas para conferir ares de legalidade à venda das motocicletas, quando na realidade já se sabia previamente qual seria o fornecedor dos produtos, em verdadeiro jogo de cartas marcadas”, apontou a Promotoria.
Mereceu destaque, na investigação, o fato de que 9, das doze motocicletas foram adquiridas da fabricante em 28 de março de 2017, ou seja, quando o procedimento de dispensa de licitação já estava em andamento. A empresa de Itapetininga vendeu seis dias antes, sem possuir, e comprou as motos da concessionária mariliense em 17 de abril.
Na mesma data, vendeu ao Daem. Na prática, as motos nunca foram do estoque da concessionária de Itapetininga, saindo diretamente da empresa mariliense – que estava impedida da venda por falta de documentação – para a autarquia.
O ex-presidente do Departamento, procurado pela reportagem do Marília Notícia, afirmou que não existe nenhuma ilegalidade na aquisição das motos.
“Infelizmente o promotor questiona um valor que, embora irrisório, constituiria ‘crime’. Na ação, esse promotor envolveu cerca de dez pessoas (a maioria empresários), o que lamento muito”, disse Beca.
No processo, ele alegou que não auferiu nenhuma vantagem pessoal com a definição de fornecedor e que havia necessidade urgente da compra, sendo que os atos relativos à dispensa de licitação foram feitos em conformidade com a legislação.
A Chefe de Licitação do Departamento disse ao MN que, à época, houve a necessária publicidade da licitação. “As publicações foram todas efetuadas. Chamamento para a primeira tentativa de pregão. Para segunda é depois o termo de licitação fracassada”, afirmou.
Ela afirma que após a impossibilidade de contratar por licitação, “procedeu-se a dispensa como reza a legislação”. Questionada sobre a suposta triangulação, respondeu: “Da porta pra dentro do setor não houve. Na lei não proíbe que eu compre de ‘João’ se ele comprou de ‘Maria’. E não tenho como saber se as empresas se conversam fora do meu setor”, declarou.