CarnaEspecial: Mães lutam por inclusão e ‘direito à alegria’
Mesmo em meio à adversidade, há muito espaço para a alegria. Por isso, o carnaval é uma das datas que traz doces lembranças para a estudante universitária Anathânia Amin, de 30 anos.
Em 2014, ela abriu a própria casa para o primeiro “CarnaEspecial”. O objetivo era alegrar a filha Laura Maria, mas o resultado foi muito além e contagiou dezenas de famílias.
Ainda durante a gestação, Anathânia e o marido, o servidor público Reginaldo Alves de Souza, receberam a notícia que a filha teria uma má formação congênita.
Laurinha nasceu com Síndrome de West, com posterior diagnóstico de agenesia de corpo caloso bilateral, uma condição rara e com muitas limitações. Anathânia e o marido moravam em Santa Cruz do Rio Pardo (distante 120 quilômetros de Marília) e buscavam tratamento em várias cidades.
“Eu ia para São Paulo, para Bauru, depois passei a vir para Marília. Foi quando comecei a ter contato com outras mães, mas não era fácil se aproximar. Ao mesmo tempo que a gente tinha a necessidade de conversar, de fazer contato para compartilhar informação, tinha o receio por não saber como a outra mãe reagiria”, conta a estudante de odontologia.
Em uma das surpresas que a vida preparou, ainda em Santa Cruz do Rio Pardo, ela encontrou Cláudia Marin, mãe de Matheus, 12 anos. A ativista ficou conhecida em Marília ao lutar pela cannabis medicinal e participar da fundação da ONG Anjos Guerreiros.
Anathânia e Cláudia moravam na mesma cidade. “A gente não se conhecia, mas já sabia da história uma da outra, de ouvir falar. Eu a vi com o Matheus e fiquei com receio de abordar por duas vezes. Até que ela soube que eu estava em Marília e deixou o número do telefone dela na recepção de um hospital”, conta Anathânia.
Foi um dos períodos mais difíceis, relata a mãe. A menina Laura ficou internada na UTI da Santa Casa de Marília por dois anos. Quando a equipe médica decidiu pela alta, a solução foi montar uma UTI – Unidade de Terapia Intensiva – dentro de casa.
“Conhecer outros casais, que também lutavam para dar mais qualidade de vida para seus filhos, foi fundamental para nós. Meu marido e eu fizemos tudo que podíamos para dar à nossa filha uma condição de vida melhor, e isso inclui celebrar a vida”, considera a estudante.
Inclusão
Mães como Cláudia e Anathânia exigem mais que medicação e equipamentos. Elas querem inclusão, a começar dentro de casa.
“Nós fazíamos muita bagunça, muita festa com a Laura. Comemorávamos todas as datas. Mesmo com as dificuldades, ela reagia sempre a todos os estímulos. Somente no final, ficou mais comprometida. O nosso desejo era brincar com nossa filha e ela, como toda criança, também queria brincar, se divertir”, relembra Anathânia.
O carnaval de 2014 foi especial e inesquecível. “Eu falei, Cláudia, vamos fazer uma festa de carnaval para as crianças aqui em casa! A Laura estava no respirador, não podia sair de casa. Convidamos umas cinco mães, com as crianças. Colocamos fantasias, decoramos a casa. Foi uma matinê de verdade. Foi um dia muito feliz, rimos e brincamos muito”.
A estudante, que na época ainda não havia iniciado a faculdade de odontologia, diz que aquela foi uma oportunidade de reafirmação – para ela e outras mães – de que a alegria era um direto.
“Nós não tínhamos que ficar tristes… simplesmente esquecer que estava tendo festa no país inteiro, porque nossos filhos tinham doenças raras. Aquelas mães e eu aprendemos aos poucos que a inclusão é abrangente e começa dentro de nós. Temos que buscar uma vida plena, em todas as situações, apesar das dificuldades”, defende.
Aquele carnaval da pequena “Pedrita” foi a última grande festa, o último evento temático que Anathânia e o marido tiveram com a filha. Em maio do mesmo ano, Laurinha não suportou as complicações da síndrome e faleceu.
As lições que o casal aprendeu com a menina, porém, serviram de combustível para continuar e ajudar outras famílias. Anathânia conta que retomou os estudos, voltou a trabalhar, ocupou o tempo e a mente. Quando pode, participa do ativismo com outras mães.
Provocada pelo Marília Notícia, relatou sua história publicamente pela primeira vez, porque acredita que o CarnaEspecial improvisado em sua casa fez a diferença para várias famílias, e ainda pode fazer para outras que convivem com as adversidades e limitações das doenças raras.
“A Laura foi um anjo que Deus colocou em nossa vida. Ela nos ensinou muito, nos fortaleceu, porque ela era muito forte. Era uma criança com qualquer outra, pura inocência. Cuidar dela foi uma experiência incrível. A sensação que temos é que ela veio para nos tornar pessoas melhores”, acredita Nathânia.
Serviço
O CanaEspecial 2020 espera reunir centenas de pessoas. Na festa da inclusão, a maioria das participantes são familiares de crianças com algum tipo de deficiência ou condição de saúde especial, porém, todos são convidados. A entrada é franca e os organizadores pedem aos participantes que levem um prato de salgado ou doce, voluntariamente.
O evento acontece dia 29 deste mês, na sede da APCD – Associação Paulista dos Cirurgiões Dentistas – das 15h às 18h. A organização é da Associação Anjos Guerreiro e da Associação Cannábica em Defesa da Vida.