Diretor de ‘It – A Coisa 2’, Andy Muschietti retrata adultos traumatizados
Há dois anos, It – A Coisa ultrapassou 4,4 milhões de espectadores no Brasil. Foi, também, um sucesso planetário. Não admira que o 2 tenha sido providenciado rapidamente e esteja estreando amanhã em salas de todo o País. Stephen King! Na verdade, Stephen Edwin King. Difícil colocar num só nicho um escritor de ficção científica, terror, suspense, fantasia. Melhor abrigá-lo sob o amplo guarda-chuva do fantástico. O “rei” Stephen virou um fenômeno editorial e de bilheterias quando Carrie – A Estranha estourou na tela, promovendo aquele banho de sangue, nos anos 1970. King ainda não tinha 30 anos. Nasceu em Portland, em 1947. Carrie é de 1976.
O homem é uma máquina de fazer dinheiro. Só de adaptações para cinema (e refilmagens), contam-se mais de 60 títulos, 64 para ser exato. E ainda tem as séries de TV, os telefilmes. It: A Coisa – Capítulo 2, que agora estreia, não é só mais um Stephen King nas telas. É um dos maiores, o que não representa pouca coisa quando se pensa que já houve Stanley Kubrick (O Iluminado), Frank Darabont (Um Sonho de Liberdade e À Espera de Um Milagre), Brian De Palma (Carrie) e Rob Reiner (Conta Comigo) Andy Muschietti conseguiu – alçar-se ao plano dos grandes. “Hola, soy Andrés, mucho gusto.” Alto, simpático, com pinta de galã, o argentino de Buenos Aires, de 46 anos, esteve em São Paulo com a irmã produtora, Barbara, para promover seu filme.
Andrés ganhou projeção internacional com um curta de três minutos que realizou na Argentina, Mamá. Foi parar em Hollywood, cooptado pelo cinemão, expandindo seu curta para Mama, com Jessica Chastain, em 2013. Se Mamá/Mama já eram eficientes na arte de provocar o medo, era natural que ‘Andy’ chegasse a Stephen King. It – A Coisa era sobre pré-adolescentes que enfrentavam aquela entidade maligna em forma de palhaço, Pennywise.
Passaram-se muitos anos na ficção de 2017, e os garotos e garotas de It – A Coisa viram adultos traumatizados pela experiência juvenil. O ex-gordo que sofria bullying virou um cara inseguro, Beverly apanha do marido, tem o enrustido que não saiu do armário, etc. Formam um compêndio de neuroses e o diretor conta com atores talentosos como James McAvoy, Jessica Chastain, Bill Hader, Isaiah Mustafa, etc, para lhes dar vida. “Não queria fazer desses personagens adultos uma síntese dos problemas do mundo, mas queria que fossem verossímeis e que o público se interessasse por eles, de verdade.” A própria cidade de Derry, onde os fatos se deram, no passado, faz parte dessa integração realista. “Não conseguimos encontrar nossa Derry ideal, mas, como era importante filmar em locações, para capturar a atmosfera, pegamos as igrejas de uma cidade, a rua principal de outra e a ponte de uma terceira. A fantasia do cinema nos permite criar uma unidade de tempo e espaço, e foi o que fizemos.”
De forma muito impressionante, os garotos e as garotas permanecem exatamente iguais nas cenas em flash-back. Elas já haviam sido filmadas há dois, três anos, prevendo uma eventual continuação? Afinal, jovens em fase de crescimento mudam de um dia para outro, quanto mais ao longo de dois anos. Seria impossível para o público não perceber a diferença. “Não, não havíamos filmado cenas de reserva nem estamos repetindo cenas do outro filme”, explica Andy. “Foi difícil, mas, como você vê, não impossível. Houve todo um trabalho de pós-produção para manter a garotada sempre jovem. Saiu caro, mas na tela beira a perfeição ” O repórter aponta o cartaz. Bill Skarsgård e seu sorriso maligno. Os personagens são todos individualizados e ‘psicologizados’, mas Pennywise permanece um enigma. Quem é? Um mito, o mal. “Bill superou nossas mais otimistas expectativas”, avalia o diretor. “Ele usa uma prótese de borracha na testa, tem outra na boca e com todas essas limitações o que consegue fazer com os olhos e o sorriso é verdadeiramente assustador.”
Numa cena, na marquise do cinema, aparece um título – A Nightmare On Elm Street, A Hora do Pesadelo. Outra saga assombrada por um personagem – não de Stephen King – que irrompia, destruidor, nos sonhos de crianças e adolescentes. Freddy Kruger, com sua cara derretida e as unhas afiadas. A Hora do Pesadelo está lá para situar a época, os anos 1980? “Um pouco, sim, mas também se trata de uma homenagem a um terror que mexeu muito com nosso imaginário. Foram filmes como aquele que despertaram em Barbara e em mim o desejo de fazer cinema. Há uma grande tradição no cinema que consiste em jogar com as emoções do público, construindo o medo. O cinema é contemporâneo da interpretação dos sonhos, de Freud. Não podemos esquecer disso. Filmes podem ser muito complexos, depende do espectador. Gostaríamos que os nossos fossem, ajudando as pessoas a olharem para o próprio interior, encarando e superando medos.” Andy, ou Andrés, traz para o cinema mundial outra faceta do cinema argentino. O gênero. Uma obra-prima do medo? Muito provavelmente, e com base na obra do especialista Stephen King.