‘Me sinto abandonado’, diz patriota mariliense

Presos na Argentina, para onde fugiram após mandado de prisão no Brasil – por tentativa de golpe de Estado nos ataques aos Três Poderes – detentos que dividem a cela com o mariliense Rodrigo de Freitas Moro Ramalho repercutiram por uma declaração polêmica. Eles reclamaram das condições do sistema prisional no país vizinho e compararam “pior que a Papuda”.
Atualmente, segundo apuração do portal UOL, o grupo se encontra preso na cidade de Ezeiza, na província de Buenos Aires, próximo à capital.
Rodrigo Ramalho chegou a ficar sete meses preso logo após os atos em Brasília (DF). Somente pôde retornar para Marília com o uso de tornozeleira eletrônica. Após a condenação em maio deste ano, não se entregou e era considerado foragido. Ele fugiu com a esposa e dois filhos para a Argentina, onde acabou preso.
O mariliense relata falta de médico. Companheiros falam em violações aos direitos humanos. Eles se queixam ainda de não haver comida suficiente, sujeira na prisão, falta de higiene e ameaça de morte de outros detentos. O governo Javier Milei e o Judiciário argentino não se manifestaram ao site.
ALOJAMETO PRECÁRIO
Cinco fugitivos do 8 de Janeiro – todos com pedido de extradição e solicitação de refúgio – dividem o espaço. Os processos, tanto para livre permanência na Argentina quanto para extradição a uma prisão no Brasil, ainda não foram julgados.
O motoqueiro Wellington Luiz Firmino, 35, é um dos presos. Condenado a 17 anos no Brasil, foi detido na Argentina em 18 de novembro, dias após zombar do pedido de extradição feito pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF.
No Complexo Penitenciário de Ezeiza, na região metropolitana de Buenos Aires, Firmino relatou que passou os primeiros 49 dias preso na província de Jujuy, perto da fronteira com o Chile, onde tentou fugir com um grupo de brasileiros. “Meus 49 dias preso [na carceragem de Jujuy] foram mil vezes piores do que meus 11 meses na Papuda”, afirmou.
“Um lugar que não tem o mínimo de direitos humanos. Era uma cela solitária, sem banheiro, com um buraco no chão e uma canequinha para tomar banho. Pernilongo para todo lado.”
Desde janeiro em Ezeiza, ele atualmente compartilha o local com dois quartos, sala, cozinha. Há geladeira e TV. Além de Firmino e o mariliense, também estão Joelton Gusmão e Joel Borges.
Firmino relata que lesionou o braço em um acidente de moto e necessita de cirurgia, mas não consegue atendimento médico. “Estou com o meu braço direito sem força, com dor constante”, relatou.
SAÚDE DO MARILIENSE
O entregador mariliense Rodrigo Ramalho, segundo a reportagem do UOL, sofreu uma lesão no joelho em Ezeiza. Em carta enviada à associação de familiares de investigados do 8 de Janeiro (Asfav), ele afirma que não consegue nem fazer um raio-x.
“Faz um mês [da lesão] e sequer tiraram o raio-x. Estou aguardando ressonância, fisioterapia e consulta com ortopedia”, escreveu.
“Passei 53 dias trancado em uma cela sem sol, sem comida, sem cuidados médicos. Só com a ajuda da família. Me sinto abandonado, esquecido em um país estrangeiro.”
Ramalho também esteve preso numa delegacia em La Plata, junto com Joelton Gusmão. Já o caminhoneiro Joel Borges, 46, relatou que, na carceragem da província de San Luiz, tomava banho a cada cinco dias em uma cela de apenas 2m x 1,4m, “uma casinha de cachorro”, segundo ele.
AMEAÇAS E FALTA DE REMÉDIOS
A apuração junto à Associação das Famílias também destaca o caso da analista de marketing Ana Paula de Souza, 36, presa desde 28 de novembro. Ela relatou sentir dores diárias nos seios, devido a nódulos benignos retirados em 2022 e uma doença autoimune crônica (tireoidite de Hashimoto).
Segundo ela, não consegue fazer exames nem mesmo pagando, e a penitenciária não permite o atendimento médico. “O diclofenaco ameniza as pontadas, mas não resolve”, afirmou.
Ana Paula contou ainda que teve roupas, comida e créditos de telefone roubados por outras presas. Também relatou ter sido ameaçada de morte em duas ocasiões e, após uma crise de pânico e desmaio, foi levada ao setor médico da prisão, onde ficou três dias antes de ser transferida para outra ala. A Justiça argentina negou sua soltura alegando risco de fuga.
Os presos disseram que não trabalham, não estudam e não fazem atividades físicas. O único livro disponível seria uma Bíblia. O grupo se entretém assistindo filmes na TV.
Todos os condenados nos ataques do 8 de janeiro negam os crimes. A Asfav defende que não houve tentativa de golpe, mas sim vandalismo, e afirma que nem todos cometeram crimes patrimoniais.
Procurado pela reportagem do UOL, o Serviço Penitenciário Federal argentino não se pronunciou e direcionou as perguntas ao Judiciário. A reportagem do UOL também não obteve resposta da Procuradoria Penitenciária Nacional.