A violência contra a mulher já era um problema de dimensões alarmantes antes da pandemia da covid-19. E como todo problema que não teve, ao longo do tempo, a atenção adequada do poder público, se agravou num contexto adverso, que restringiu o convívio social e dificultou às mulheres o acesso à principal arma de que, em geral, dispõem contra o seu agressor: o pedido de socorro.
A explosão da violência doméstica durante a crise sanitária do coronavírus foi tema de estudos de diversas organizações nacionais e internacionais. No Brasil, foi ratificada por fontes oficiais como Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Fórum Brasileiro de Segurança Pública e Conferência Nacional dos Municípios. Os números variam de acordo com a localidade, mas em alguns Estados, como o Pará, esse aumento ultrapassou 90% em determinado período.
Esse cenário extremamente preocupante fez com que a Apamagis (Associação Paulista dos Magistrados) elegesse como tema da segunda edição de sua série de pesquisas – JUSBarômetro – a violência contra a mulher.
O foco do estudo foi conhecer como as mulheres enxergam o problema. É preciso ouvi-las. Saber como esse tipo de violência está presente na vida delas, de que forma e em que proporção buscam por apoio e justiça, se conhecem e como avaliam as iniciativas do Poder Judiciário para prestar assistência e combater essa prática, e quais as expectativas em relação ao atendimento às vítimas.
Realizada pelo Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas (Ipespe), a pesquisa ouviu mil mulheres com idade acima de 18 anos, em todo o Estado de São Paulo, e trouxe informações de extrema relevância. O panorama geral é o seguinte: 88% das entrevistadas percebem que esse tipo de violência vem aumentando; 54% indicam, entre uma relação de itens, a violência doméstica como a principal preocupação das mulheres atualmente; 66% dizem que a casa é o principal local das agressões; e 63% apontam como autor mais frequente dos crimes o cônjuge, companheiro ou namorado da vítima.
Alguns dados especialmente chamam a atenção. A preocupação com a violência doméstica é maior entre as mais jovens: 59% das mulheres entre 18 e 24 anos se dizem afligidas por essa questão, mais até do que com os ataques que podem sofrer fora de casa. O medo de sofrer violência em casa está muito à frente de outras preocupações, como emprego e geração de renda, citado por 11% das entrevistadas; cuidados com a própria saúde e a de seus familiares, mencionados por 4%; e doenças como câncer de mama e útero, apontadas por 3%.
A pesquisa revelou que, a despeito do aumento desse tipo de violência, a busca por ajuda junto a órgãos oficiais ainda é baixa. Segundo as mulheres ouvidas, nos casos de violência de que foram vítimas, testemunharam ou tomaram conhecimento, somente 29% das agredidas procuraram auxílio de órgãos oficiais. É contundente a percepção de que as mulheres ainda se sentem desprotegidas, sendo o medo apontado por 73% como a principal causa desse silêncio.
Ainda foram mencionados como motivos para deixar de denunciar ou buscar ajuda a vergonha ou o receio de se expor (31%), a dependência financeira em relação ao companheiro (19%) e a desconfiança em relação à Justiça e às leis (15%).
Outro aspecto que desestimula as mulheres a fazer a denúncia é o atendimento que recebem quando procuram ajuda – 42% das entrevistadas cobram mais empatia e sensibilidade dos profissionais que atendem as vítimas de violência e 40% reclamam por maior capacitação dos policiais para esse tipo de atendimento. Outras medidas sugeridas para combater a violência e evitar a omissão são a ampliação do número de delegacias da mulher (29%), melhorias na comunicação com as vítimas (21%) e aumento da capacidade de atendimento nas defensorias (14%).
A violência psicológica também foi evidenciada no levantamento. Mais da metade das entrevistadas, 52%, afirma ter visto ou tomado conhecimento, nos últimos 12 meses, de mulheres próximas que foram vítimas de insulto, humilhação ou xingamento. Esse número sobe para 66% entre as jovens de 18 a 24 anos, e 61% entre as mulheres negras.
A punição aos agressores com pena de prisão é um desejo de seis em cada dez mulheres entrevistadas, percentual que aumenta para 67% entre aquelas na faixa etária entre 18 e 24 anos. Apenas 10% citaram as medidas protetivas como forma de romper o ciclo de violência, e 9% se disseram favoráveis a programas de reeducação.
A Lei Maria da Penha, que acaba de completar 15 anos, é considerada eficiente para inibir a violência por 59% das entrevistadas. Ações do Judiciário paulista, como o combate à subnotificação de casos, chegaram ao conhecimento de pouco mais da metade das entrevistadas. Campanhas se mostram um instrumento eficiente. A “Sinal Vermelho contra a Violência Doméstica”, iniciativa da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e do Conselho Nacional de Justiça, é conhecida por 70% e aprovada por 78% das mulheres ouvidas.
O estudo traz ainda uma série de outras informações, mas, em linhas gerais, sinaliza como necessidades primordiais melhorar a estrutura do atendimento, proporcionar o acolhimento adequado para evitar a revitimização e reforçar a comunicação com as mulheres, aperfeiçoando os canais de informação e divulgação. O fato de as vítimas de violência se sentirem desprotegidas para recorrer a órgãos oficiais é sintomático de que as ações implementadas pelo poder público não têm sido suficientemente divulgadas.
Ouvir as mulheres é um primeiro passo. Somente escutando e apoiando aquelas que sofrem as consequências da violência na própria pele será possível avançar e aperfeiçoar os mecanismos de enfrentamento dessa situação. É preciso dar voz às vítimas, conhecer suas necessidades e dificuldades, para, então, partir para o segundo passo, que é oferecer instrumentos verdadeiramente efetivos de proteção e garantia de direitos. Esse é o passo que salva vidas.
*Artigo produzido por Vanessa Mateus, que é presidente da Associação Paulista de Magistrados (Apamagis), e por Marcela Montenegro, que é diretora executiva do Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas (Ipespe)
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