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Quem lucra com a proibição das sacolas?

A partir do dia 15 de julho, os supermercados e comércios de Marília estarão proibidos de distribuir gratuitamente sacolas plásticas descartáveis, conforme determina uma lei municipal de autoria do ex-vereador Eduardo Nascimento (Republicanos). A norma tenta, mais uma vez, colocar o peso do problema ambiental no colo do consumidor. A intenção pode até parecer nobre — afinal, quem é contra salvar os oceanos ou evitar o acúmulo de lixo? —, mas na prática, ao meu ver, essa medida é mais simbólica do que eficaz.

Voltar à proibição das sacolinhas, como prevê a retomada da Lei nº 7.281/2011 (agora reformulada como Lei nº 9.046/2023), é repetir um velho erro: mirar no sintoma e não na causa. O uso de sacolas plásticas é, de fato, um problema, mas está longe de ser o maior. E eliminá-las dos caixas dos supermercados não elimina o consumo de plástico no nosso cotidiano — apenas o torna menos visível.

A sacolinha virou o grande vilão da crise ambiental, mas continua sendo útil e reutilizada em milhões de lares como saco de lixo, embalagens, ou transporte de objetos. Quando ela desaparece, o que surge no lugar? Sacos também de plástico comprados à parte, feitos do mesmo material, ou novas “sacolas ecológicas” que muitas vezes são de má qualidade, duram pouco e acabam igualmente descartadas. O “verde”, aqui, é mais retórico do que real.

O problema maior é estrutural. O Brasil ainda engatinha em políticas sérias de logística reversa, reciclagem ampla e coleta seletiva eficiente. É verdade que, em Marília, a atual administração tem feito esforços nesse sentido, com a retomada da coleta seletiva em dezenas de bairros — uma medida positiva, que precisa de continuidade e ampliação. Mas jogar nas costas do consumidor (como a lei faz) o dever de “dar o primeiro passo”, é ignorar o tamanho real do desafio. É mais confortável — e midiático — banir a sacola do que enfrentar os interesses econômicos, principalmente dos supermercados, por trás das embalagens descartáveis e da ausência de infraestrutura ambiental.

E há outro ponto pouco debatido: a desigualdade no impacto dessa proibição. Quem vai pagar pelas sacolas retornáveis? Quem será mais fiscalizado? Quem terá dificuldade de adaptação? É sempre mais fácil impor regras do que oferecer alternativas viáveis, acessíveis e sustentáveis. Até porque, ao contrário do que se divulga, nem toda sacola dita “retornável” é realmente ecológica — e muitas custam caro, inclusive ao meio ambiente.

Enquanto isso, grandes empresas seguem empacotando produtos com camadas e mais camadas de plástico, e governos não investem o suficiente em políticas amplas de redução e reutilização de resíduos. Nesse cenário, a proibição das sacolas plásticas soa mais como um alívio de consciência coletiva do que uma solução real.

Se quisermos, de fato, enfrentar o problema do lixo plástico, é preciso mais que campanhas publicitárias e leis pontuais. É necessário um plano abrangente, com foco na educação ambiental, na reformulação de embalagens, na ampliação da coleta seletiva e no envolvimento da indústria. Trocar a sacola por outro símbolo “ecológico” sem repensar o modelo de consumo é só uma maneira de empurrar o problema para outro lugar.

O planeta precisa de atitudes consistentes, não de gestos vazios. O consumidor, mais uma vez, vai pagar o pato.

Gabriel Tedde

Gabriel Tedde é jornalista com 13 anos de atuação e fundador do Marília Notícia

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