Prefeitura investiga contrato de merenda escolar
A Prefeitura de Marília instaurou sindicância nesta terça-feira (3) visando apurar um contrato para fornecimento de merenda escolar feito no começo do ano pela própria administração municipal. A portaria que abre a investigação interna pela Corregedoria Geral do Município foi publicada na edição de hoje do Diário Oficial de Marília.
A apuração surge como resposta a apontamentos do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP), que indicam suspeitas quanto ao ramo de atividade da empresa contratada e sua sede física.
De acordo com o órgão fiscalizador, a empresa Líder Negócios Comercial Ltda. – ME possui atividade diferente do ramo de gêneros alimentícios, conforme registro na Jucesp (Junta Comercial do Estado de São Paulo).
Na Jucesp consta que o ramo de atuação da empresa seria o de “comércio de automóveis, calçados, pedras semipreciosas”, além de produtos como “vestuário” e “relógios”.
O TCE ainda chama a atenção para o fato de a atividade desenvolvida pela empresa também ter recebido atualização em novembro do ano passado. Ou seja, poucos meses antes da licitação realizada pela atual administração municipal.
“As atividades da empresa contratada, devidamente registradas junto ao Órgão de controle paulista, nada tem em comum com o que o objeto contratado (gênero alimentício)”, aponta o Tribunal de Contas.
Endereço da empresa
Outra suspeita potencialmente grave levantada pela fiscalização do TCE diz respeito ao local onde a empresa Líder está sediada em Marília, na rua Bartolomeu de Gusmão, 609, bairro São Miguel.
O endereço apontado pelo TCE foi conseguido com base no registro na Jucesp e empenhos emitidos pela Prefeitura. No entanto, no local o órgão verificou “a existência de um imóvel fechado, tipo casa geminada, inclusive contendo anúncio com a mensagem ‘Vendo’”.
No entendimento do órgão fiscalizador, o espaço não teria “estrutura física suficiente que pudesse indicar que naquele local há uma distribuidora de gêneros alimentícios, com capacidade suficiente para atender ao objeto contratado”.
Durante vistoria no prédio, funcionários do Tribunal de Contas souberam por meio de vizinhos que “há tempos não há movimentação de pessoas no local indicado”.
Outra informação importante é a de que o endereço registrado anteriormente é o mesmo residencial onde moram os sócios da empresa, Thiago Granciero Cruz e Valdir Costa Cruz, na rua João Francisco Sornas, no Jardim América.
Outras supostas irregularidades
Assim como em relação a outra empresa contratada paralelamente no começo do ano para a mesma finalidade – fornecimento de alimentos para merenda – existe ainda a suspeita pelo TCE de superfaturamento nos produtos e se questiona a dispensa da licitação adotada no certame.
“Pela análise dos dados (…), o montante total contratado (R$ 867.880,00), em relação aos constantes no mercado (APP – Meus Preços), na cifra de R$ 710.038,00, representou sobrepreço global da ordem de R$ 157.842,00, equivalente a 18,19% do orçado inicialmente pela contratada”, diz o TCE.
Individualmente considerados os produtos comprados, “em alguns casos a diferença é monetariamente considerável”, aponta o órgão.
Biscoito de limão, de chocolate e macarrão de sêmola, por exemplo, constam com preços 42,86%, 34,25% e 121,00% acima do valor praticado no mercado, diz documento do TCE.
Prefeitura
Em nota divulgada no final da noite de ontem (2), a assessoria de imprensa do município havia adiantado que a sindicância é motivada pela “necessidade de apuração dos fatos, lisura e transparência total na gestão pública”.
O governo municipal diz ainda que levou em conta a “informação de que a empresa não possui endereço no local indicado nos empenhos realizados pela Prefeitura Municipal de Marília, o que em tese caracterizaria ser uma empresa ‘fantasma’”.
A nota finaliza afirmando que “o prefeito Daniel Alonso reitera o seu compromisso com a população mariliense pautando sempre sua administração em uma gestão eficiente e com total transparência e que não compactua e não tolera quaisquer indícios de fraudes, principalmente que envolvam alimentos para crianças, por fim, afirma que todos os possíveis culpados serão punidos com o rigor da lei”.
Em entrevista para a TV Tem, o secretário de Educação Beto Cavallari, afirmou que apesar das suspeitas, a empresa sempre cumpriu o cronograma, entregando todos os produtos nos locais e datas estipuladas.
Quanto ao sobrepreço dos produtos, o governo municipal diz que “foi seguida a lei de licitações, fazendo pesquisa de preços, tendo juntado 10 orçamentos prévios com empresas do ramo”.
“A auditoria se utilizou de aplicativo de celular para pesquisar os preços que diz estarem acima dos valores de mercado e não levou em conta a logística para entrega dos produtos nos pontos indicados pela Secretaria da Educação. Os preços são os de mercado”, disse em nota a administração.
Sobre a dispensa de licitação, a Prefeitura justifica informando que “a licitação foi deflagrada no ano anterior na modalidade pregão, porém, considerando os vícios formais do edital e para evitar apontamentos ou suspensão da licitação pelo próprio Tribunal de Contas ou meio judicial já que houve impugnação do edital por empresa licitante, a municipalidade revogou a licitação em janeiro deste ano e considerando a proximidade do período letivo fez a dispensa de licitação de forma emergencial”.
Líder
Uma das empresas envolvidas no caso também emitiu nota sobre o assunto, onde se defende dos apontamentos feitos pelo TCE e reafirma o endereço na rua Bartolomeu Gusmão.
“A Líder vem esclarecer que é uma empresa idônea especializada em licitações públicas e que no exercício de sua atividade possui diversos ramos, dentre deles o comércio de mercadorias em geral, com predominância em produtos alimentícios”, disse em comunicado.
A empresa garante ainda que possui “depósito físico regular de estocagem de produtos”, mas não indica a localização, e diz que fornece produtos para outros municípios da região e órgãos estaduais como delegacias, penitenciárias e hospitais “através do Sistema de Bolsa Eletrônica de Valores do Estado de São Paulo”.
A Líder assegurou que faz entregas regulares para a Prefeitura de Marília desde 2015, “portanto em administração anterior, sempre por meio de processo licitatório com lisura e transparência”.
Em sua nota explicativa, a Líder afirma que em março deste ano participou de ampla pesquisa de mercado na Prefeitura, juntamente com outras concorrentes, e por possuir “menores valores em determinados itens, em detrimento de outros participantes”, teria possibilitado a entrega dessas mercadorias “conforme necessidade e solicitação”.
Sobre os preços supostamente superfaturados, a Líder alega que os preços apresentados foram obtidos por meio de “programa de aplicativo de celular que não condiz com a realidade de mercado”, pois não considera questões como preço de “frete, impostos e prazos para pagamento”.
Antes de concluir, a empresa garante que não é “fantasma, é respeitada, consolidada, em plena e regular atividade no mercado” e que comprova sua “lisura e idoneidade” bem como se coloca à disposição dos órgãos fiscalizadores.
Delta
A outra empresa envolvida, na questão do sobrepreço, igualmente se manifestou. Em nota, diz que foi fundada em 1995 e participa de licitações de modo transparente há muitos anos.
“Atendemos os quesitos de qualidade, estando os preços dentro do estimado pelo mercado, com ampla cotação, de modo bem transparente”, disse a Delta.
“A empresa informa ainda que entregou todos os produtos solicitados nos locais indicados pela administração”, finaliza.