Na briga dos hackers, o Brasil está fora
Esta foi uma semana de hackers, ligando o alerta vermelho em governos por toda parte. Principalmente aqueles que compreendem que vivemos num mundo em que a economia é regida pelo encontro entre ciência e tecnologia. O ataque ao Twitter foi o pior de sua história — e entre as contas violadas estão as de um ex-presidente, Barack Obama, e de um possível futuro presidente, Joe Biden. Não mexeram nos tuítes do atual inquilino da Casa Branca, Donald Trump. Sorte – Trump tuíta suas principais mensagens. O estrago poderia ter sido grande. Não bastasse, um dos principais grupos russos está tentando invadir os sistemas dos laboratórios que pesquisam vacinas contra o novo coronavírus.
Não é mera coincidência que esta é a semana que se iniciou com o governo britânico querendo bloquear equipamento da chinesa Huawei em sua rede de telefonia 5G. Ou a semana na qual se desenvolveu a pressão, sobre o vice-presidente Hamilton Mourão, de alguns dos maiores fundos de investimento do mundo sobre o Brasil. Eles exigem, para continuar aqui, cuidados reais com a preservação da Amazônia.
A economia gira no encontro de ciência e tecnologia. A diplomacia gira no entorno de ciência e tecnologia. São a sístole e a diástole do mundo no século 21. Um jogo que o Brasil escolheu não jogar.
No caso do Twitter, o ataque foi de pura engenharia social. Ou seja: alguém convenceu um ou mais funcionários da empresa, com acesso aos painéis internos que controlam todas as contas da rede social, a mexer neles. Segundo apuração da revista eletrônica Vice, teria havido suborno. A informação não foi confirmada. O mais comum em ataques do tipo é que funcionários com acesso aos sistemas sejam enganados.
Foi um ataque amador, de certa forma. Os hackers escolheram contas de alta exposição, caso das de Bill Gates, Warren Buffett, Elon Musk e políticos e lá publicaram essencialmente a mesma mensagem. Um clássico conto do vigário: deposite um quê na minha conta que vou retribuir com o dobro. Muita gente caiu, mas muita gente detectou de imediato que havia um ataque em massa. Claro. Várias contas com a mesma mensagem, desconfia-se.
Um hacker mais hábil poderia ter usado o mesmo acesso para disparar um tuíte pela conta de Donald Trump que poderia fazer despencar as bolsas de valores do mundo. Ou, pior, provocar uma crise internacional. O risco foi imenso. Conforme as redes sociais, e não só o Twitter, se tornam veículos de comunicação direta por parte de chefes de Estado e grandes executivos, a possibilidade de que hacks do tipo possam ocorrer são motivo de alta preocupação.
Um ataque assim pode causar mortes.
No caso do outro ataque, aos laboratórios que desenvolvem vacinas, os governos de EUA, Reino Unido e Canadá apontam seu dedo para o Cozy Bear. Estes são hackers sofisticados. Usam engenharia social, também, mas é para convencer gente de dentro a clicar um botão em email, tocar um vídeo, ação que dispara um software que permite penetrar nos sistemas. Pelo software, conhecido, é que dá para identificar o grupo hacker. É quase certo que esteja sob o comando do Kremlin. Russos eles são, com certeza.
A questão dos britânicos e dos americanos com a Huawei não é o medo de ataques a sua infraestrutura 5G. É a de entregar o controle da tecnologia. A empresa chinesa tem mais capital, mais fôlego e capacitação técnica do que seus dois concorrentes no mundo. Os finlandeses da Nokia e os suecos da Ericsson.
O objetivo é claro. De liberal, não tem nada. Mas, do ponto de vista diplomático, dá para construir o argumento: vamos fortalecer os europeus para não perder a briga com a China.
Porque todo mundo está na briga. Até os amadores. Só não está o Brasil.